- General angolano Bento Kangamba em discurso directo.
- “Nós em África pensamos que quem faz greve é da oposição”
- “Não tenho amizade de JL e também não quero que me veja como um amigo”
- Kangamba diz que salvou Angola da greve, ao pagar, do seu bolso, na totalidade, salário aos profissionais da Educação e da Saúde
O empresário e político angolano, Bento dos Santos Kangamba, concedeu uma longa entrevista à imprensa moçambicana (TV Sucesso e Evidências), onde abre-se para falar do seu percurso polémico na política e nos negócios. Kangamba, que é também general de três estrelas, encara as similaridades entre Moçambique e Angola, e aborda com profundidade as turbulências sociais caracterizadas pelas greves e manifestações nos dois países irmãos, frisando que “Quando a população está em boas condições sociais, ninguém precisa tocar no ministro, nem falar mal do Presidente. Na entrevista conduzida pelo jornalista Luís Nhachote, num especial para o Evidencias, Kangamba reitera sua lealdade ao falecido presidente angolano, José Eduardo dos Santos, e assume o posicionamento diferente na relação com João Lourenço, sentenciando que “aqueles que governam têm que ser calmos para interpretar bem porquê é que há greve. Nós em África pensamos que quem faz greve é da oposição”. Nos excertos mais importantes que se seguem, no modelo clássico de pergunta e resposta, o entrevistado aborda também a origem da sua riqueza, os processos no Brasil, Portugal e França.
Luís Nhachote*
Obrigado por aceitar falar para a comunicação social de Moçambique. Bento Kangamba é conhecido como o “Empresário da Juventude”, mas é na política, no desporto e na solidariedade que ganhou notoriedade. Quem é Bento Kangamba: nascimento, percurso militar, empresarial e político?
– Bento Kangamba (BK) é um cidadão normal, como outros, nascido no Moxico, Angola, há 06 de Julho de 1965, e é lá onde fiz os meus primeiros estudos. Depois daquela avalanche do início da independência, em 1974, fui repescado para as FAPLA (Forças Armadas Populares de Libertação de Angola), muito jovem. Depois da independência, estive em Cuba, na formação do quadro militar das Forças Armadas-FAPLA, isso foi em 1985, e depois participei na batalha de kangamba, que se deu em 86, já como logístico. Fui formado como Comandante da retaguarda. As pessoas não sabem, mas eu sou um dos quadros das Forças Armadas, formado mesmo em logística, em Santa Clara.
Depois que acabei a formação, coincidentemente, começou a haver muita turbulência da guerra civil em Angola. Aquela entre os sul-africanos, com a própria Namíbia, por causa do Apartheid, e nós já havíamos recolhido as forças do ANC para estarem connosco, estiveram o ANC, esteve a SWAPO, a Frelimo. Nessa altura, o regime do Apartheid sofisticava a sua guerra no sul de Angola, falo do Cunene, Lubango, Namibe e o Bié. E aí fui enquadrado numa povoação chamada Yona, onde há agora um parque nacional, que fazia fronteira de Angola com a Namíbia, a Leste e Oeste, quase tocava a RSA. Ficamos lá e depois fiquei logístico da 47ª Brigada da Reserva do Comandante-em-Chefe.
Nessa altura, a UNITA estava a organizar-se, talvez do exército português e da China Popular. O (Jonas Malheiro Sidónio) Savimbi começou a preparar a sua guerrilha no Leste de Angola, que é o Moxico, Cuando Cubango, as duas cidades onde começou a guerra. Para aquelas pessoas que não conhecem a história, por exemplo os jovens, pensam que a guerra começou no Huambo ou que começou no Bié. Nesse momento não havia guerra no Bié, porque a UNITA preparou-se bem, estava a preparar-se na mata no Leste de Angola e no Cuando Cubango.
Naquele tempo, não tínhamos o sistema de verificação de controlo das matas todas. Angola é grande, depois não conseguimos, digo nós exército das FAPLA, não tínhamos ainda aquela capacidade de controlar o movimento todo das matas de Angola, senão íamos dar conta da formação da UNITA e a criação da Jamba, nesse tempo todo.
