Por: Honório Isaías
Nós os homens temos muitos medos. Pode não parecer, mas os temos e os sentimos desesperadamente. Podemos fazer pose de Van Damme, ou Bruce Lee, mas não andamos muito longe de borrar as calças feito crianças assustadas, sempre que temos que fazer das tripas o coração e mostrar ao mundo toda a coragem que as situações nos obrigam. Dos muitos medos que temos, o maior de todos é que o mundo saiba que afinal temos medos e alguns deles são medos ordinários e outros inofensivos aos olhos da maioria dos terráqueos.
Quanto nos custa a farsa de destímidos corajosos? Homens que enfrentam todas as situações, feito gladiadores ou Davi.
Não existe castigo maior do que ter de levar a vida sentindo medos e sem poder confessá-los ao mundo. Toda vez que uma movimentação estranha se faz num quintal, há um homem preste a entrar em colapso nervoso, pois, tem de erguer o peito e caminhar destimidamente em direção ao perigo, mesmo pressentindo que a sua atitude está mais para um acto suicida do que homicida.
Mas também a falta de bom senso dos intervenientes nestas situações, é estarrecedora. Se não são as esposas ou parceiras a colocarem à prova a destimidez dos homens, são os filhos, que crentes da invencibilidade dos seus heróis, confiam nestes o enfrentamento de todas as situações perigosas. Estas criaturas, são capazes de prometerem porrada às ferozes bestas que pesam mais de 100kg e 90kg de puro músculo em nome de um homem franzino, raquítico, anémico e muito malnutrido. Até aí tudo bem, afinal o discurso social coloca os homens como protectores da família. O que não dá para levar a sério, é a falta de sensatez de muitos de nós os homens, sair por aí comprando todas as lutas. Entendo que cabe a nós a proteção da família, mas muitas lutas podem ser evitadas, se os homens compreenderem que não há necessidade de incorrer a riscos desnecessários, apenas para afirmar a nossa masculinidade. Em muitos casos, uma predisposição ao diálogo, pode evitar traumatismos craniano, fracturas de ossos e até a morte.
O que nós os homens somos capazes de fazer para parecer que não temos e nem sentimos medo de nada é estarrecedor. Homens eu sei disso, sei porque já fui refém dessa necessidade de nos agigantarmos diante do medo. De procurar mostrar às mulheres ou aos homens o quanto pertencemos ao seleto grupo dos destímidos homens. Durante esse período, tudo que consegui foi muita porrada, cicatrizes, vexame e a sensação de que o homem verdadeiro até para perder tem de dar o sangue. Ah, quem me dera se alguém me tivesse dito “amigo você não precisa provar nada a ninguém, admita os seus limites, se tiver medo, deixe os seus saberem disso”.
O pai da minha mãe, não tinha alguma pretensão de esconder os seus medos e por isso sempre que visse uma cobra gritava o nome da esposa e era ela, a mãe da minha mãe que se encarregava de as matar. Eu já admito os meus medos, tenho muito medo de me envolver em lutas físicas, por isso que quando essa possibilidade se aproxima eu trato de dizer logo “ somos adultos, não vejo a necessidade de levar as coisas para esse extremo, vamos conversar, e desde já queira me desculpar caso tenha feito ou dito algo que o tenha transtornado ou ofendido” e se o meu palavreado não sortir efeito, ainda tenho minhas pernas para me transportar para bem longe da luta.
A questão que quero trazer a reflexão neste texto de hoje, tem a ver com o imperativo que se impõe aos homens de não manifestar medo e nem admiti-lo. A imagem que se cria e que se impõe aos homens, é a de homem corajoso, destemido, capaz de enfrentar todos os perigos. E porquê nós os homens, não admitimos os nossos medos, e fazemos de tudo para parecermos destímidos… e que prejuízos isso acarreta a nossa saúde física e mental?
Quando nós os homens acreditamos que ser corajoso é uma característica inalienável e intrínseca a nossa existência masculina, logo à partida estamos dispostos a entrar em qualquer guerra, até nas guerras mais banais e fúteis. Morremos nas lutas, e as vezes morremos para não deixar dúvidas sobre a nossa masculinidade.
Neste texto quero trazer para nossa reflexão, dois pontos que julgo pertinente. O primeiro tem a ver com o medo que nós os homens temos de admitir, o segundo, o que a ideia de homens destemidos nos obriga.
O medo é uma característica dos seres vivos, por exemplo no mundo animal, os oponentes sempre avaliam a possibilidade de conseguir o sucesso, quando essa possibilidade estiver muito distante, um deles abandona a contenda, foge ou se deita em posição de submissão. Ora, se os animais, ditos não racionais, são capazes de avaliar o risco de uma batalha à prior perdida, porquê o homo sapiens sapiens insiste em envolver se em lutas que à partida sem condições de vencê-la. Não quero dizer que sempre que tal possibilidade de vitória se verificar os homens devem enveredar pela contenda. Até porque a ideia central deste texto é que se o homem admitir os seus medos, primeiro estará se reconciliando com uma característica que é humana, e ao assumir os seus medos, estará em condições de avaliar as suas acções e em certos casos pedir ajuda.
Ser corajoso, já foi determinante para a sobrevivência do homem e sua prole, no tempo em que os homens viviam basicamente da caça. Nessa altura ser destemido era importante para enfrentar os animais selvagens. Ora, hoje ser destemido perdeu a sua função inicial, é chegada a hora de admitirmos os nossos medos. Admitir os medos não significa que não podemos nos desafiar a superá-los quando em causa está o nosso bem-estar ou da nossa família. Mas admitir que sentimos medos, é importante para desenvolvermos outras habilidades de resolução de conflitos e de enfrentamento das situações que ameaçam a nossa integridade física e mental.
A maior fraqueza que um ser humano pode manifestar é de não admitir as suas fraquezas, medos e limitações. Eu tenho medo de ratos, e nem por isso me sinto menos homem. Quando conhecemos os nossos medos e os admitimos, ficamos menos expostos aos riscos desnecessários, aqueles riscos que corremos por conta da necessidade de afirmação da nossa masculinidade.
O medo é um mecanismo importante de preservação da espécie, não admitir o medo é o mesmo que abrir mão da sensatez e da prudência.
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