Os médicos por cá estão em greve e em Portugal a saúde vai de mal a pior…

OPINIÃO

Afonso Almeida Brandão

O segundo semestre de 2023 podia ter trazido algumas novidades à Saúde em Portugal e o primeiro semestre podia ter corrido de melhor maneira a Moçambique se não fosse a falta de diálogo entre os Médicos e o Governo. Vamos começar por Portugal:

– Manuel Pizarro substituiu Marta Temido, uma das piores ministras da Saúde de todos os tempos, a quem fica colada para sempre a atitude de arrogância e de falta de respeito pelos profissionais de saúde em geral e pelos médicos em particular, e que é a responsável política pela falta de assistência e pelo aumento de mortes em doentes “não-Covid” durante o período pandémico.

– Na sequência do novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de Agosto, o “Governo Socialista da Treta” apressou-se a promover a criação de uma Direcção Executiva do SNS (DE-SNS).

– Fernando Araújo, respeitado como médico, professor e presidente da ARS Norte, aceitou a direcção da DE-SNS.

No entanto, à justificada esperança de que tudo começasse a melhorar, sucede a cada dia o desespero pela falta de resultados:

– O número de portugueses sem médico de família continua a aumentar, ultrapassando os 1.600.000;

– O acesso à saúde continua a fazer-se em grande parte pelo recurso aos serviços de urgência;

– Os serviços de urgência têm cada vez menos especialistas disponíveis, não sendo possível compor equipas que garantam segurança e qualidade de atendimento;

– Por causa disso, fecham-se serviços de urgência e fazem-se escalas de funcionamento das urgências que se disponibilizam na “internet” e que têm de ser consultadas previamente a qualquer deslocação à urgência, numa atitude que não é natural no doente que está mesmo doente;

– Promove-se o telefonema prévio para linhas telefónicas dedicadas, ignorando a incapacidade para uma boa triagem feita numa chamada telefónica, o que leva a um aumento do número de doentes não urgentes que recorrem aos serviços de urgência;

– As listas de espera para consultas hospitalares e para cirurgia não dão mostras de parar de aumentar;

– O número de doentes internados por falta de cuidados continuados é cada vez maior; estas camas, indevidamente ocupadas, não podem ser usadas para recuperação da actividade assistencial;

– Não há investimento em cuidados paliativos;

– O número de profissionais de saúde, principalmente médicos e enfermeiros, que saem do SNS é cada vez maior.

Se as pessoas escolhidas para liderarem o Ministério da Saúde e para a DE-SNS parecem competentes e têm história profissional conceituada, porque não aparecem os resultados do seu trabalho? Porque temos uma Direcção Executiva do SNS e um ministro da Saúde que teimam em apenas ver o SNS, esquecendo os sectores privado e social?

Por que se acaba com as parcerias público-privadas que prestam melhores cuidados e poupam milhões ao Estado?

Por que se insiste nos modelos de USF-B, se não há ainda evidência da sua eficácia?

Por que é tão lento o processo de criação de Centros de Responsabilidade Integrada?

Por que não se recorre à contratualização clara, equilibrada e efectiva dos sectores privado e social?

– A rede de hospitais privados em Portugal dispõe de um número crescente de médicos de múltiplas especialidades, nomeadamente médicos especialistas em Medicina Geral e Familiar.

– As urgências dos vários hospitais e clínicas funcionam em regra com tempos de espera muito menores do que as suas congéneres dos hospitais públicos.

– Consegue-se marcar consulta de qualquer especialidade poucos dias depois.

– Os blocos operatórios são rentabilizados e não há listas de espera para cirurgia.

– Existem programas de “internamento em casa”, nos quais equipas de saúde se deslocam ao domicílio dos doentes, que podem assim ter alta mais cedo.

– Há uma boa articulação entre os cuidados hospitalares e as residências para idosos.

Por que se regulamenta a comunicação para o exterior e se proíbem depoimentos, declarações, comunicados, ou mesmo respostas à comunicação social, num exercício de controlo de informação incrivelmente típico de regimes totalitários?

Por que se promovem exonerações de direcções de serviço incómodas para o poder central?

Por que se prolongam negociações com os sindicatos sem nenhuma abertura para recuperar os 28% perdidos no poder de compra dos médicos do SNS na última década?

As múltiplas respostas a estas questões podem sumarizar-se facilmente: preconceitos ideológicos.

São os preconceitos ideológicos que mantêm a Política da Saúde deste Governo de trazer por casa e convencido, contra as evidências, contra a eficiência, contra o interesse comum, contra a promoção da saúde.

Em relação a Moçambique, a situação é bem mais grave e vai de mal a pior, com o (des)governo da FRELIMO a desafiar os médicos que cumprem Greve a Nível Nacional há quase 30 dias, com a agravante de sofrerem ameaças inaceitáveis por parte de quem nos desgoverna e que promete mandar os Médicos Moçambicanos para o desemprego se continuarem a persistir com “a gracinha” (imaginem!) da Greve. E promete, inclusive, substituir os cerca de 2.000 de todo o País por 60 profissionais de Saúde Médicos que irão “requisitar” sabe-se lá onde…

O ministro da Saúde anda a dormir, os restantes membros do Governo “idem-aspas” e o principal “Homem do Leme” pelos destinos do nosso País “está nem aí”, pois claro… Em vez de se sentar à mesa com a Associação Médica e outros responsáveis pela classe, para conversar, com o objectivo de chegarem a um consenso, não, ameaça, antes, correr com todos eles para o desemprego e mandá-los para o “descanso temporário”, como se isso fosse assim. Francamente!

A irresponsabilidade, a arrogância e a estupidez é tanta, que apetece bradar aos céus por estarmos todos entregues a uma “bicharada” inqualificável de incompetentes que de dia-para-dia tem levado Moçambique para a Idade da Pedra

E não vamos referir os imensos problemas técnicos e financeiros de que padecem os nossos actuais hospitais, que são diariamente postos em causa por falta de tudo ou quase tudo, sem falarmos da “concorrência desleal” das Clínicas Privadas que existem no País, espalhadas de Norte a Sul, a que o cidadão comum não tem acesso por falta de dinheiro e que acabam por servir “a clientela” endinheirada… e o Povo que se lixe…

Filipe Nyusi — que devia saber evitar toda esta situação que já não é de hoje, diga-se em abono da verdade, isola-se cada vez mais no seu silêncio e nada faz para reverter a situação. Para que se saiba, o Hospital Central de Maputo, outrora, Hospital Miguel Bombarda — de que muitos se recordam certamente — com um historial riquíssimo de serviço e cuidados médicos à população, à época, não tem hoje mais do que 320 médicos activos nos seus Quadros Clínicos e espalhados por diversas especialidades, comparados com os 457 que chegou a ter em funções no tempo da outra senhora, que é como quem diz, na “Era Colonial”.

Não se trata de saudosismo da nossa parte, bem pelo contrário, mas de factos reais que importa comparar e mencionar publicamente, a vários níveis, do Rovuma ao Maputo. Está faltando diálogo e inteligência por parte dos nossos (des)governantes, é um facto. E pelo ”andar da carruagem” não auguramos dias melhores para o Futuro da Saúde em Moçambique. E tudo isto por mal dos “pecados” de alguns Senhores que deviam olhar por nós e estão, pura e simplesmente, “marimbando” para o Cidadão Comum, que representa a totalidade da População Moçambicana sem posses (e não só!). Até quando não sabemos…

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