“Segredos de Estado” de Filipe Nyusi podem ser expostos no julgamento das dívidas ocultas em Londres

DESTAQUE POLÍTICA
  • Encostada à parede, PGR promete partilhar documentos com tribunal de Londres
  • Interesse individual do PR pode prejudicar 31 milhões de habitantes
  • Tribunal de Londres ameaça cancelar julgamento por falta de colaboração
  • Já referi que o Presidente faz parte neste litígio…”

O Juiz do Tribunal Superior de Londres, Robin Knowles, ameaçou, em Março do ano em curso, cancelar o julgamento das dívidas ocultas, marcado para Outubro do ano em curso. Em causa está a recusa do Estado moçambicano em partilhar os documentos considerados essenciais no processo, supostamentre para proteger interesses pessoais do Presidente da República, Filipe Nyusi, uma das partes consideradas relevantes para o esclarecimento do caso. Um provável cancelamento da acção movida pela Procuradoria Geral da República (PGR), acusada de não fornecer os referidos documentos prejudicaria os interesses do povo moçambicano. Encostada contra a parede, em resposta à ameaça do Tribunal Superior de Londres, a Procuradora – Geral da República, Beatriz Buchili, prometeu partilhar os documentos solicitados para evitar a anulação do julgamento no qual Moçambique pretende ver anuladas as dívidas ocultas.

 

A pretensão de Moçambique anular as garantias do Estado a favor das extintas empresas caloteiras EMATUM, MAM e Proíndicus tornou-se num barril de pólvora prestes a explodir, uma vez que o juiz do caso que corre em Londres, Reino Unido, Robin Knowles ameaça cancelar o processo movido pela nossa PGR.

É que, desde o ano passado, a PGR, promotora da acção, se recusa a entregar alguns documentos considerados classificados e em segredo de Estado que estão na posse de cinco instituições, nomeadamente, Gabinete do Presidente da República, o Gabinete do Primeiro-Ministro, Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE), Conselho de Estado e o Ministério do Interior.

O Juiz do Tribunal Superior de Londres refere que, para além dos documentos das instituições supracitadas, o Estado moçambicano não mostrou abertura para partilhar documentos que estão na posse do Ministério do Interior, do Ministério da Defesa e da Marinha de Guerra de Moçambique assim como o e-mail de Manuel Chag que, segundo a Procuradoria – Geral da República, está vazio.

“Já referi que o Presidente faz parte neste litígio”

Robin Knowles reitera, por outro lado, que Nyusi é um dos implicados no escândalo das dívidas ocultas, apontado que a posição do mesmo poderá colocar em risco a posição da República.

“Já referi que o Presidente faz parte neste litígio. Ele é também a pessoa que tem, ao que parece, a autoridade máxima para aceder aos documentos mais importantes do Estado, nas entidades mais importantes do Estado. Pode ser que seja a sua posição individual que ponha em risco a posição da República. A responsabilidade é, no entanto, da República, mesmo quando o seu Presidente se recusa a ajudar por razões que podem ser de interesse próprio. A questão não está necessariamente encerrada. Existe sempre a possibilidade de a República, no interesse do seu povo, explicar o problema ao Tribunal de Justiça, embora eu compreenda perfeitamente o quão difícil isso pode ser”, referiu Knowles na sua decisão para posteriormente apelar a PGR para defender os interesses do povo moçambicano.

“Não posso dizer, neste momento, se o Presidente está decidido a ajudar neste processo, no interesse da República e do seu povo, ou se o está a dificultar por interesse próprio. O que se pode dizer é que, até à data, ele não fez o que estava ao seu alcance para responder em relação ao seu envolvimento pessoal como parte e em relação às alegações feitas contra ele pessoalmente. Também não ajudou, aparentemente, na sua posição à frente de entidades estatais relevantes, no que respeita ao acesso à documentação para efeitos dos deveres de divulgação da República”, disse.

Ainda na sua decisão, o Juiz do Tribunal Superior de Londres, para além trazer à baila que a PGR, em nome do povo moçambicano, tem a sempre a liberdade de esclarecer a dificuldade de Filipe Nyusi para colaborar com a justiça, lançou o sério aviso ao vice – Procurador – Geral da República, Alberto Paulo, no que respeita a recusa da partilha dos documentos.

“Aproveito a oportunidade para lhe dizer, Senhor Vice-Procurador Geral da República, na qualidade de representante da República, que a declaração que tive de fazer como primeiro dos nove pontos é um assunto verdadeiramente sério. Nos nove pontos, apresentei os passos básicos e essenciais que agora são necessários. Avaliarei não só o facto, mas também a qualidade do cumprimento, o que se estenderá, em alguns casos, ao que mais deve ser feito à luz do resultado do passo em questão”, declarou.

Indo mais longe, perante a recusa da Procuradoria – Geral da República em partilhar documentos considerados essenciais no processo, Robin Knowles ameaça anular o julgamento.

“Daqui decorre que a possibilidade de a anulação ser a última solução para o incumprimento. Quando a equidade do julgamento está ameaçada é muito real num caso desta natureza”, ameaçou.

PGR promete partilhar documento para evitar cancelamento do julgamento

Respondendo ao aviso deixado pelo Juiz do Tribunal Superior de Londres, a Procuradora – Geral da República, Beatriz Buchile, prometeu partilhar os documentos solicitados por Robin Knowles para evitar a anulação do julgamento das dívidas ocultas no Reino Unido.

“Eu não sei se está em risco, porque nós neste momento estamos numa tramitação do processo numa fase interlocutória de divulgação de documentos e nós estamos a trabalhar nesse sentido”, afirmou Beatriz Buchile, na Cidade da Praia, Cabo Verde, à margem da visita oficial a convite do seu homólogo, Jose Luís Landim, daquele país da África Ocidental.

Ainda em Cabo Verde, a Procuradora – Geral da República reiterou que a decisão sobre o destino da extradição de Manuel Chang deve acontecer com maior celeridade para o interesse do país que gastou avultadas somas de dinheiro para trazer o mesmo a Moçambique.

“Claro que esperamos receber o nosso cidadão, temos interesses processuais e é por isso mesmo também que nós estamos a pedir a extradição do cidadão Manuel Chang para o nosso país, para o interesse dos processos moçambicanos. E para isso estamos na expetativa que se decida na maior celeridade, para o bem do processo e mesmo para proteção dos direitos do próprio cidadão”, declarou.

Importa referir que até Janeiro de 2020, o Governo, através da Direcção Nacional de Contabilidade Pública, por solicitação da PGR, já havia pago pelo menos 23 milhões de rands, correspondentes a mais de 100 milhões de meticais, para tentar “salvar” Manuel Chang, tido como mastermind das dívidas ocultas pela justiça norte americana.

No que respeita ao Julgamento no Tribunal Superior de Londres, Moçambique já gastou cerca de seis milhes de dólares para preparação de documentos para o processo judicial.

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