Daí, saí da 47ª Brigada e automaticamente fui parar na 62ª Brigada, que tinha a missão de controlar a entrada da UNITA, através da Namíbia, e da RSA, pelo rio Longa, e nós estivemos lá. Fiquei muito tempo e depois fui participar numa batalha chamada Kangamba, de onde deriva o meu nome..
A guerra prejudicou o desenvolvimento humano de muitos de nós. Quando vamos a alguns debates algumas pessoas que não entendem o que aconteceu perguntam-nos: “então, você é inteligente, não se formou porquê? Não é jurista, não é economista porquê?”. Esquecem que a guerra provocou o atraso de algumas pessoas como eu. Mas no fim, Angola teve um bom entendimento entre irmãos, acabamos com a guerra, e hoje Angola é democrática, falamos da democracia e os dois partidos que se combateram, hoje todos somos irmãos, têm deputados na Assembleia Nacional, todo mundo discute e debate democraticamente na Assembleia Nacional, isso é que é mais importante.
Como avalia a situação política em Angola?
– Bom, todas nossas mudanças têm as suas consequências. No MPLA houve uma mudança de um Presidente que fez 38 anos no poder. Quando falamos de 38 anos não são cinco dias, não. São vidas de pessoas. O Presidente José Eduardo dos Santos liderou desde 1979, depois da morte do Dr. Agostinho Neto. É claro que todas as mudanças e a performance que fez o MPLA ser aquilo que ontem foi, agradece-se ao presidente José Eduardo dos Santos. Foi ele que estruturou o partido, que criou as condições, propôs e teve a confiança do seu Comité Central e do Bureau Político na mobilização que ele teve naquele tempo de fazer um partido de massas, o MPLA do povo. Essa expressão puxou e mobilizou a massa popular, o povo.
Enfim, é por isso que se diz que o povo é o MPLA, e tivemos esse sinónimo naquele tempo do partido único, e depois ele teve a capacidade de verificar o partido e dar uma abertura e foi possível um Comité Central de cento e tal pessoas, um bureau político de 20, 25 pessoas. Eduardo dos Santos permitiu o aumento desses órgãos no partido. O que aconteceu? As pessoas envelhecem, as pessoas adoecem, isso é normal, e perdemos um grande líder, chamado José Eduardo dos Santos.
A perda de José Eduardo dos Santos (JES) antes da morte, por ele sentir-se sem condições para dirigir o partido e o país, criou-se uma figura para o substituir, discutimos e achamos que para o substituir, José Eduardo dos Santos, seguir-se-ia o Presidente João Lourenço. É claro que dentro do partido, ou fora, haviam pessoas que também esperavam que fossem indicadas ou escolhidas, mas não foram escolhidas. O que nós devemos fazer é ser fiel a ele que foi escolhido, para que dirija bem o partido e consigamos fazer e cumprir os programas do partido. Falo isso porque em Angola, para ser Presidente da República, tem que passar por um partido, ser presidente do partido ou cabeça-de-lista de um partido para ser candidato a presidente da República. Se os partidos não têm condições para acompanhar isso haverá problemas.
O que temos estado a ver é que o Presidente João Lourenço tem estado a conduzir bem as coisas, está a verificar, já começou a ver que era, tinha cometido alguns erros e está a corrigir agora…
“Foi José Eduardo dos Santos que iniciou o combate à corrupção”
Uma das primeiras medidas do Presidente João Lourenço (JLo) foi a caça aos Marimbondos. O que é isso de Marimbondos? Como viu isso?
– Quem é culpado nisso? As pessoas sempre pensam que quem é culpado é aquele que está a dirigir. Mas quem começou com isso, eu sou testemunha, foi o Presidente José Eduardo dos Santos, quando tomou a decisão de que não deveria haver mais corrupção no partido e que era necessário acabar com a corrupção, que tínhamos que acabar com aqueles ministros que monopolizavam os Ministérios, tinham empresas que não serviam os interesse do Estado e do povo, mas serviam os interesses dos primos ou das primas. Mas naquela altura as pessoas não puseram aquilo em andamento e o Presidente João Lourenço entra e ele põe aquilo como a sua bíblia, a sua ideologia de governação.
