- Em carta a Nyusi sobre Cabo Delgado
- Negociante das dívidas diz que forneceu helicópteros, drones, lanchas e outro equipamento
- “É lamentável que Moçambique peça intervenção de mercenários, enquanto existe a ProIndicus”
Enquanto correm, dentro e fora do país, sem fim à vista os complexos processos relacionados com a contratação das dívidas ocultas, cujo dinheiro serviu para a criação das extintas empresas MAM, EMATUM e ProIndicus, esta última de segurança nacional, vigilância e protecção de activos estratégicos à zona económica marítima exclusiva, seus contornos vão assombrando seus mentores, incluindo o antigo ministro de defesa e actual Presidente da República, Filipe Nyusi. Em carta enviada, este ano, à Nyusi, Jean Boustani diz-se chocado com os “recentes”desenvolvimentos “alarmantes sobre o colapso da segurança em Cabo Delgado” e sugere o uso do equipamento enviado àquela empresa em nome da segurança nacional.
Jean Bosutani, o oportunista negociante que, explorando a corruptibilidade que infesta hoje a maioria da massa política que orienta os destinos dos moçambicanos, conseguiu colocar Moçambique num escândalo financeiro sem precedentes, escreveu este ano uma carta a uma das pessoas com quem trabalhou directamente na materialização das empresas que viriam a ser usadas para endividar o país.
Trata-se do Presidente da Republicar, Filipe Nyusi, a quem aponta pecados no fracassado empreendimento da contratação das dívidas ocultas e sugere que deixe de lado impedimentos políticos e faça proveito do pouco que, efectivamente, foi comprado pelo dinheiro das dívidas ocultas.
Na carta de Janeiro, Boustani avisou a Nyusi sobre o possível recrudescimento das ameaças, mas este mostrou-se indiferente, e o resultado é que a ameaça aumentou e o projecto LNG ficou suspenso.
“Estou a escrever-vos na sequência dos recentes relatórios alarmantes dos media sobre o colapso da segurança em Cabo Delgado, a retirada de pessoal das multinacionais de petróleo e gás e o envolvimento de contratantes de segurança privada”, inicia a sua breve carta dirigida ao Presidente da República.
Adiante, Boustani prossegue dizendo que “enquanto (Nyusi) dirigia o Ministério da Defesa, em 2013, criou pessoalmente a ProIndicus, junto com o Ministério do Interior e o SISE. A Privinvest foi seleccionada para construir para Moçambique a sua empresa de segurança nacional para vigilância e protecção de activos estratégicos e zona económica marítima exclusiva, visto que na ausência dessa protecção e segurança não pode haver estabilidade e, portanto, não há desenvolvimento económico e nenhum investimento estrangeiro”.
Na sua intervenção, Boustani que fez graves revelações em sede do julgamento em Nova York, chegando a acusar “New Man” uma figura que se supõe que seja Filipe Nyusi, de ter recebido subornos, questiona a razão de o país estar a recorrer a mercenários, anos depois de ter recebido equipamentos militares, tecnologia e treinamento adequado.
“É lamentável que a República de Moçambique peça hoje a intervenção de empresas de segurança privada, embora o Ministro da Defesa, Jaime Neto, tenha testemunhado pessoalmente, pelo seu envolvimento na Comissão Parlamentar de Inquérito de 2016, os bens e capacidades de pessoal da ProIndicus, que se encontram aptas para lidar com os problemas de segurança que Moçambique enfrenta hoje em Cabo Delgado”, prossegue o negociador, se sensibilizando com um Presidente que lidera um Moçambique ameaçado pelo terrorismo, alto custo de vida e ciclos fenómenos naturais, para além de fome e corrupção.
“Excelência… deixar de lado as razões políticas”
Jean Boustani, negociador da Privinvest na altura da contratação das dívidas ocultas, inocentado em 2019 pela justiça americana depois de 11 meses atrás das grades, por acusação de montar o escândalo das dívidas ocultas, lembra na carta o equipamento entregue a Moçambique pela Privinvest.
Trata-se de um centro de comando e controlo, um sistema de vigilância por satélite, seis aeronaves de patrulha equipadas com sensores, três drones de vigilância, dezasseis radares costeiros, seis embarcações de patrulha offshore, trinta e nove interceptores rápidos, vinte e quatro embarcações de pesca, dois estaleiros, direitos de propriedade intelectual, centros de treinamento e uma embarcação de manutenção e apoio logístico.
O Evidências sabe que os referidos equipamentos foram alocados à Marinha de Guerra, ao Exército, à Força Aérea e alguns ramos da Polícia da República de Moçambique, em Maputo e Pemba, contudo a sua contribuição no combate ao terrorismo é questionável.
“Exorto vossa excelência a deixar de lado as razões políticas que levaram à negação da existência da Prolndicus, a fim de reverter o substancial dano à reputação de Moçambique e às enormes perdas económicas e atrasos no lançamento do seu programa de produção de gás”, escreve Jean Boustani, na carta com timbre da Privinvest, empresa que em documentos apresentados à justiça britânica este ano colocou Nyusi como um dos beneficiários das dívidas ocultas, ao receber uma comissão de um milhão de dólares, enquanto candidato presidencial da Frelimo, no primeiro mandato.
De acordo com o representante da Privinvest, a activação dos meios permitirá a Nyusi “pôr finalmente em marcha a importância do programa ProIndicus que iniciou desde 2012, gerar receitas para o Estado moçambicano (em vez de pagar a mercenários estrangeiros) e, acima de tudo, afirmar a soberania da nação”.
Por último, escreve Boustani, “se e quando decidir abordar este assunto, a Privinvest terá o prazer de apoiar Moçambique como sempre fez, prestando todo o apoio à revisão do estado do equipamento Prolndicus que entendemos ter sofrido ultimamente com a falta de manutenção adequada”.
As dívidas ocultas foram contratadas na euforia de um futuro próspero, quando as receitas da exploração do gás natural estavam previstas para 2023, mas que depois passaram para 2024, e agora, devido à invasão dos insurgentes à Palma, que forçou a suspensão das actividades pela Total, voltou a colocar em causa está data, pressionando a Frelimo a rever sua aposta no gás.
A ProIndicus faz parte das três empresas usadas para contratação das dívidas ocultas no valor total de 2,2 mil milhões de dólares. As três empresas já foram dissolvidas e os seus equipamentos, no caso da EMATUM, encontram-se em franca degradação no porto de Maputo.
Longe dos equipamentos cuja utilidade é desconhecida e dos efeitos nefastos que o escândalo financeiro das dívidas ocultas terá criado a economia, decorre dentro e fora a batalha judicial com vista a esclarecer o caso e responsabilizar os mentores. No entanto, o envolvimento do poder político no caso tem descredibilizado o exercício da Procuradoria Geral da República, que a nível internacional tem somado fracassos, tanto nas acções cíveis intentadas em Londres, onde pedia, em nome do Estado, a declaração da invalidade e ilegalidade das garantias dadas, nos pedidos de extradição de Manuel Chang para Moçambique, entre outros.
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