- Justiça britânica aceita recurso contra imunidade do Presidente
- Presença de Nyusi no julgamento de Londres volta a estar em discussão
Era para ter iniciado, esta segunda-feira, o julgamento das dívidas ocultas em Londres, na Inglaterra, mas a audição inicial acabou sendo adiada para 16 de Outubro, em meio a um turbilhão de acontecimentos, com destaque para o acordo entre o Estado moçambicano e o grupo UBS, que comprou o Credit Suisse e para um inesperado desfecho em relação ao caso da imunidade do Presidente da República, Filipe Nyusi, que veio esfriar, por enquanto, a saída pela porta pequena que o Chefe do Estado havia, aparentemente, conseguido. É que, o Tribunal de Recurso de Inglaterra e País de Gales admitiu um recurso da PrivInvest em relação à imunidade concedida, abrindo uma nova incerteza sobre a eventual ida de Filipe Nyusi ao tribunal para responder sobre o seu propalado envolvimento no escândalo da EMATUM, MAM e Proindicus.
A reviravolta na chamada estratégia de saída pela porta pequena aconteceu na passada sexta-feira, quando a juíza Elizabeth Laing aceitou um recurso sobre a decisão do Tribunal Superior [High Court] de Londres de 04 de setembro, que dava ao chefe de Estado imunidade diplomática dos procedimentos judiciais em curso.
“Se o julgamento deve ou não ser adiado, portanto, depende do facto de qualquer parte solicitar e, obviamente, da opinião ponderada do juiz sobre se tal adiamento deve ser concedido. Esta questão cabe-lhe a ele”, referiu a juíza na decisão, abrindo espaço para o adiamento.
E foi o que aconteceu na tarde desta segunda-feira. Após uma sessão que serviu para discutir o impacto do acordo conseguido entre o Estado moçambicano e o Credit Suisse, bem como o recurso sobre a imunidade de Filipe Nyusi, o arranque do julgamento ficou adiado para, provavelmente, o dia 16 de Outubro, ou seja, daqui a duas semanas.
Na quinta-feira, haverá uma sessão para perceber qual é o impacto real do acordo e do recurso sobre a imunidade sobre o calendário do julgamento, tendo em conta que com a saída da Credit Suisse, por exemplo, parte das testemunhas deixam de ser relevantes para o processo cujo julgamento está previsto para durar 12 semanas.
A isso acresce-se a incerteza sobre a presença de Nyusi ou não no julgamento depois do levantamento da sua imunidade para dar lugar ao recurso da PrivInvest, que poderá levar a um adiamento mais prolongado, dependendo da decisão do juiz.
De qualquer forma, a decisão do tribunal de recurso coloca novamente Filipe Nyusi no centro do furacão e somente a decisão do recurso é que vai ditar se Filipe Nyusi vai ser arrastado para o tribunal, ou se sai pela porta pequena, ou seja, sem ter, no mínimo, a chance de se defender diante do tribunal.
Constituído como quarta parte no processo, numa lista que conta com outros gestores e personalidades moçambicanas, Filipe Nyusi está a fazer de tudo para evitar o embaraço de ser confrontado no Tribunal de Londres, com perguntas sobre um suposto recebimento de subornos em dinheiro e em espécie, tal como vem insinuando o grupo PrivInvest.
Com efeito, através do seu advogado em Londres, Filipe Nyusi alegou ter imunidade na qualidade de Chefe de Estado moçambicano e pediu que se anule as alegações de que aceitou subornos da PrivInvest, ou seja, quer mais uma vez escapar sem esclarecer aos moçambicanos e ao mundo se “comeu ou não comeu”.
Para reforçar o seu pedido, o advogado de Filipe Nyusi em Londres, Rodney Dixon, argumentou que “não há diferença legal” entre alguém tentando processar Nyusi em Londres e o rei Charles da Grã-Bretanha ser processado na Austrália.
O juiz Robin Knowles, acabou por acolher o pedido da defesa de Filipe Nyusi, decidindo que ele era inimputável dado gozar de imunidade como Presidente da República, mas para já tudo está em aberto com o recurso já aceite.
Comeu ou não comeu?
A PrivInvest alega que o Presidente moçambicano esteve diretamente envolvido no caso das dívidas que o país quer ver anuladas pela justiça britânica. Segundo o grupo libanês, Nyusi reuniu-se diretamente com representantes da PrivInvest, esteve diretamente envolvido (quando era ministro da Defesa) na preparação dos projectos em causa e solicitou à PrivInvest contribuições para a campanha eleitoral dele e da FRELIMO.
Embora o seu nome tenha sido referenciado por réus e declarantes desde o primeiro ao último dia, o juiz do caso, Efigénio Baptista, que vezes sem conta chegou a mostrar algum nervosismo sempre que o nome do PR era citado, recusou-se a notificar Filipe Nyusi, alegando imunidade e falta de fórum.
Foi assim, no dia 18 de Janeiro, quando Efigénio Baptista indeferiu um requerimento da Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) para ouvir o Presidente da República, Filipe Nyusi, como declarante no caso das “dívidas ocultas”.
A OAM pediu a audição porque Filipe Nyusi era ministro da Defesa à data dos factos constantes no processo.
“Dos membros do comando conjunto, o antigo ministro da Defesa é o único declarante ouvido em sede de instrução”, cujas declarações “não estão previstas para serem confirmadas nesta audiência”, justificou Vicente Manjate, representante da OAM, na ocasião.
Porém, o juiz afirmou que “a diligência requerida não contribui para a descoberta da verdade” e retardaria “o andamento do processo”, escancarando assim, pela primeira vez, a porta pequena para Filipe Nyusi, que agora tenta o mesmo recurso para não se pronunciar sobre factos a si imputados.
Entretanto, observadores em Maputo dizem que ao não se abrir para um provável esclarecimento do caso das dívidas ocultas em sede do tribunal, abre espaço para que dúvidas persistam sobre o seu envolvimento ou não no calote e alimenta especulações de que terá realmente recebido subornos da PrivInvest.
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