Em 2020, a Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN), na sua estrutura extensiva, foi apresentado como um instrumento de cura milagrosa de todos os males de norte, alguns já identificados pela academia e pesquisadores nacionais nas publicações que buscam explicar a génese da insurgência em Cabo Delgado.
De forma explicita, ADIN reconhecia que o índice de pobreza, fixada em 67, 50 e 65 por cento nas províncias de Niassa, Cabo Delgado e Nampula respectivamente, e a desnutrição crónica que afecta mais de cinco milhões de pessoas, a metade da população daregião norte, jogavam um papel determinante no processo de recrutamento de jovens que engrossam as fileiras da insurgência.
Do mais Alto Magistrado da Nação, houve humildade para reconhecer que a estratégia dos terroristas “é de explorar jovens com promessas de vida melhor e, depois, os colocar a revoltar-se com os seus próprios irmãos”.
Foram palavras acertadas, dirigidas aos parceiros de cooperação, os únicos que conseguem pôr nosso pedinte governo em movimento e em sentido, claro, quando lhes interessa. Os números e a coerência do plano que, depois da identificação do problema, revelava a solução, mostravam-se como uma flecha bem acertada para atingir a sensibilidade dos parceiros de cooperação, afinal o dinheiro para a concretização daquele “nosso plano” dependia e depende deles, à semelhança dos Planos de Reconstrução, da Gestão dos Deslocados… e dosvários outros desenhados apenas para mobilização e, depois, engavetados.
Um ano e alguns meses, alias, há duas semanas, o nosso Chefe de Estado foi abordado na mesma província, sobre o mesmo problema, mas desta vez não estava na condição de necessitado. Estava ao lado de Kagame, o dono da varinha mágica, e estava preocupado em expor a sua musculatura. Essa nova posição ditou uma narrativa:“Moçambique é um país longo e grande, com mais de 2.800 Km entre Maputo e Rovuma e as assimetrias existem, porém, não se pode classificar Mocímboa da Praia, onde os ataques iniciaram, como o distrito mais pobre do país. A negligência existe, mas também não acredito que seja Moçambique o país mais negligente do mundo”, tentava, desta forma, negar qualquer relação entre a pobreza e o terrorismo, quando abordado pela imprensa internacional se havia qualquer conexão entre os dois.
“Já se avançaram várias razões sobre o terrorismo no nosso país, mas esqueceu-se que o terrorismo tem uma fórmula global e temos de ir à fórmula global para sabermos as razões da sua existência”, criticou.
Enquanto a nossa política enrola-se em discursos de ocasião, há uma incoerência voltada à manipulação da comunidade externa, no lugar de dar informação ao público interno. O facto é que a pobreza do Norte enraíza-se na riqueza, com destaque para o petróleo e gás, em Palma; rubis em Montepuez; grafite em Balama; áreas pesadas em Moma (Nampula); Ouro em Lagos (Niassa). Sem contar com o corredor de Nacala, que liga o Porto de Nacala ao hinterland, através do Malawi.
É mais coerente a narrativa que relaciona as desigualdades sociais, patentes até nos próprios oficiais, em particular na província de Cabo Delgado, como factores determinantes para o desencadeamento e aparente sucesso dos actos terroristas. Uma resposta militar que não leva esses factores sociais em conta ou é cúmplice de prolongamento do terrorismo ou factura os bolsos dos nossos comandantes. É impossível erradicar o terrorismo sem combinar a resposta militar com a distribuição equitativa dessas riquezas.
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