Em menos de dois meses, três incidentes podiam ter terminado em tragédia

EXCLUSIVO
  • Má gestão de Pó Jorge pode custar vidas
  • Com problemas sérios de manutenção, LAM recorre a “remendos” para manter-se no ar
  • LAM paga um milhão e duzentos mil dólares de estacionamento de aviões que estão a apodrecer no Quénia

Nos últimos dois meses foram registadas pelo menos três incidentes, dois dos quais só na última semana, com três aeronaves das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), que podiam ter terminado em tragédia, alegadamente devido a problemas mecânicos. Isso acontece numa altura em que a LAM não tem nenhum avião próprio, depois de ter colocado à venda os únicos Embraer 190, que até hoje continuam a “apodrecer” num hangar em Nairobi, Quénia. Há mais de dois anos e meio que mensalmente a empresa paga 40 mil dólares, a razão de 20 mil por cada aparelho, só de taxa de estacionamento, sem incluir a manutenção. A empresa, que chegou a equacionar a possibilidade de vender os aparelhos por peça, imputa a culpa de não ter conseguido consumar o negócio à Covid-19, mas reconhece que o valor de mercado dos mesmos está desvalorizado.

Sem aviões próprios, atolada em dívidas, aeronaves sem a devida manutenção e constantes problemas técnicos que colocam em causa a vida de milhares de pessoas, é assim como se caracteriza a gestão da empresa LAM, totalmente em falência técnica e financeira, situação que viria a se agravar desde a chegada de João Carlos Pó Jorge.

Depois dos problemas técnicos que fizeram com que um avião deslizasse para além da pista, em finais de Fevereiro último, na cidade de Quelimane, nas duas últimas semanas mais dois incidentes da companhia podiam ter terminado em tragédia aérea.

O primeiro deu-se em Manica, quando um avião da companhia de bandeira teve uma falha na decolagem. Trata-se de uma aeronave que faria viagem de Chimoio a Maputo, que, após manobras no aeroporto de Chimoio, não conseguiu decolar, ou seja, não conseguiu levantar o voo.

Essa situação deixou em pânico os passageiros dentro do avião. Diante da persistência do problema técnico os passageiros tiveram que ser desembarcados. A direcção da LAM não se pronunciou sobre o incidente em particular, mas num comunicado publicado na passada segunda-feira (12 de Abril), comunicou aos passageiros e ao público em geral a reprogramação de voos devido à redução de duas aeronaves na sua frota.

Segundo contas do Evidências trata-se do avião que está na Etiópia em manutenção, após o incidente em Quelimane e o que teve problemas mecânicos em Manica.

“Decorrente de avarias detectadas, a LAM está a proceder a reprogramação de voos de hoje, dia 12 de Abril de 2021. A Companhia lamenta o facto de a situação estar a causar atrasos de partida dos voos, não sendo, por isso, possível cumprir, por enquanto, os horários que estavam previamente estabelecidos. Paralelamente às reprogramações, a LAM está a encaminhar uma parte dos passageiros nas rotas em que este cenário é possível”, revelou a empresa, em comunicado de imprensa, sem muitos detalhes.

Dois dias depois, concretamente, na passada quarta-feira (14), um outro avião da companhia, que fazia o trajecto Maputo-Pemba, teve problemas para aterrar em Pemba, situação que obrigou o piloto a retornar para Nampula. A companhia manteve silêncio.

Problemas mecânicos devido à falta de manutenção podem terminar em tragédia

A actual direcção da LAM, que quando chegou tirou de circulação dois activos próprios da empresa, com a alegação de que seriam colocados à venda para uniformização da frota, está a escangalhar a companhia de bandeira, segundo fontes abalizadas na matéria.

Para além de adoptar um modelo de gestão bastante questionável, está a colocar em causa a vida de centenas de moçambicanos, por falta de manutenção regular das aeronaves das marcas Boing (dois) e Q400 (dois) actualmente em uso.

A LAM alugou um quinto avião que está há algum tempo imobilizado no hangar do Aeroporto Internacional de Maputo, por falta de matrícula para poder voar no território nacional, ou seja, a empresa está a pagar por um avião que nem sequer está a usar.

Embora o argumento da uniformização da frota tenha tido como justificação a necessidade de garantir acesso às peças no mercado, a companhia de bandeira, com mecânicos bastante experientes, não consegue garantir um plano de reposição de peças, em virtude das dificuldades financeiras que a empresa atravessa.

Como tal, conta uma fonte ligada às oficinas, a direcção de Jorge Pó chega ao cúmulo de orientar os mecânicos para recorrerem a peças de aviões parados para substituir noutros. Neste momento, a LAM, para além operar aviões de modelos antigos, tem problemas sérios de reparação e manutenção.

O Evidências sabe, que contrariamente ao que foi dito, o incidente de Quelimane não foi causado por excesso de velocidade, mas, sim, devido a problemas mecânicos como aponta a investigação.

