Primeiro Secretário da Frelimo em Tete envolvido no desvio de mais de um milhão de meticais

DESTAQUE POLÍTICA
  • Gonçalves Jemusse ordenou pagamentos indevidos para si e seus comparsas
  • Jemusse e companhia facturaram 731 mil meticais com subfacturação de preços
  •  Erário público era drenado para contas dos gestores com recurso a guias falsas
  • Viciou concurso público para contratar sua própria esposa ao arrepio da lei

O actual primeiro secretário provincial da Frelimo em Tete, Gonçalves João Jemusse, está a responder em tribunal a um processo de corrupção em que ele e mais quatro elementos são acusados de desvio de perto de um milhão de meticais dos cofres do Estado. O caso deu-se de 2019 a 2021, quando o actual número um da Frelimo em Tete desempenhava as funções de Administrador do distrito de Chiúta. Segundo a acusação do Ministério Público, aproveitando-se das suas funções, urdiu um esquema em conluio com funcionários de alto escalão daquele distrito para beneficiar a si e terceiros.

Reginaldo Tchambule

Com o número 1/05/P/GPCCT/2021, o processo foi instruído e remetido ao tribunal pelo Gabinete Provincial de Combate à Corrupção da Cidade de Tete, no passado dia 17 de Junho do ano corrente, tendo como co-arguidos Raimundo Eduardo Cebola, solteiro, de 51 anos de idade, gestor;  Gonçalves João Jemusse, de 42 anos de idade, professor de profissão que à altura dos factos exercia as funções de Administrador do Distrito de Chiúta; Manuel Mouzinho Joaquim Cebola, secretário permanente; Egrila Miranda das Dores Devessone Alfredo, técnica das Finanças; Domingos Puzumado, chefe da Repartição de Administração Local e Função Pública; e, Jardito Anastácio Adriano, gestor de Pessoal.

O partido Frelimo na província de Tete pode estar a ser gerido por uma pessoa de conduta duvidosa. De acordo com a acusação a que o Evidências teve acesso, no ano de 2019, em comunhão de ideias, os arguidos Raimundo Eduardo Cebola, Gonçalves João Jemusse, Manuel Mouzinho Joaquim Cebola e Egrita Miranda das Dores Devessone Alfredo concordaram transferir um valor total de 300.000,00 Mts da rubrica de ajudas de custo da Secretaria Distrital de Chiúta para as suas contas bancárias.

Para a execução deste propósito, o arguido Raimundo Eduardo Cebola fez a proposta para o pagamento daquele valor, na sua qualidade de gestor de orçamento. A proposta teve o parecer favorável do arguido Manuel Mouzinho Joaquim Cebola, na qualidade de gestor Distrital do Orçamento e Controlo de despesa e teve autorização do arguido Gonçalves João Jemusse, na qualidade de ordenador de despesas.

Feito o esquema, o valor começou a ser drenado nas contas particulares e, segundo a investigação do GPCCCT, no dia 10 do Mês de Junho do ano de 2019 o arguido Raimundo Eduardo Cebola recebeu na sua conta bancária, domiciliada no Banco Millennium BIM, com 203463806, o valor de 80.000,00Mt.

Por seu turno, o actual secretário provincial da Frelimo, o arguido Gonçalves João Jemusse, recebeu na sua conta bancária, domiciliada no Banco Millennium B1M, com n° 209144417, 75.000,00 meticais, no mesmo dia.

Já no dia 19 do mesmo mês, coube a vez de arguido Manuel Cebola receber na sua conta bancária o valor de 85.000 meticais, enquanto a arguida Egrita Alfredo recebeu na sua conta bancária o valor de 60.000,00Mts no dia 10 de Junho do mesmo ano.

E porque estavam cientes da sua conduta desviante, o actual primeiro secretário da Frelimo em Tete e seu grupo forjaram guias de marcha que confirmam terem feito actividades em outros locais fora da Vila Sede do Distrito, mas de acordo com a acusação não houve nenhuma actividade realizada e, pior, nem fundamentavam o dinheiro que receberam.

Já apertados pela investigação, os arguidos justificaram ter usado o dinheiro transferido para suas contas para pagamento de provedores de serviço, aos quais a Secretaria Distrital tinha uma dívida, uma vez que não existia verba na respectiva rubrica. Juntaram, para o efeito, dois talões de depósito para comprovar o pagamento à Estalagem Zinapípia, no valor de 60.000 meticais, e o pagamento ao Hotel Zambeze, o Paraíso Misterioso, no valor de 70.000,00 meticais. No entanto, não conseguiram justificar o uso do valor remanescente de 170.000 meticais.

Como se tal não bastasse, o valor depositado em suas contas foi levantado em diversos movimentos esporádicos e transferido para contas da plataforma m-pesa, o que aumenta ainda mais as suspeitas.

 Dinheiro dos professores caiu no bolso do administrador

Ainda segundo a acusação, no mês de Dezembro do ano de 2019, foi transferido para a conta do arguido Gonçalves João Jemusse, via SISTAFE, a partir da Secretaria Distrito de Chiúta, na rubrica de ajudas de custo, o valor de 50.000,00Mts, com alegação de que era um reforço dado pela então Direcção Provincial de Economia e Finanças de Tete destinado ao Administrador do Distrito para fazer face às actividades de monitoria do processo de exames.

Sucede, porém, que o valor de reforço a que a então Direcção Provincial de Economia e Finanças de Tete fazia menção era para pagamento de ajudas de custo do pessoal docente envolvido no processo de exames escolares. No entanto, contrariando o fim para qual era destinado, Jemusse ficou com o dinheiro na totalidade e não realizou deslocação alguma para justificar o pagamento.