Marimbondo é claro que são aquelas pessoas que exerceram algumas funções governativas, algumas das quais estiveram envolvidas em processos de corrupção. O nome marimbondo veio e pegou, e a moda generalizou, qualquer pessoa que naquele tempo estivesse ligada ou pertencesse ao governo do Presidente José Eduardo dos Santos era visto como marimbondo. Um cenário mau ao próprio partido, para as pessoas e ao próprio governo.
E como vê a corrupção em Angola e o mesmo cenário em Moçambique?
– A corrupção em África é falada por todos, mas o mal é falarmos da corrupção e não conseguimos encontrar o corrupto. É preciso encontrarmos quem é corrupto. Quem corrompe quem? Eu sinto assim, por exemplo em Angola o debate no MPLA é igual ao da Frelimo. É claro que todo mundo diz que a Frelimo tem dirigentes corruptos, a Renamo diz que a Frelimo tem dirigentes corruptos. A UNITA diz que o MPLA tem dirigentes corruptos. São estratégias da oposição para poder governar.
É claro que o MPLA e os nossos governantes devem criar condições sociais para a nossa população, isso é que os africanos ainda esquecem. O povo e o cidadão normal precisam de coisas básicas: precisa de um peixe, uma fuba (xima) de milho, arroz. Não se pense que é apenas em Angola, em Moçambique é bem igual.
São coisas básicas que a população precisa, e nós políticos precisamos de ter isso bem presente. Os presidentes devem formar os dirigentes com esse tipo de mentalidade, esse tipo de abordagem, que consigam conduzir programas básicos para as populações. Se a população se sentir e estiver bem e com melhores condições, é claro que tu vais estar muito tempo no poder e ninguém te vai incomodar.
Quando a população está em boas condições sociais, ninguém precisa tocar no ministro, nem falar mal do Presidente, ninguém precisa falar mal de ninguém porque está bem. Os países árabes ilustram esse exemplo, e existem mais sítios. Não fazem eleições porque acham que não há necessidade, não há necessidade de fazer eleições como sabe que as populações têm condições, as populações têm aquilo que merecem. Por isso, apelo que sigamos esse caminho para Angola, enfim, e noutros países da África melhorem e não tenhamos turbulências na governação.
“O mais importante não são os que agitam o Presidente, mas o que ele pensa”
O MPLA continua unido? Vimos filhos do antigo Presidente a sair do país por perseguições porque tinham negócios com Estado, ganhavam concursos, estavam ligados à Sonangol, à Unitel, falo da Isabel dos Santos, da Tchizé dos Santos. Como viu essa situação dos filhos de José Eduardo dos Santos terem que deixar o país?
– Aí não posso responder essa pergunta. Os filhos do antigo Presidente do MPLA são sinónimo de sangue do partido MPLA. O Presidente João Lourenço é sangue e sinónimo do MPLA. O que deve haver é que nem os filhos, nem os militantes, tenham medo e abandonem o seu país porque as pessoas vão lhes fazer mal.
Internamente, devemos ter a coragem de debater essa situação no partido e dentro de Angola para que se melhorem as condições e que todos, unidos, possamos ajudar o Presidente João Lourenço a melhorar e sair desses problemas que temos a nível do país.
A Isabel dos Santos é uma grande empresária, tem valias, é preciso que as pessoas aconselhem o Presidente para que se debata o caso e a situação acabe, porque ela é angolana. Se é angolana tem que contribuir para o seu país. O mais importante aqui não são as pessoas que agitam o Presidente e criam esse problema. O mais importante é aquilo que o presidente tem e pensa, saber que a Isabel dos Santos é angolana e tem capacidade de apoiar, de dar a sua contribuição na sua própria pátria.
Eu, Bento Kangamba, não aconselho ninguém dos meus colegas e correligionários a viver fora do país. Tenho que estar aqui dentro do meu país, onde nasci, o meu sangue está aqui e o meu umbigo foi enterrado aqui.
