A reacção do Secretário do Estado em Nampula, Mety Gondola, denunciou o quão ficou afectado pela notícia da morte de 35 pessoas, devido à fome. Ficou estupefacto quando a administração de Muecate revelou os graves problemas de insegurança alimentar em que sua população está submetida, resultando na morte de 25 membros da mesma família.
O caso do distrito de Muecate, em Nampula, onde algumas pessoas só se alimentam de capim, tubérculos e frutos silvestres e, nos dias que tem disponibilidade de alimentos, não vão para além de uma refeição por dia, põe a nu a propaganda de um Governo preocupado em dizer que está a fazer bem, no lugar de exibir resultados.
Curiosamente, Nampula foi, a par da Zambézia, a província que acolheu a fase piloto do Sustenta, onde foram anunciados resultados faustosos em pelo menos 10 distritos, no que tange à produção de comida, que logicamente devia servir para alimentar a população. Mas é lá onde morreram pessoas de fome. É lá onde meteram dinheiro para agricultura, as pessoas morreram porque não têm como produzir.
Não vai ser espantoso um dia, se nas cercanias dos campos de arroz exibidos, a título de propaganda, ouvirmos, dentro de alguns meses, que as pessoas ainda continuam a comer arroz importado ou que morreram mesmo devido à fome.
Gondola teve que ouvir a tragédia que denuncia essa ausência de um Governo que propaga que faz, sem fazer, para se sensibilizar com o sofrimento do povo. É que por mais insensíveis que os nossos governantes possam parecer, não podem trair a natureza humana de quem são parte. O horror é sempre arrepiante, por mais que tentemos resistir, há pouca sensibilidade que se insurge e activa outros sentidos.
Não se pode isolar uma morte por fome e atribuir a culpa a qualquer Deus que não deixa cair chuva. Muito menos à Covid 19, afinal não é ela que mata de fome, mas as medidas em reação a ela. Até porque não se ignora, de forma alguma, que a Covid-19 aumentou a insegurança alimentar de várias maneiras, desde o aumento do desemprego, onde as pessoas têm menos dinheiro para gastar em comida e os migrantes menos fundos para enviar remessas às famílias; depois, uma série de interrupções que vão reduzindo a produção e fornecimento de alimentos. Aliados à queda das receitas do Governo, o que significa que as redes de segurança, como programas de proteção social e alimentação escolar, estão com problemas de financiamento.
Mas o que matou, neste caso, é ausência do Governo, com suas instituições do Estado inoperacionais e que actuam longe do discurso. De um Governo ausente fora das cidades, desconhecendo o terreno que administra. Pela sua reacção de espanto, Gondola revelou essa ausência e demonstrou o que, de facto, este Governo é incapaz de conhecer os problemas que estão a mais de 100 km do seu Gabinete, até que o pior aconteça.
Enquanto, nas zonas recônditas, as pessoas morrem por falta do que comer, em virtude da ausência do Governo que não garante a protecção básica, mesmo depois de promessas. Nas capitais, as famílias são sufocadas pelos preços especulativos, a par de decretos desajustados à realidade, uma realidade que passa mesmo a leste dos dirigentes. Aliás, nós é que somos teimosos. Tudo ficou claro quando uma dirigente, que era suposto viver em Moçambique, provou que aqui só está de corpo, mas vive a vida das Américas, ao confundir “My Love”, com mototaxi.
Enquanto uns vivem a vida das Américas, com as contas pagas com o suor de todos nós, os preços de produtos básicos estão a aumentar e ninguém diz nada. Um saco de arroz de 25 quilos custa metade de salário mínimo e, mais grave que isso, é o facto de não incomodar quem tem poder para pôr regras no mercado. Mas quem está preocupado com as regras? Palma é logo ali, e um quilo de açúcar, feijão ou arroz custa 250 meticais.
É esse o resultado de sermos dirigidos por um Governo ausente e sem norte, onde as instituições do Estado assobiam para um lado e a sociedade vive num território onde só os rebeldes triunfam, neste terreno de crónicos problemas de implementação de medidas.
Para testemunhar o desgoverno, basta uma ronda na circular para perceber que o recente decreto nº 7/2021 de 5 de Março, faz parte de mais um desfile presidencial. Ao longo da estrada pulula gente que prossegue sem norte, polícia preocupada em extorquir e mamanas preocupadas em alimentar famílias. São os efeitos de querer impor regras desajustadas. mucandze@evidencias.co.mz
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