Sem barulho, AR mostrou a pobreza de um parlamento sem oposição

EDITORIAL

A VIII Sessão Ordinária da Assembleia da República, na sua IX Legislatura, foi, semana passada, inaugurada pelo Governo, que esteve em resposta ao pedido de informações dos parlamentares.

Dois temas relevantes, o inusitado zelo da polícia e o polémico SUSTENTA, que mereciam um debate aprofundado, foram reduzidos a temas corriqueiros. Com ausência da Renamo e MDM, a presença do Governo na Assembleia da República foi meramente formal, sem análise crítica das informações colocadas, pelo contrário, até nas piores gafes, a única bancada presente, a Frelimo, esgrimia-se em hosanas. Ali estava a aplaudir a actuação violenta da polícia e os números polémicos da agricultura, que por mais coerentes que possam parecer não colhem consensos. Tudo bem que ali estávamos diante de uma ausência premeditada, mas foi a ilustração mais fiel de quão são ou seriam danosas à democracia as vitórias retumbantes para qualquer que seja o partido. Não, senhores, não se ganha nenhum com o monopartidarismo.

No parlamento estiveram dois ministros que mereciam especial atenção por serem as partes responsáveis pela instabilidade política que o país vive, seja de forma directa ou indirecta. São eles o ministro Pascoal Ronda e Celso Correia, que, embora este último tenha responsabilidades acumuladas pela fraude eleitoral que empurrou o país para crise pós-eleitoral, não pode, obviamente, ser chamado na qualidade do Director da Campanha da Frelimo, mas uma provocação da oposição podia ter relacionado a gestão dos fundos destes projectos com os fundos que viabilizaram a fraude.

Em curta marcha no Ministério de Interior, Pascoal Ronda mostrou que pode actuar num governo de cineastas e humoristas, provando que está no lugar certo. Quando todos os moçambicanos testemunharam o uso excessivo e desproporcional da força policial, cenários assistidos no cortejo fúnebre de Azagaia e nas VI Eleições Autárquicas, a ponto de ter havido registo de mortes pelas balas da polícia, Ronda mostrou-se a leste da postura da corporação e disse que “apenas garantiu a ordem e segurança pública, protegendo todas as organizações políticas”. Talvez se não fosse a ausência justificada pela necessidade de pressionar as autoridades eleitorais a repor a verdade eleitoral, Ivone Soares teria muito bem partilhado o seu episódio de intimidação policial ocorrido na Zambézia.

Do resto, a primeira semana da sessão da AR que ocorreu cinco dias depois dos tumultos vividos em pelo menos quatro cidades do país (Maputo, Quelimane, Nampula e Nacala-Porto), em protesto aos resultados das Eleições Autárquicas do dia 11 de Outubro, que dão vitória à Frelimo em 64 autarquias do país, mostrou que qualquer vitória retumbante é penosa ao próprio vencedor e, mais do que isso, aos moçambicanos, na medida em que restringe o debate, a crítica e a própria democracia num todo.

Não é por lapso que as informações de maior relevância foram solicitadas pela oposição, enquanto a Frelimo fala das tradicionais épocas chuvosas. Foi a Renamo que solicitou ouvir do Governo as razões que ditam o uso excessivo e desproporcional da força policial e as constantes inviabilizações das manifestações dos cidadãos e os contornos do SUSTENTA e do FNDS.

Facebook Comments