Aviões apodrecem no Quénia e a empresa paga 40 mil dólares por mês

Depois de ter assumido o cargo máximo da companhia de bandeira, Pó Jorge decidiu vender as duas últimas aeronaves próprias da LAM, os Embraer 190, que há mais de dois anos encontram-se parqueados em Nairobi, Quénia, com uma taxa de estacionamento mensal de 20 mil dólares por cada avião, totalizando 40 mil pelos dois “pássaros”.

Para além de custos de parqueamento, a estatal tem ainda despesas de manutenção na sua folha de pagamento por aqueles aparelhos ociosos, que a cada dia que passa vão se transformando em sucata.

Numa resposta bastante selectiva às questões apresentadas pelo Jornal Evidências, a direcção de Pó Jorge chegou mesmo a reconhecer que os aviões estão a perder valor de mercado, por não estar a conseguir compradores, nem por inteiro, muito menos por peças, imputando a culpa à Covid-19, argumentando que a pandemia deixou as companhias de viação numa situação crítica.

Em dois anos, estima-se que a empresa já pagou mais de um milhão e duzentos mil dólares só pelo parqueamento dos dois aviões, sem nenhum rendimento, pelo facto de os mesmos não estarem a operar. Só para se ter uma ideia, esse valor é superior ao que a Embraer pagou em comissões aos arguidos do caso Xihivele.

Vender aviões próprios para alugar aparelhos com tripulação

A companhia de bandeira segue sem nenhum avião próprio e neste momento depende de aviões alugados das marcas Boing e Q400, num negócio que pode envolver fabulosas “comissões” para algumas pessoas da empresa e do Governo, que, apesar das constantes denúncias, mantém ouvidos de mercador.

As referidas aeronaves foram alugadas no estrangeiro, num pacote que incluiu também tripulantes expatriados que vivem no hotel, com custos suportados pela LAM, enquanto há uma dezena de pilotos e comandantes da companhia que estão em terra por falta de aparelhos para operar, já há mais de um mês.

No momento em que escrevemos estas linhas, a LAM gasta por dia com hospedagem e alimentação da tripulação sul-africana de 12 elementos que vive no hotel VIP.

Sem contar com a diária do hotel e despesas de deslocação, cada um dos 12 tripulantes tem direito a 80 dólares para alimentação por dia. Nas contas do Evidências, só de per diem, aquela tripulação já gastou perto de um milhão de meticais, em menos de duas semanas.

Neste momento, as Linhas Aérea de Moçambique tem os serviços mais elitizados do país. Os passageiros chegam a pagar 35 mil meticais por um bilhete só de ida, em rotas em que outras companhias praticavam 15 por cento destes custos, ou seja, cinco mil meticais.

LAM dribla equipa do Evidências e esquiva perguntas

O Jornal Evidências, fez, durante a semana passada, todas as diligências visando obter o pronunciamento do Director Geral da LAM em torno do assunto, contudo, foi debalde. Depois de tantas tentativas de estabelecer contacto com o Gabinete de Comunicação da empresa, ligamos para o Director Geral da LAM, o qual prontamente respondeu ao nosso pedido de entrevista e pediu que enviássemos as questões.

Porém, antes mesmo que as enviássemos, recebemos uma ligação da empresa que lhe presta assessoria de imprensa, também solicitando as perguntas. Tal como combinado, as questões foram enviadas, mas as respostas vieram incompletas e a empresa não aceitou agendar uma entrevista. Ficamos a saber que foi orientação da assessoria de imprensa.

Na sua resposta sem direito a nenhum outro esclarecimento, apesar de nossos reiterados pedidos, a LAM diz que tomou a decisão de proceder a venda dos Embraer 190 no quadro da uniformização da frota, mas até ao memento não está consumada.

“Neste momento é um assunto difícil, uma vez que os aviões estão a perder o valor de mercado, devido a uma combinação de factores, agravados pela situação crítica em que a pandemia da Covid-19 colocou as companhias de aviação. Continuamos a ver as melhores formas de viabilizar o processo para termos uma frota bem estruturada e maior que a actual, composta por dois Boeing 737-700 e dois Q400, para além dos equipamentos operados pela nossa subsidiária MEX – Moçambique Expresso, nomeadamente: três Embraer 145”, referiu.

Ao Evidências ficaram por responder as seguintes questões: Qual será o fim dos aviões? Quanto é que efectivamente a empresa já gastou em dois anos e meio pela manutenção e estacionamento das aeronaves? Qual é o actual valor de mercado das aeronaves? Qual é a razão principal para preterir daqueles equipamentos, tendo em conta que tem menos custos de operação em relação aos Boings que são alugados e exigem mais custos?

Igualmente procuramos saber porque é que a LAM prefere vender seus próprios aviões para depois ir alugar aeronaves com tripulantes estrangeiros, se há muitos pilotos e comandantes da companhia que estão em terra por falta de aparelhos para operar? Quanto é que a LAM gasta com hospedagem e alimentação da tripulação sul-africana de 12 elementos hospedada no hotel VIP? Quais são os ganhos palpáveis que a empresa logrou, em dois anos e meio, com a retirada de circulação das aeronaves Embraer 190?

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