- Governo sentencia que “não há condições para a realização de eleições distritais”
“Não há condições para a realização de eleições distritais em 2024”. Esta foi a “sentença” saída da boca da ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Mateus Kida, que, estranhamente e em claro conflito de interesses, assumiu a posição de porta-voz da Comissão de Reflexão das Eleições Distritais em 2024 (CRED), durante a apresentação dos resultados e consensos alcançados no fim dos primeiros 15 dos 45 dias estabelecidos para o efeito, dispensando, desta feita, Aguiar Mazula que estava presente. Quando confrontada pela imprensa sobre a representatividade da amostra que foi ouvida durante as auscultações e quanto foi gasto, Helena Kida não soube responder com clareza e muito menos soube dizer quanto até o momento foi gasto durante as actividades da referida comissão, limitando a dizer que “esta conferência é minha, eu é que vos chamei. Há perguntas que são para a comissão, ela vai vos chamar”.
Renato Cau
A legitimação da tese de inviabilidade das eleições distritais a partir de 2024 veio a se confirmar na última sexta-feira, 28 de Abril, numa conferência de imprensa convocada pela ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida, que dispensou o porta-voz da CRED para concluir que a comissão de reflexão “recomenda que não se realizem as primeiras eleições distritais em 2024”.
“O CRED recomenda que se aprofunde o diálogo ao mais alto nível com as forças políticas da oposição no sentido de buscar consensos sobre a inexistência de condições para o alastramento do modelo de governação descentralizada em implementação desde 2019 para os distritos”, frisou Kida.
O que não deixa de ser estranho é a rapidez do Governo em apresentar os resultados da Comissão no fim dos primeiros 15 dias, quando ainda faltam 45 dias para trabalhar e trazer a público um resultado que reflecte a vontade da população moçambicana em ver realizadas ou não as eleições distritais de 2024.
A ministra da justiça garantiu na apresentação do relatório que os 14 membros da comissão ouviram em apenas cinco dias todas as sensibilidades dos diversos seguimentos da sociedade moçambicana em todas as 11 províncias do país e assegurou ter havido uma amostra significativa, porém não esclareceu quantas pessoas foram auscultadas, limitando-se a apontar que foram ouvidos algumas classes profissionais, académicos, entre outros.
Porém algumas perguntas ficam por responder. Entre elas, como foi possível que os 14 membros do CRED conseguissem em tão pouco tempo colher dados de uma amostra representativa sendo que actualmente a população moçambicana está na casa dos 33 milhões? Quais foram os meios usados? Como foi feita a triagem dos dados? Será que as pessoas ouvidas representam os anseios da população moçambicana?
Mas como a apresentação suscitava muitas dúvidas, os jornalistas insistiam em querer saber dos membros da CRED ali presentes quantas pessoas foram realmente ouvidas e Helena Kida, visivelmente encomodada, respondeu com um riso sarcástico que “esta conferência é minha. Hoje eu é que pedi que viessem, o protagonismo é meu, agora querem dar à comissão?”, retorquiu, empurrando com essas palavras o balde água quente a CRED que se fazia representar na sala por quase todos seus membros.
Dos gastos com dinheiro público, Kida também não fala
Sobre quanto foi gasto até aqui do erário público para os trabalhos da comissão, Kida disse ser ainda prematuro avançar informações a respeito e referiu que só poderá se fazer o cálculo do montante gasto assim os 45 dias do mandato da comissão findarem.
“Eu podia dizer o que foi gasto até hoje, mas nós ainda vamos almoçar, amanhã ainda vamos trabalhar e eventualmente ainda tenham que viajar. Eu penso que são 45 dias de mandato desta comissão e aí sim nós faremos questão de apresentar oque é nos custou esta comissão”, sentenciou.
A ministra avançou ainda que “para a comissão trabalhar, é verdade, e como devem saber, viajaram, voltaram e tiveram que procurar pessoas, e isso exige meios financeiros; e é por isso que o ministério da Economia e Finanças foi chamado a coordenar também esta comissão porque nalgum lugar tínhamos que ir buscar orçamento para permitir que a comissão funcionasse”.
E como o baile ainda não havia acabado, a ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e religiosos foi questionada do porquê de ter sido ela a apresentar o trabalho daquela comissão, coisa que era no mínimo estranha, ainda mais pelo facto de nalgum momento ter negado que faz parte efectivamente do grupo que está a reflectir em torno das eleições distritais. Daí que um jornalista questionou a razão dela apresentar o trabalho da comissão, e Helena Kida, num tom arrogante, disparou para tudo e todos declarando que: “a comissão veio apresentar o trabalho que fez ao governo…eu sou o governo”.
E ainda acrescentou, “eu disse desde o início, o governo recebeu o documento e membro do Governo sentimos que temos a obrigação de dizer que a CRED entregou-nos o documento e eu estou a dizer o que é que a CRED nos entregou, e o que consta do documento que a CRED nos entregou”, assim falou Kida, em indisfarçável conflito de interesses.
Importa referenciar que o CRED tinha como missão estudar a pertinência ou não da realização das eleições distritais previstas para o ano 2024, conjuntamente com as eleições presidenciais, legislativas e provinciais, colocadas no comando constitucional. É composto por membros do executivo governamental e outros que publicamente já se opuseram à realização destas eleições.
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