- Max Tonela é para salvar o “jogo” e batalhas dentro da Frelimo
- Geria as contas públicas com excesso de rigor e entrava em choque com programas dos colegas
- Há quem relaciona nomeação de Tonela nas finanças com o Congresso
A recondução de uns, o isolamento de outro, seguida da flexibilização de acções que antes não mereciam devida prioridade, veio sugerir uma possível explicação para as movimentações que renovaram a configuração do Governo de Filipe Nyusi. Evidências apurou que enquanto ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, uma figura atrelada ao profissionalismo, recentemente promovida ao cargo de Primeiro Ministro, terá gerido as finanças públicas com “mão de vaca”, devido ao seu profissionalismo e excesso de cautela e rigor, chegando a atrasar ou colocar em causa o financiamento atempado de alguns projectos de sectores-chave da governação. Esta é apontada como a principal causa das últimas mexidas no governo, que culminou com a nomeação de Max Tonela, ex-titular da pasta dos Recursos Minerais e Energia. Tonela é economista e foi a figura que geriu as finanças da campanha eleitoral que reconduziu Nyusi, e agora assume a pasta das finanças públicas, uma lealdade que pode garantir a musculatura financeira para os próximos tempos turbulentos, a começar pela sobrevivência no XII Congresso que se avizinha.
Adriano Maleiane, com uma carreira política que remonta desde os tempos de Joaquim Chissano, assumiu as pastas das finanças desde o primeiro mandato de Filipe Nyusi. Seu percurso foi notório, apesar da mancha das dívidas ocultas, um dossier deixado pelo seu antecessor, Manuel Chang, ora em contas com a justiça de três países.
É o mais velho do governo, com passagem por vários cargos de chefia e direcção. É descrito como cauteloso e bastante prudente na análise de riscos e gestão de finanças públicas, mas em meio ao mandato acabou sendo substituído e no seu lugar foi promovido Max Tonela, um dos ministros mais notáveis da governação de Filipe Nyusi. Maleiane foi promovido para primeiro-ministro, passando a ser uma figura meramente cosmética.
Maleiane vinha assumindo a pasta da Economia e Finanças desde 2015 e, num contexto bastante difícil, marcado por guerras, intempéries, secas cíclicas e crise da dívida, trabalhou em momentos de austeridade para impor a disciplina, apoiar a economia e completar uma série de reformas que reduziram a dependência externa e imprimiram transparência nas finanças públicas.
Nesta senda, os pagamentos aos funcionários públicos foram digitalizados e os pagamentos do Governo aos fornecedores foram automatizadas, com a expansão E-Sistafe, além de terem sido tomadas acções de regularização da utilização de receitas excepcionais, assegurando que os ganhos possam somente ser usados para o investimento público, o pagamento da dívida ou emergências do país. Os últimos foram compromissos que não encontraram o terreno, com o Estado a gastar mais em despesas e com investimentos sem retornos, na maioria das suas empresas tecnicamente falidas.
Nesse percurso, o legado dos seus antecessores não permitiu que Maleiane perseguisse sem mácula. Veio a ser o único ministro do Governo de Nyusi a sentar na barra do tribunal, no julgamento que decorre na tenda da B.O, na qualidade de declarante para prestar esclarecimentos.
Mais ministros foram solicitados, mas o juiz da causa indeferiu os pedidos que arrolavam membros do Governo, incluindo o Presidente da República, solicitado em mais de três requerimentos.
Da incerteza nas finanças públicas, facto reconhecido num dos informes do PR à Nação, na AR, num cenário de isolamento pelos parceiros de cooperação e de nenhuma produtividade das empresas públicas, Maleiane conseguiu, contra todas as expectativas, manter o Estado a funcionar através de receitas próprias, ao mesmo tempo que foram agravadas receitas e introdução de medidas que elevaram o custo de vida.
Os cortes e afinações de Maleiane
Numa postura incómoda, ele mostrou “mão de vaca” a projectos políticos, cujas ordens de pagamentos nunca tiveram a pronta disponibilidade de Adriano Maleiane, como é o caso do projecto Sustenta.