Acredita que o Presidente está a ser agitado neste posicionamento que está a tomar quanto a essas figuras?
– O Presidente tem muitos conselheiros e há conselheiros que acham que para ele ser bom Presidente tem que prejudicar o Bento Kangamba ou prejudicar fulano e beltrano.
“Não concordo e nunca vou concordar com o momento que o país está a viver”
Está satisfeito com a política implementada pelo MPLA e com a governação de João Lourenço?
– Eu não posso dizer que não estou satisfeito, porque eu faço parte do partido MPLA, eu tenho que dizer que estou satisfeito. O que não concordo e nunca vou concordar é com o momento que o país está a viver. O momento desta política assumida de cortes aqui e cortes acolá, que está a prejudicar a população. O que nós temos que fazer, agora, é corrigir, unirmo-nos com a população, fazer com que ela tenha boas condições sociais para que o Presidente João Lourenço e o seu governo consigam governar bem. E que a outra etapa que acaba em 2027 será governar bem.
O general Bento Kangamba já ultrapassou os litígios que tinha e o impossibilitavam de ser deputado do MPLA?
– Bom, eu nunca tive litígio ou impedimento para ser deputado do MPLA. Vou falar ao senhor jornalista a verdade: eu sou um cidadão nacional e sinto-me superior ao deputado do partido. Porquê? Eu me lembro que o Presidente dos Santos falou comigo para ser deputado, ele me pediu. Recusei. Porque eu me sinto um deputado natural. Se vou às ruas, sou abraçado, sou acarinhado, crio avalancha de pessoas que me querem ver, abraçar, falar comigo.
Sinto que sou mais que o próprio deputado, que o próprio ministro. Prefiro, então, escolher o meu próprio caminho. Isso não é litígio algum. Um dos partidos da Oposição, o Casa CÊ acho, tinha proposto isso na Assembleia Nacional. Mas eu nunca aceitei ser deputado da Assembleia Nacional. Por duas vezes fui colocado na lista do Partido, como também fui convidado para ser ministro do Desporto, ministro da Acção Social e governador de uma das províncias.
As pessoas nem sabiam qual era a minha ligação com o presidente dos Santos, só pensavam que eu era Presidente do Kabuscorp (Sport Club do Palanca). Mas quando me foi dado todo o poder de toda parte, não me aproveitei desse poder para prejudicar os outros, para queixar ou para minar as ideias do Presidente.
Está a assumir que há quem esteja a minar as ideias do Presidente JLo?
– Algumas pessoas, um grupo de invejosos, fazem de tudo para manchar a minha reputação e a minha carreira. Sou uma pessoa normal. Não fumo, não bebo, sou divorciado há tanto tempo. Levo a minha vida como dirigente desportivo, não estou ligado a negociatas com ninguém em Angola, minha vida é limpa como água.
Qual é a sua relação com os generais Dino e Kopelipa?
– Bom, nessa pergunta vou vos dizer o seguinte: Eu não sou falso. Não sou falso e nunca fui uma pessoa que deu voltas. A relação do Kopelipa e Dino é de família. Nós vivemos muito tempo juntos e eu nunca posso dizer na rádio ou na televisão que não sou amigo do Kopelipa. Eu tenho o Kopelipa como irmão. Agora, se o Kopelipa tiver um problema, são problemas do Kopelipa, não são meus. É claro que também me afectam de alguma forma. Mas não posso dizer que não conheço o Dino, Não! É irmão, é família, estivemos muito tempo juntos.
Os filhos do Dino são meus filhos, os filhos do Kopelipa são meus filhos, os meus filhos são filhos deles. Isto é África. É normal, nós não podemos fugir de uma família porque ela tem um problema.
Fui ligado ao Kopelipa, fui ligado ao Dino, fui ligado a toda a gente. Continuo a vos dizer outra vez, vou repetir aqui: eu serei fiel ao José Eduardo até à minha morte. Isso sempre digo às pessoas. Não quero dizer que não sou fiel ao Presidente João Lourenço, é meu Presidente, é o meu líder, é o meu chefe, as pessoas não podem confundir as coisas. Não posso dizer agora que não conheço mais o Presidente José Eduardo.
