Os nossos professores

OPINIÃO

Luca Bussotti

A semana finda é em muitos países celebrada com o dia do professor. Um dia variável, consoante a história nacional e as opções políticas para homenagear essa figura-chave do xadrez social e civil das sociedades contemporâneas. A nível internacional, o dia do professor é celebrado a 5 de Outubro, e foi estabelecido apenas em 1994 pela UNSECO. Entretanto, esta iniciativa tardia não induziu à mudança de data para celebrar este dia por parte de vários países que já tinham instituído o dia do professor. Se trata de países principalmente do hemisfério Sul, em que a actividade docente sempre foi considerada fundamental para o desenvolvimento da sociedade e o avanço da inclusão social.

No Brasil, por exemplo, o dia do professor continua no mês de Outubro, entretanto ele está marcado para o dia 15. A razão é simples e complexa ao mesmo tempo, evocando momentos históricos marcantes para este país, assim como para o progresso da emancipação feminina e da consciência negra brasileira: foi a 15 de Outubro de 1827 que Dom Pedro I, na altura Imperador do Brasil, criou o ensino elementar no país; e foi graças à acção política de Antonieta de Barros, a primeira preta a ter um cargo político no país, eleita na assembleia legislativa do Estado de Santa Catarina, um dos mais ricos e meridionais do país, que foi aprovada a lei que instituía 15 de Outubro como feriado dedicado ao professor. Lei estadual que anos mais tarde, em 1963, um Decreto federal tornou feriado nacional, que até hoje se celebra.

No caso de Moçambique também o dia do professor tem ligações bastante evidentes com a luta emancipatória do país. Foi a 15 de Outubro de 1981 que Samora Machel criou a Organização Nacional dos Professores (ONP), e é por isso que, até hoje, este dia é celebrado, em Moçambique, numa data diferente com relação ao dia internacional, estabelecido pela UNESCO.

Fora desses pormenores, que entretanto dizem respeito à própria história dos vários países, a figura do professor, em todo o mundo, sofreu um processo de desvalorização. Num mundo mercantilizado, em que o valor de uma profissão se mede com o ordenado, o professor se coloca – entre as profissões intelectuais – nos últimos lugares, inclusivamente em Moçambique, onde a sua falta, principalmente fora das grandes cidades, continua gritante.

Alguns dados estatísticos, publicados pelo INE, dão uma ideia mais clara da situação: com efeito, a via para uma educação de qualidade, que vê na figura do docente o pilar fundamental, tem sido complicada. Se, em 1975, o rácio entre alunos e professores no EP1 era de 65,3:1, trinta anos mais tarde, em 2005, ele tinha piorado, com um rácio de 74,0:1, para reduzir parcialmente nos anos a seguir, mas ainda sendo de 65:1, com várias realidades, principalmente no norte do país, ainda acima dos 70 alunos por professor, como na província de Nampula.

A meta que o governo tinha estabelecido, de reduzir o rácio a 57:1, não foi alcançado, e o mesmo deve ser dito acerca da necessidade de novas salas de aulas e de contratação de novos docentes. A tendência para os níveis superiores de ensino reflecte a mesma do EP1, podendo, portanto, concluir que a educação inclusiva e de qualidade está ainda muito longe de ser alcançada.

Ademais, o professor não está isento de influências negativas de tipo social. Infelizmente, a degradação ética geral, associada à desvalorização cada vez evidente do papel do docente tem provocado situações terríveis, em que a família, de um lado, e a escola (e os professores) de outro lado, representam os lugares mais inseguros para as crianças moçambicanas. Notícias de violações de meninas menores de 14 anos por parte de pais, tios, professores já passam despercebidas aos demais, sendo provavelmente este um dos motivos que faz com que boa parte da população moçambicana em idade escolar não só não frequente a escola oficial, mas não acredite nela.

Em suma, a retomada do papel educativo do professor, cujo dia acabámos de celebrar semana passada, passa sim por políticas públicas mais coerentes, mas também para uma deontologia profissional que vê nesta figura central um ponto de referência para a emancipação de todos os jovens, uma fonte de inspiração que ninguém tem o direito de trair com comportamentos reprováveis e condenáveis.

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