Durante muito tempo, os pagamentos do extensionista, que assistem os produtores do Sustenta, estavam bloqueados. Não era a primeira vez que Maleiane atrasava pagamentos de extensionista, aumentando o barulho à volta daquele projecto político que vai ganhando uma certa aceitação, mais pela persistência dos seus mentores do que pelos resultados.
E em meio a esse percurso, com a sua veia de austeridade, conseguiu estabilizar e estimular a tímida recuperação da economia, mantendo em meio às várias pressões externas, abandono dos parceiros, Covid-19, entre outras pressões externas.
Do resto, Maleiane veio desde a era Joaquim Chissano, uma geração de princípios no que diz respeito à gestão da coisa pública, onde assumiu as funções de governador do Banco de Moçambique. Mas é no Governo de Nyusi que chega ao cargo do primeiro-ministro, uma figura de menos protagonismo na actual configuração do governo, depois de em voz baixa ter circulado informações de que à semelhança de alguns terá pedido para sair, mas são informações que nunca foram confirmadas.
O gestor das contas para “ganhar o jogo” e batalhas dentro da Frelimo
O vazio deixado pela sua queda das finanças, em meio da segunda parte do “jogo” que Filipe Nyusi deixou claro que quer vencer, veio a ser preenchido por Max Tonela, um dos ministros de círculo fechado de Filipe Nyusi, que vem de Recurso Minerais e Energia, onde a insurgência de Cabo Delgado adiou os grandes projectos de desenvolvimento, apresentados com um optimismo obsessivo na campanha que reconduziu Nyusi. Nyusi foi buscar o subordinado de Max Tonela, Carlos Zacarias, Presidente do Conselho de Administração do estratégico Instituto Nacional de Petróleos.
A Covid-19 foi o outro flagelo que estagnou o sector mineiro e o sector de petróleo e gás, que estão na fase de implantação e dependentes de especialistas estrangeiros para suas operações.
Tonela, um economista que granjeia simpatia no círculo restrito de Nyusi, de acordo com fontes bem posicionadas, foi o ministro que geriu as finanças de Filipe Nyusi na campanha que o conduziu ao segundo mandato.
No momento que se aproxima o Congresso da Frelimo, onde seu presidente chega com uma imagem desgastada, não se descarta a compra de lealdade com recurso aos fundos públicos, aliás, são bastantes as evidências que sugerem o uso dos fundos públicos para fins políticos. O facto é que Maleiane não estava a ceder e a indicação de uma figura de confiança, com um mínimo domínio das finanças públicas, era indispensável para permitir pinceladas que pudessem garantir uma margem para batalhas internas no partido que se aproximam.
Tonela vem desde o primeiro mandato de Filipe Nyusi, depois de uma passagem pela Electricidade de Moçambique (EDM) e mais tarde na Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), onde administrava as finanças. Começou por ocupar o Ministério da Indústria e Comércio a partir de 2015 e depois foi confiado o Ministério de Recursos Minerais e Energia, onde mostrou certo empenho.
Nos hidrocarbonetos, Tonela conduziu negociações com as petrolíferas que exploram gás natural da Bacia do Rovuma, tendo sido sob sua liderança que foi tomada a Decisão Final de Investimento do Projecto Golfinho/Atum, da Área 1, actualmente liderado pela francesa Total. Orçado em mais de 23 mil milhões de dólares, é o maior investimento directo estrangeiro em África, entretanto interrompido devido aos ataques dos extremistas violentos em Cabo Delgado.
Max Tonela é um dos ministros próximos do Presidente Nyusi. E há quem relaciona a administração das finanças públicas com o Congresso onde será necessário dinheiro para o controlo do poder. Não seria nenhuma surpresa, o partido Frelimo é financiado através das finanças públicas. Além de Congresso, consta também a busca de legado de Filipe Nyusi e a sobrevivência do período pós-poder, que passa pelo controlo do próximo candidato, o que acarreta custos.