Não se combate fake news fugindo de jornalistas

EDITORIAL

Em 2020, o Gabinete de Informação (GABINFO) criou uma plataforma para a verificação de conteúdos falsos, denominada Credível. A criação deste mecanismo, escreviam, surge da necessidade de rastrear, avaliar e difundir a informação do, ou atribuída ao Governo.

Na semana passada, a plataforma acessível através www.credivel.gov.mz foi anunciada como já lançada. O portal exibe um conjunto de documentos e mensagens, rotuladas com o carimbo “falso” ou “verdade” consoante o caso, tendo também a indicação da plataforma social de divulgação.

O endereço na Internet inclui ainda uma secção onde são publicados os comunicados oficiais de origem governamental.

No texto de apresentação, o Credível apresenta-se como uma “plataforma de verificação da autenticidade de conteúdos veiculados pela imprensa ou nas redes sociais que suscite, por parte de quem recebe, zonas de penumbra ou incerteza”.

Para quem conhece de longe as instituições nacionais, pode aplaudir a iniciativa que se pretende de promoção da verdade que, neste caso, é detida pelo Governo, acto que coincide no parlamento com a criação da Lei da Comunicação Social, que, de novo, atribui ao Governo o poder de deter a verdade, confiando-lhe o papel de regular os media sem se importar com o facto de disto colocar em risco os princípios de independência e separação de poderes.

Numa observação mais atenciosa do site, ele se apresenta como mais um boletim de informações do Governo.

Ora, é de se reconhecer o poder das notícias falsas, as famosas fake news, cujo combate a nível internacional constitui agenda devido os seus efeitos devastadores a uma sociedade que se quer sã. Elas pululam nas redes sociais e em portais sem credibilidade, explorando o lado emocional do leitor que consome e compartilha o conteúdo sem verificar a veracidade das informações, elevando o número de acessos e compartilhamentos e atraindo anúncios e publicidade paga alimentando essas plataformas.

Ora, existe uma série de cuidados que ajudam a combater e identificar as notícias falsas, mas o principal meio é a consulta dos órgãos oficiais que devem prontamente se pronunciar sobre o caso.

Moçambique tem um histórico de instituições fechadas, com assessores que pouco sabem para quem foram contratados, limitando-se a produzir comunicados sem a mínima abertura aos jornalistas, em caso de dúvidas, especialistas em ignorar os jornalistas, até assessores que passaram das redacções, que conhecem o funcionamento das redacções quando passam para a assessoria, mudam de natureza. No lugar de influenciar para um bom fluxo de informação, blindam as instituições e os governantes, abrindo espaço para a especulação.

A lei do acesso à informação dá um prazo exagerado de 21 dias, mas os pedidos formais de informação levam 30 dias ou às vezes nem são respondidos. O serviço de assessoria está mais para aumentar a distância entre o jornalista e a instituição, do que para flexibilizar a circulação de informação “verdadeira”.

É esse mesmo Governo que diz querer combater notícias falsas, quando não consegue responder um simples pedido de jornalistas. Muitas vezes os assessores se fecham por orientação do próprio GABINFO, que anualmente gasta dinheiro dos nossos impostos com formação daquilo que chamam de comunicadores do sector públicos. É nesses encontros em que são delineadas estratégias de sonegação de informação e, em consequência, os assessores tornaram-se praga de combate ao contraditório e ao direito à informação

No momento em que escrevemos estas linhas, o Evidências tem um pedido de informação enviado há mais de uma semana ao Banco de Moçambique, tem um outro no Ministério de Defesa, no Ministério de Economia e Finanças, e até no privado BCI. Só para acusar a recepção é um problema, o fazem por chamada para não ficar documentado que o email foi recebido. Puro absurdo, sim. Se tivéssemos que colocar no racking, o Ministério de Defesa, estaria no topo. Este até em conferências de imprensa não aceita perguntas. Seus assessores parecem que foram confiados a missão de proteger uma trincheira.

Então, estamos perante a um “detentor da verdade” que se esconde quando abordado sobre um determinado assunto, e, em contrapartida, vai ao seu gabinete, cria um portal para censurar a informação que lhe interessa e do resto, pode se escrever fake news. Nada resta aos jornalistas senão tentar contornar esta democracia fechada. E como tentamos contornar? Contornando os assessores, buscando formas de entrar em contacto directo com as direcções, um caminho que se mostra muitas vezes funcional e célere. Muitas vezes os que sonegam informações não são os governantes, mas sim, seus assessores.

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