À investigação, apresentou uma guia de marcha que faz referência a uma apresentação ao Serviço Distrital de Educação, Juventude e Tecnologia, ou seja, desceu do seu gabinete para uma subunidade orgânica.

Urdiram um concurso de compra de motorizadas a 923 mil e ficaram com 731 mil meticais

Segundo a acusação, num outro momento, em Novembro do mesmo ano do 2019, os arguidos Raimundo Cebola, Gonçalves Jemusse e Manuel Cebola pagaram um valor total de 923.260,00 meticais para aquisição de cinco motorizadas e igual número de capacetes, não seguindo os regimes de contratação pública.

“Neste processo, o arguido Raimundo Eduardo Cebola fez a proposta para o pagamento daquele valor, na sua qualidade de gestor de orçamento, a proposta teve o parecer favorável do arguido Manuel Mouzinho Joaquim Cebola, na qualidade de gestos Distrital do Orçamento e Controlo de despesas, e teve autorização do arguido Gonçalves João Jemusse, na qualidade de ordenador de despesas”, lê-se na acusação.

Destas motorizadas, uma é da marca Honda, ACE 125, e quatro são da marca Dayun, 139 FMA. A da marca Honda teve o custo de 156.510,00Mts e as da marca Dayun tiveram o custo de I89.500.00Mts, cada uma.

Ora, no entender da acusação, para as motorizadas da marca Dayun houve uma clara subfacturação, na medida em que o custo médio da mesma motorizada na Cidade de Tete era de 48.000,00Mts, à data dos factos. Investigadores do GPCCCT estimam que só nesta operação o actual primeiro secretário da Frelimo em Tete e seus comparsas tenham lesado o Estado em mais de 731.260 meticais.

Ainda, referente à contratação pública, entre outros pagamentos de bens e serviços, no ano de 2019, a Secretaria Distrital de Chiúta pagou e adquiriu bens consumíveis de escritório e informático à empresa Mbuluma MB e F, Lda, num valor total de 467.422 meticais. No ano de 2021, a Secretaria Distrital de Chiúta, através do regime de concurso por cotação, contratou e pagou, por três vezes distintas, à empresa Mbuluma MB e F, Lda, para o fomecimento de material de Higiene e Limpeza, no valor de 39.444,25Mts; o fornecimento de aparelhos de Ar-condicionado, no valor de 115.000,00Mts e; para manutenção de aparelhos informáticos, no valor de 49.969,39Mts

Sucede que o co-arguido Raimundo Cebola, que inclusive fazia parte dos membros do Júri, como vogal, é sócio da empresa Mbuluma MB e F, Lda.

Jemusse viciou concurso para admitir sua esposa

O actual secretário da Frelimo em Tete vai ainda acusado da prática de nepotismo, por ter admitido em circunstâncias estranhas a sua própria esposa, com quem vive em comunhão de mesa e cama, de nome Madalena Fraqueza.

Para lograr os seus intentos, forjaram assinatura do primeiro classificado para simularem a sua desistência, de modo a beneficiarem a esposa do então administrador de Chiúta na vaga de assistente técnica. O seu contrato teve início no mês de Outubro do ano de 2021 e foi suspenso no mês de Maio do corrente ano, tendo já sido pago um valor total de 46.587,79Mts.

“O arguido Gonçalves João Jemusse, na sua qualidade de dirigente máximo do Governo do Distrito, tinha conhecimento e consentiu naquela viciação do processo de concurso para benefício próprio e de terceiro a si ligado e bem assim autorizou. Assim agiu, pois a cidadã Madalena Francisco Baptone Fraqueza é sua companheira, com quem vive em união de facto. Portanto, tinham interesses pessoais em todo este processo”, sublinha o Ministério Público.

No entender do Ministério Público, há fortes indícios de o primeiro secretário da Frelimo em Tete, Gonçalves Jemusse, ter cometido dois Crimes de Peculato, dois crimes de Abuso de cargo ou função, Outro Crime de Falsificação de documentos e Outro Crime de pagamento de remuneração indevida.

Já Raimundo Eduardo Cebola é acusado de Um Crime de Peculato, Outro Crime de Falsificação de documentos, abuso de cargo ou função e Participação económica em negócio. Os restantes arguidos também vão acusados dos mesmos tipos de crimes à excepção do último.

O Ministério Público considera que agrava a responsabilidade criminal dos arguidos, as circunstâncias (premeditação), pacto entre mais de duas pessoas, violação do dever inerente a seu cargo (especial obrigação de não cometer) e concurso de crimes. Atenua a responsabilidade criminal dos arguidos obom comportamento anterior e a apresentação voluntária às autoridades.

O Ministério Público manteve os arguidos em liberdade, contudo havendo o risco de dispersão de património e ao fim do processo não exista dinheiro ou bens para o ressarcimento ao Estado e até ao pagamento da pena pecuniária, todos foram obrigados a pagarem uma caução económica que varia de 400 mil meticais a 20 mil meticais a serem pagos num prazo de 60 dias.

No fim, o Ministério Público pediu uma condenação em multa no valor de  344.0l9 meticais ao primeiro secretário da Frelimo em Tete, Gonçalves Jemusse, enquanto os restantes co-arguidos deverão pagar coimas que variam de 294 mil a sete mil para indemnizarem o Estado pelos danos.

Diante deste cenário, a pergunta que não quer calar é: sendo o partido dirigido por um indivíduo de índole duvidosa e com experiência na prática de corrupção, a quantas andam as contas do partido em Tete?

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