“Muitos esperavam que eu fosse como Julius Malema… que fosse dividir o partido”
A relação que teve com José Eduardo dos Santos não afecta, de alguma forma, a relação que tem actualmente com João Lourenço?
– Não! Vocês não imaginam o que as pessoas esperavam que fizesse em Angola: uns esperavam que eu fosse Presidente de um partido; outros esperavam que eu fosse uma pessoa para estragar e gerar conflitos dentro do partido, dividir o partido; outros esperavam de mim um Kangamba como Julius Malema; outros esperavam um Kangamba como o Moisi Catumbi, outros esperavam um Kangamba doutra forma, mas não…. sou fiel aos meus. Se sou fiel aos meus, então tenho uma cultura que é minha. Nasci no bairro, andei descalço, não tinha chinelos naquele tempo, andei com calça rota, então tem que respeitar o meu chefe, eu respeito o Presidente João Lourenço como chefe.
Não tenho João Lourenço como amigo e eu também não quero que o Presidente João Lourenço me veja como amigo dele. Para mim, o Presidente João Lourenço tem que me ver como um militante do partido, como um trabalhador, como uma pessoa com quem ele pode contar para solucionar qualquer problema no partido. Estou aí, a minha relação é de chefe e subordinado.
Curiosamente, notamos uma certa ausência nalgumas cerimónias muito grandes no campo político. Isto tem a ver com a relação que tem com João Lourenço actualmente ou nem por isso?
– Não. Eu não apareço nas cerimónias, mesmo nas cerimónias do Presidente José Eduardo dos Santos. Geralmente, eu só aparecia nas festas de família. Eu não sou uma pessoa de aparecer assim nas cerimónias de casamento, daqui ou dali. Até faço cumprimentos de fim do Ano de vez em quando, mas há vezes em que quando acontece isso estou fora de Angola.
“Sou empresário no ramo dos diamantes há quase 35 anos”
O general Bento Kangamba é conhecido como um filantropo no desporto e na cultura. Qual é a proveniência da sua riqueza?
– (Gargalhadas) Eu pensei que vocês não iam perguntar isso. É normal as pessoas perguntarem a riqueza do Bento Kangamba. Eu já vi nas redes sociais, porque eu tenho, na família, sobrinhos jovens que acedem às redes sociais e ainda me perguntam: Ó, tio, ouvimos dizer que o tio fez feitiço, matou fulano, tem cobra que nasce dinheiro… Não! Eu sou empresário no ramo dos diamantes há quase 35 anos. Você é jornalista investigativo, pode pesquisar.
De 2010 até 2016, a minha empresa foi uma das melhores empresas na comercialização de diamantes em Angola e no estrangeiro. Claro, a minha riqueza não vejo como o dinheiro. A minha riqueza é o meu coração, eu tenho que vos dizer o seguinte: eu prefiro ter 2000 USD e entregar aos outros, porque eu não consigo ficar com os 2000 USD ou qualquer tipo de valor no bolso, quando vejo uma pessoa que está a sofrer.
Não quero, um dia, morrer e as pessoas dizerem “é pá! o fulano morreu rico”. Não me interessa morrer rico. Interessa ter dinheiro e apoiar quem precisa e quem merece. Vou te contar um episódio: em 2000, houve uma greve dos professores, médicos e enfermeiros, a primeira greve em Angola, e o Presidente JES olha para o ministro das finanças, e eles não tinham dinheiro para cobrir esse tipo de situação. O que havia? A própria Sonangol precisava do pôr, em impostos, dinheiro no orçamento do Estado para pagar aos professores e à saúde. E eu olhei para o Presidente JES e disse: “Presidente, eu tenho dinheiro, posso resolver esse problema”. O Presidente olhou para mim e perguntou “você tem esse dinheiro?”. E eu respondi “sim, tenho”. Ele replica “como você tem dinheiro?” O Presidente precisava, naquele momento, de nove milhões de dólares e eu tinha 50 milhões de dólares.
