Desafios do turismo moçambicano

OPINIÃO

Por: Luca Bussotti

Ouvindo o noticiário numa das TVs locais, fiquei aliviado, pensando que, pelo menos a nível do Município de Maputo, o turismo vai constituir, futuramente, um asset entre os principais da cidade. Muitos jovens já se formaram como guias, e ouvindo as entrevistas deles e delas fiquei animado, ao saber que o assunto, desta vez, é sério. Só ouvi um dos organizadores a abordar a questão com um certo optimismo, de que o turismo irá recuperar, devido ao facto que, antes ou depois, a pandemia irá acabar. Na verdade, esta pandemia não irá acabar tão já, provavelmente teremos de lidar com ela no mínimo para os próximos dez anos, portanto qualquer aposta que se faça no turismo deverá considerar este como o cenário mais provável mesmo para os próximos anos.

 Fora disso, mas dentro das perspectivas do turismo moçambicano, no dia seguinte fui à FEIMA, o principal local de venda de produtos artesanais (mas diria artístico) da capital. A FEIMA tem um aspecto muito bonito, por ser um parque, justamente, bonito. Entretanto, a limpeza, dentro e logo fora do parque, deixa muito a desejar, o que não representa um cenário convidativo para os turistas, principalmente estrangeiros. Era a segunda vez, numa semana, que me acontecia lá ir, e pela segunda vez deparei-me com uma situação bastante desoladora: um deserto, ou quase, em termos de presenças e, consequentemente, de vendas por parte dos feirantes.

Ao abordar vários deles, eis que iniciou uma pequena viagem nas dificuldades reais do turismo moçambicano. O turismo não pode reduzir-se a apenas praias lindas (de momento, inclusivamente, interditadas) ou parques naturais. Se o turismo não está associado à valorização da cultura, fica amputado, não anda. Além disso, as produções culturais do país são tão reduzidas que as poucas de qualidade que temos deveriam ser mais valorizadas. Muitos dos vendedores da FEIMA confessaram haver pouco interesse, por parte do Município de Maputo, em ajudá-los a expandir seus negócios, tornando o ambiente mais propício para acolher os turistas, moçambicanos ou estrangeiros que sejam. Por exemplo, muitos deles querem, agora, constituir uma cooperativa ou associação da própria FEIMA, só que isso implica custos (a publicação no BR constitui um entrave enorme, em termos financeiros, para muitas organizações e associações locais), o que dificulta o processo de agregação das forças, que seria necessário para garantir um salto de qualidade à organização do marketing dos vários produtos que ali se vendem. Em segundo lugar, os produtores e vendedores da FEIMA não têm visibilidade nenhuma, salvo o passa palavra e algumas brochuras do Município em que eles também constam. Entretanto, a construção de uma plataforma online que apresenta seus produtos, suas identidades artísticas e suas actividades de extensão (por exemplo com as escolas), com ligação às redes sociais poderia também constituir uma chave para que estes artistas fossem conhecidos em todo o país, mas também fora. Mas nada disso, consoante o que eles disseram, está sendo feito, deixando-os sozinhos, contando só com as próprias forças, que são notáveis em termos de produção, mas extremamente reduzidas quanto à capacidade de difusão e circulação do produto. Não ter, por exemplo, vendas online nessa altura pandémica significa reduzir quase que na totalidade o potencial comercial desta produção.

A FEIMA é apenas um exemplo, que por acaso me ocorreu de acompanhar directamente nesses dias, de um turismo que não vai em consonância com a valorização dos produtos culturais e artísticos locais. Espero que isso possa ajudar a melhorar nalguma coisa o cenário actual, com um engajamento mais forte e determinado quer do Município de Maputo, quer do Ministério da Cultura, que também deveria promover, dentro e fora do país, a produção presente na FEIMA, assim como os próprios produtores, que têm, todos eles e elas, vidas e histórias extremamente interessantes de resgate individual e colectivo através de um dos meios melhores que a existência humana mete a disposição: a arte.

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