Presidente do Conselho Constitucional vai proclamar resultados das VI Eleições amanhã

Batata quente avoluma-se nas mãos da comadre do Presidente da Frelimo

DESTAQUE POLÍTICA
  • CC pode exceder os 15 dias da proclamação dos resultados eleitorais devido a quantidade das queixas
  • Órgãos eleitorais e tribunais mostraram parcialidade e tendência de apoio à Frelimo
  • Lúcia Ribeiro terá um teste de fogo entre proteger o Compadre e a verdade eleitoral
  • É Comadre de Filipe Nyusi que neste momento luta pelo seu futuro político na Frelimo

Em meio a muito barulho, manifestação e insatisfação generalizada dos partidos da oposição e da sociedade, a última palavra está agora com o Conselho Constitucional (CC), dirigido por Lúcia Ribeiro, que mantém relações emaranhadas com o presidente do partido Frelimo, Filipe Nyusi, e sua família. É que Lúcia Ribeiro é “Comadre” de Filipe Nyusi, que neste momento luta pelo seu futuro político na Frelimo, pelo que se antevê que terá um teste de fogo entre proteger o Compadre e a verdade eleitoral quando o Conselho for chamado a votar. Num momento em que a Frelimo já celebra a vitória em 64 autarquias, é do interesse deste partido que a última palavra do Conselho Constitucional não retire uma única vírgula ou ponto nos dados chancelados pela Comissão Nacional de Eleições. Até o dia 26, quando a Comissão Nacional das Eleições divulgou os resultados, o CC tinha publicado mais de seis acórdãos em resposta aos recursos submetidos e pelo menos quatro das respostas chumbavam os recursos da oposição.

Dúvidas não restam no sentido de que o partido Frelimo, por razões compreensíveis, é o maior interessado na manutenção do quadro de resultado já anunciado pela Comissão Nacional de Eleições.

Nisto, à semelhança do que os partidos da oposição têm dito em relação à polícia que em alguns caso chegou a deter denunciantes de fraudes e crimes eleitorais, ou o STAE, que, por exemplo, em Chókwè, deixou de credenciar delegados de um partido concorrente, a incerteza sobre a imparcialidade do Conselho Constitucional na apreciação dos processo que tem agora em mão tem sido um grande calcanhar de Aquiles e até de alguma forma motivo de falta de calma por alguns sectores interessados no processo das eleições autárquicas.

Refira-se que o Conselho Constitucional nas autárquicas de 2018 ficou bastante conotado com acusações de viabilizar a vitória da Frelimo através de recusa em analisar os recursos interpostos pela oposição.

Nas autárquicas de 2018, os apoiantes de Samora Machel Júnior e de Venâncio Mondlane recorreram ao Conselho Constitucional para protestar contra o afastamento das suas candidaturas pela Comissão Nacional de Eleições (CNE). O Conselho Constitucional validou o afastamento de Samora Machel Júnior e de Venâncio Mondlane, dois concorrentes de peso, que constituíam uma ameaça à candidatura da Frelimo na cidade de Maputo.

Num outro momento, o Conselho Constitucional voltou a agir a favor do partido Frelimo, chumbado todos os recursos da Renamo através dos quais o maior partido da oposição reclamava vitória nos municípios da Matola, Marromeu, Moatize, Alto Molócuè e Monapo.

Lúcia Ribeiro terá um teste de fogo entre proteger o Compadre e a verdade eleitoral

Basta recordar que Filipe Nyusi tomou posse no dia 15 de Janeiro das mãos da Presidente do Conselho Constitucional, a mesma até agora, Lúcia Ribeiro, e no primeiro dia de trabalho foram juntos a lazer num jogo de golfe, com uma a servir de cheersleader.

Poderia até ser uma coincidência, mas não é. As relações pessoais entre o Presidente do partido Frelimo e da Presidente do Conselho Constitucional são mais complexas que um jogo ocasional de golfe.

Mais do que relações entre Filipe Nyusi e Lúcia Ribeiro, trata-se de relações familiares complexas e entrelaçadas. Ora, a filha de Filipe Nyusi (Cláudia Nyusi) e o filho da Lúcia Ribeiro (Hipólito Michel Ribeiro Amad Ussene) são sócios na Dambo Investe Limitada, empresa que controla o negócio milionário de fornecimento de carteiras escolares, através da sua subsidiária Luxoflex.

De acordo com o Canal de Moçambique, Cláudia Nyusi e Michel Ribeiro são ainda sócios nas empresas Likaputela, Limitada; Odja Alimentos, Limitada; Sheba Gondola, Limitada; e Nykali Oil, Limitada. Mas são relações que transcendem negócios, vão até ao compadrio. O CC não seria o primeiro órgão de natureza colegial a ceder às tentações de dar um empurrão a Frelimo, a Comissão Nacional de Eleições também o fez, tendo havido até o insólito de dois delegados da Renamo ficarem ausentes no dia da votação por motivos de “saúde”, depois de participar na discussão do apuramento geral.

Mais recursos para um período tão curto

Neste momento, nos termos da Lei 7/2018 de 3 de Agosto, concretamente o artigo 130, o Conselho constitucional deverá deliberar sobre todas a reclamações e recursos e só posteriormente poderá avançar para apreciação da acta e do edital do apuramento geral dos resultados da eleição autárquica, para efeitos de validação e proclamação.

Sabe-se que o Conselho Constitucional chegou a ter em mãos mais de 20 reclamações, uma vez que, por exemplo, só no município de Maputo houve reclamações que corresponderam processos próprios nos Tribunais Judiciais dos Distritos Municipais de KaMavota, Nlhamankulu, Kampfumo e KaMubukwana. Neste momento, o Conselho Constitucional ainda não conseguiu dar vasão nem a metade, o que de per si prenuncia alguma demora na apreciação da acta e do edital do apuramento geral dos resultados da eleição autárquica, para efeitos de validação e proclamação, que devem ser feitos num máximo de 15 dias depois da divulgação dos resultados pela CNE.

No dia 23 de Outubro, foi proferido o acórdão relativo ao recurso submetido ao CC, pelo Tribunal Judicial do Distrito de Chókwè e no dia 24 de Outubro foram proferidos os seguintes acórdãos: acórdão n.° 16/CC/2023 da decisão proferida pelo tribunal da cidade de Xai-Xai, acórdão n.° 17/CC/2023, do tribunal de distrito de Mandlakazi, acórdão n.° 19/ CC/2023 do tribunal de distrito da Manhiça e acórdão n.° 20/CC/2023 do tribunal judicial de KaNlhamankulu, todos datados de 24 de Outubro.

Em suma, o CC decidiu declarar nulo e de nenhum efeito o despacho proferido pelo tribunal judicial do distrito de Chókwè na parte que declara nulos todos os actos praticados pela Comissão Distrital de Eleições de Chókwè.

Esta decisão, de acordo com o Centro para Democracia e Direitos Humanos, “traça, em princípio, as linhas mestras a seguir em relação ao restante dos recursos que aquela instituição tem ainda por decidir, ou seja, os fundamentos trazidos pelo CC deixam evidente que os tribunais da cidade e do distrito, face a um emaranhado normativo, para além de outros elementos passíveis de serem assacados das sentenças proferidas por aqueles tribunais, pouco ou quase não detêm poder nenhum para decidir validamente sobre ilícitos eleitorais”.

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