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A longa espera pelos livros: é preciso responsabilizar a negligência e a inércia

Dentro de dias, milhares de crianças que frequentam o ensino primário vão às férias sem ter manuseado qualquer manual. Oficialmente, os livros estão a chegar, e até ao final de Abril todos já terão. Mas prometer foi sempre fácil. Na abertura do ano lectivo, a ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, Carmelita Rita Namashulua, prometeu, para fins de Fevereiro, a distribuição do livro escolar para o Ensino Primário, de 1ª a 6ª classe, mas até aqui só foram distribuídos 1.064.872 manuais dos 16.947.600 livros previstos para distribuição.

No próximo dia 05 de Maio, estas crianças vão de férias, concretizando-se o fecho de uma parte de um grande círculo sem que os petizes tenham experimentado aulas não improvisadas, principalmente os de 1ª e 2ª classe, que usam os manuais como cadernos, e por razões óbvias o seu ensino demanda maior interacção com o livro. Os da 1ª classe entram pela primeira vez no Ensino, e já são ensinados a sobreviver e se arranjar face ao fracasso do Estado em garantir-lhes um direito que lhes assiste.

O Governo não consegue, aliás, ele não existe, e na sua ausência é preciso fingir que a Educação pode ser improvisada, pelo menos as crianças entenderam e absorveram esta realidade que marca o início do fracasso da Educação em cadeia: sem livros, de baixo de árvores e em número superior para um professor que é mal pago e, por vezes, mal preparado, em compensação terão o benefício das passagens automáticas.

São os petizes a pagar pela negligência de um Executivo que rasgou a integridade e moralidade, num país sem cultura de responsabilizar exemplarmente os maus gestores da coisa pública. Nem sempre é a corrupção que é o problema, é a cultura de minimizar aspectos que minam o futuro ou que conduzem e criam oportunidades para corrupção.

Desta vez são as impressoras e o frete que falharam, segundo o Ministério da Educação e Desenvolvimento Rural, como se fosse de todo normal um Estado que se quer sério não conseguir ter uma impressora para imprimir material didáctico ou no mínimo ter um plano de contingência.

Não são só os impostos dos moçambicanos a serem mal geridos, é também dinheiro dos doadores. Meses depois da resposta internacional ao pedido de apoio para mitigação dos efeitos da Covid-19, no sector da Educação, foram previstos 570 milhões de meticais para aquisição do livro escolar da 1ª à 7ª classe. Não se percebeu por que razão grande parte do valor alocado à Educação foi usado para a compra do livro escolar, uma despesa regularmente financiada pelo Orçamento de Estado e coberta sem qualquer anúncio antecipado.

Estamos entretidos debatendo a corrupção, talvez por ser a podridão palpável do Governo, um único pecado assumido até ao mais alto nível, empenhando em sacrificar alguns em nome de um combate cerrado contra ela, mas a negligência e a inércia revelam-se mais prejudiciais do que a corrupção.

Está na dificuldade de pôr livro nas escolas, na incapacidade de pôr medicamentos nos hospitais públicos quando a cada 30 metros pululam farmácias detidas pelos funcionários de Saúde, na ausência de pôr estradas quando o alto Magistrado da Nação hasteia abertura do um furo de água como a conquista da sua governação. Mais do que corrupção, já enraizado até na medula, é preciso parar de normalizar a negligência e a inércia dos nossos gestores públicos, que na abundância da inércia maquinam taxas para enfardar mais e mais a vida dos moçambicanos.

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