Afonso Almeida Brandão
(Epílogo balnear repescado pelo autor de uma crónica sua dos idos de 1998, em Memória do Semanário DEMOS…)
Alcanço, finalmente, a piscina do Hotel Polana, na zona da Av. Julius Nyerere, em Maputo. Exausto e desidratado, tenho a sensação do caminhante no deserto que não distingue o Oásis da Miragem. Escolhida a sombra e depositados os quilos de material transportado, julgo que ganho o descanso. Puro engano. Um jovem de calções e bolsa de cobrador a tiracolo reclama o pagamento de uma exorbitância pela utilização por um dia de duas espreguiçadeiras e um chapéu. Barafusto. Que é assim, responde. E assim ficamos. Ancorado naquela caríssima sombra, chega a hora do unto. Creme nº 60 para os ombros, 40 para a cara, 30 para o tronco e 20 para as pernas. Ao que um homem chega.
Convertido em mesa bingo. Besuntado e escorregadio, proponho-me desfrutar um pouco o sossego. Agora sim, penso. Deixo-me cair na valiosíssima cadeira de 50 dólares. Ao alcançar a perna polvilho-me de relva e areia de um dos canteiros próximos do local onde estou. Abro o Semanário DEMOS — que ajudei a fundar em Outubro de 1994 com o jornalista Elias Cossa e alguns outros nobres colegas — e para o qual escrevi vários anos, e tento lê-lo. Objectivo que descubro ambicioso. O vento que vem do mar fustiga-o por baixo e o vento que vem das barreiras e da Marginal da Costa do Sol atinge-o por cima. Quero desfolhá-lo e ele resiste. As folhas dobram-se e a paciência esgota-se.
Furioso, amachuco-o sem piedade. Escolho um livro. Ao lado, um grupo de senhoras fala animadamente com pronúncia de gente fina. Dez minutos volvidos, fico a conhecer a vida de cada uma, os nomes dos cabeleireiros, maridos e alguns filhos, os números dos peitos e dos pés e do que ganharam e perderam à Roleta no Casino na noite anterior…
Inteiro-me de histórias sobre outras e outros, contadas e ouvidas com volúpia e curiosidade. Percebo o fascínio pelas revistas e pelas festas de sociedade e as uniformes queixas das empregadas domésticas africanas. Os maridos são personagens ausentes, circunstância que nem todas deploram.
Regresso ao livro e adormeço. Sonho com a Redacção, com o ar condicionado, a gravata e a secretária. O livro é de Poesia e é de autoria do meu saudoso e querido colega, o jornalista Heliodoro Baptista, redactor do então Notícias da Beira — actual Diário de Moçambique, após a Independência do País, em 1975.
Sonho com a Redacção da antiga RTK que, à época (1995/1996) cheguei a digerir, na qualidade de Director de Informação, respectivamente, com a responsabilidade conjunta pelos serviços redactoriais da televisão e da rádio. Era seu proprietário e administrador, o saudoso amigo eng. Carlos Klint, conhecido oficial e coronel de infantaria do exército de Moçambique, além de membro influente da Frelimo — partido político que até hoje continua a governar os destinos do nosso País. Vestido a preceito, era assim que eu andava diariamente. É tão bom recordarmos, aqui e agora, esses tempos de boa memória e deixarmo-nos embalar nas asas do sonho…!
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