- Democracia interna na Renamo posta à prova
- “Não me vejo como presidente da Renamo, mas se houver vontade que assim seja”
- RENAMO havia já garantido que Ossufo Momade era candidato natural
- Araújo compara governação de Nyusi com um barco à deriva no alto mar
A 05 de Julho de 2021, no calor do debate após a aparição de um pretenso filho de Afonso Dhlakama, disposto a disputar o trono na Renamo, partido que o seu pai liderou por quase quatro décadas, o secretário-geral da perdiz, André Magibire, sentenciou que a Renamo já tem candidato, ao referir que “devem mobilizar toda a família por forma que em 2023 ganhemos todas as autarquias e em 2024 levemos Ossufo Momade à ponta Vermelha”. No entanto, esta “ordem interna” do número dois do partido parece não ter tido eco nas hostes da perdiz e já surgem prováveis desafiantes. Na semana finda, o autarca de Quelimane, Manuel de Araújo, admitiu candidatar-se à liderança da Renamo, o que o tornaria automaticamente candidato presidencial nas próximas eleições gerais.
Evidências
Formalmente, o mandato de Ossufo Momade na liderança da Renamo finda em Janeiro de 2024, quando completará cinco anos depois de ter sido eleito a 17 de Janeiro de 2019, no último Congresso do partido realizado nas matas de Gorongosa, porém, se depender do secretário-geral do partido, o actual presidente da perdiz poderá ser novamente candidato em 2024.
Dirigindo-se às mulheres membros da Liga Feminina do partido, na cidade da Beira, a 05 de Junho de 2021, Magibire pediu-as para trabalharem de modo a garantir a eleição de Ossufo Momade às Presidência da República em 2024, mostrando-se convicto que este será o candidato do partido nas próximas eleições presidenciais.
“Devem mobilizar toda a família (maridos e filhos dos membros da liga feminina), por forma que em 2023 ganhemos todas as autarquias. Em 2024, levamos Ossufo Momade à ponta Vermelha, todos os governadores e todos os distritos sejam dirigidos pelo partido Renamo”, sublinhou Magibire.
No entanto, tudo indica que a recondução “tranquila” de Ossufo Momade não só é apenas um dado adquirido, como também poderá enfrentar alguns adversários de peso nas próximas eleições internas.
Numa entrevista que concedeu à Agência Lusa, à margem da participação na Conferência NOVAFRICA 2022, sobre Desenvolvimento Económico, o edil de Quelimane, Manuel de Araújo, que recentemente foi censurado pela dircção do partido, admitiu candidatar-se à liderança da Renamo a tempo de disputar as eleições presidenciais de 2024, defendendo que o partido deve ser muito mais actuante.
Questionado pela Lusa se se vê como líder da Renamo, Manuel de Araújo começou por ser lacónico, mas acabou por morder a isca.
“Eu não me vejo como presidente da Renamo, mas se houver vontade que assim seja, bom… quando a pátria nos chama nós nunca devemos dizer não. Se o desafio for esse, acho que a decisão, na devida altura, vai ser tomada, mas para já estou concentrado no município de Quelimane”, admitiu Manuel de Araújo.
A demonstração de disponibilidade de Manuel de Araújo acontece numa altura em que há vozes dentro da Renamo, que questionam a liderança do homem eleito para dirigir os destinos do partido depois da morte de Afonso Dhlakama.
Araújo não é o primeiro membro da Renamo que ameaça encurtar o reinado de Ossufo Momade. Em Novembro de 2020, Henrique Dhlakama, filho de Afonso Dhlakama, anunciou a sua candidatura para as eleições presidenciais de 2024. Na altura, alegou estar a responder a “pedidos insistentes por parte de atores políticos e sociais, nacionais e internacionais, bem como diversas facções da RENAMO”, para depois rematar que “a decisão pessoal de participação na vida política ativa surge na sequência das divisões políticas no seio da RENAMO”.
O artigo 25 dos Estatutos deste partido indica que o mandato do respectivo presidente é de cinco anos, o que significa que o actual mandato de Ossufo Momade termina em Janeiro de 2024. No entanto, apesar de ser renovável, os estatutos indicam que é competência do Congresso eleger o seu presidente.
Refira-se que a Renamo nunca foi dirigida por um membro civil, ou seja, que não tenha passado de militar, e não tem, por assim dizer, uma tradição de democracia interna. Afonso Dhlakama liderou o partido por décadas sem ser legitimado por processos eleitorais internos.
Araújo compara governação de Nyusi a um barco à deriva em alto mar
Nas entrelinhas, Manuel de Araújo comparou a actual governação do país com um barco à deriva no alto mar e em tempo de tempestade, tendo declarado que o comandante (Filipe Nyusi) não sabe como lidar com a situação.
“Moçambique está no mar alto, em tempo de ciclone, e infelizmente o nosso chefe de Estado, que é o piloto desse barco, parece ter perdido a bússola, não sabe para onde o barco vai; quer salvar o barco, não lhe falta vontade, mas não sabe para onde ir; precisamos de uma governação alternativa, a Frelimo esgotou-se, está há quase 50 anos no poder, já não consegue renovar-se a si própria, são escândalos atrás de escândalos, o projeto de governação chegou ao fim, bateu na rocha”, declarou.
Na referida entrevista, Araújo voltou a deixar críticas veladas à oposição, defendendo que os partidos opositores deviam ter começado a reorganizar-se há três anos.
“A oposição deve organizar-se e traçar estratégias para poder diariamente mostrar as falhas do sistema de governação, mas isso não é suficiente, é preciso apresentar ideias alternativas (…), é aí que a oposição não tem sido muito atuante, deixa muito a desejar, e Moçambique precisa de uma oposição muito mais atuante do que a que existe actualmente”, disparou Araújo.