E eu mostrei ao Presidente, que, olha, eu tenho esse dinheiro aqui! E faço este negócio. “Ahhhh!! Está bem. Então pode apoiar!”, e eu respondi sim, e Sr. Jornalista, recordo-me que foi num dia como hoje, e eu apoiei. O Presidente mandou pôr o dinheiro na conta do Estado, eu pus o dinheiro na conta do Estado, as finanças fizeram o pagamento da saúde e educação sem o próprio povo se aperceber de onde vinha o dinheiro.
As pessoas só foram se perceber mais tarde, mas não apareci na televisão, porque eu tenho um sentimento que a saúde não pode ter problemas senão o país fica parado e as pessoas morrem. A educação não pode parar porque as pessoas retrocedem e se prejudicam. E quando estou a ajudar a educação, estou a ajudar o país. Não estou a dar o dinheiro porque está lá a filha da minha irmã, tenho que pagar para ela estudar. Eu continuo a fazer e me sinto bem.
“Nós, em África, pensamos que quem faz greve é da oposição”
Que experiência pode passar para Moçambique. Actualmente, há vários cenários de greve: os professores estão, infelizmente, numa greve silenciosa e os médicos já estão a prorrogar a sua manifestação. Que mensagem pode passar para o governo moçambicano neste “ping-pong” de greves e posicionamento do governo que é muito agressivo para os manifestantes?
– É diálogo! Nessas situações de greve é preciso haver diálogo. As pessoas, aqueles que governam, têm que ter calma para interpretar bem por que é que há greve. Nós, em África, pensamos que quem faz greve é da oposição.
Não, às vezes também é nosso mesmo por ele querer ter uma vida que merece. Nos anos 75, 74, 78 todo mundo no MPLA esperava um partido, um país melhor para toda a vida. Aqueles Antigos Combatentes, por exemplo, esperavam outro desenvolvimento no país. Mas quando um deputado, um antigo combatente, recebe 25.000 Kwanzas, significa que passará por muitas dificuldades na família, na saúde, na vida social. É por isso que nós temos estado a aconselhar sempre o partido para o debate, para a abertura, para que haja um bom pensamento de forma a que para os que combateram esses anos todos haja outra forma de pagamento. Só o salário não vai dar. Mas é preciso procurar projectos que lhes possibilite uma boa vida, boas condições de vida a esses antigos combatentes.
O General já foi referido numa alegada apreensão de dinheiro na França. Pode explicar o que aconteceu?
– É claro, nós temos funcionários. Eu nunca fui preso com dinheiro na França, acho que um funcionário meu ia pagar a uma imobiliária na França e andou com valores em mão. E depois lhe foram apreendidos dois milhões de Euros. Isso não é crime. Ele pagou imposto e certificou a origem de dinheiro.
Eu sou o Angolano com mais processos movidos no estrangeiro. Naquele tempo não eram processos do Kopelipa e do Manuel Vicente, não eram do Bento Kangamba. A visão toda era no Bento Kangamba naquele tempo. Porquê? Tive processo na França, tive processo em Portugal, tive o processo no Brasil, onde acusavam-me de importar mulheres bonitas para ficar com elas, dar festa não sei o quê… tudo mentira. Porquê? Porque naquele tempo as pessoas queriam manchar a imagem do Bento Kangamba.
Agora, acredite, no dia que tiver dinheiro, o dinheiro é seu e podes andar com o seu dinheiro. Se o dinheiro é meu posso estar aqui com 10.000 USD, 20.000 USD. Não posso esconder que não tenho dinheiro. Eu sempre andei com dinheiro. Mas nesses processos todos, graças a Deus, eu ganhei, fiquei limpo. Fiquei ileso, nunca tive problema nenhum fora do país, aliás, vocês vêem, estou a viajar agora para vir atender à vossa entrevista. Saí de Singapura, fui a Dubai, estive no leilão de diamantes, e claro, hoje estou aqui com você.
*Colaboração