Milhões em contratos melindrosos atenuam alto custo da solidariedade ruandesa

EDITORIAL

As lições são tantas, mas nos negamos com elas aprender. Os danos de acordos feitos à porta fechada, quando os mesmos têm uma dimensão suprema, podem ser desastrosos, à semelhança do que foi com as dívidas ocultas que desestruturaram a economia ou com os acordos do Governo e Renamo, que precipitam de forma cíclica a crise pós-eleitoral, ou das multinacionais cujos contratos com o governo não foram analisados à lupa por toda uma sociedade e como consequência descobriram que, afinal, por causa dos interesses dos negociantes, têm pouca contribuição nos cofres do Estado.

E porque nos recusamos aprender, o erro se repete e não irá tardar as consequências. Hoje, estamos no terceiro ano depois da entrada em acção da intervenção da força militar ruandesa. Os termos da referência, o mandato, os limites e o prazo da intervenção são desconhecidos e a vontade ruandesa de ficar pode ser visto nos seus acordos milionários com a TotalEnergies ou na renovação e na expansão do perímetro de cobertura que, como ilustra o texto que faz capa nesta edição, está curiosamente nos distritos ricos e com recursos em exploração. É a saga ruandesa, camuflada na bondade, que não pode ser questionada porque trouxe a receita do sucesso no Teatro Operacional Norte, onde as nossas forças, que ainda não superaram questões de alimentação e de salário condigno, tombaram e fracassaram, não por incapacidade, mas culpa e falta de apoio de quem devia garantir a logística.

Com efeito, estamos perante uma relação bilateral que move armas e negócios em silêncio, enquanto as contrapartidas continuam em segredo. Uma relação bilateral que não se está clara se é entre dois homens que ocupam os cargos mais altos dos respectivos países ou institucional entre os dois países que não têm nenhum histórico de amizade e muitos menos partilha traços culturais ou políticos, mas que por força da solidariedade respondeu o grito de Cabo Delgado, outras hipóteses que compreendem a descida do topo das próprias potências ocidentais que viram no Ruanda a extensão da sua representação e equiparam o país para actuar em nome destes em Cabo Delgado.

Seja como for, é dentro desses acordos secretos que nasceu o novo dono dos negócios de Cabo Delgado, um dono controlado pelo partido liderado por Paul Kagame, que através da Macefield Ventures Mozambique, cujo objectivo principal no BR tem a ver com exercício das actividades de gestão de empresas e gestão de negócios, lidera, através de sucursais como a NDP, a construção no interior de Afungi, a Isco Security, actuando na segurança no interior de Afungi, assumindo missões que não constam do mandato das Forças Policiais e militares daquele país, ou seja, complementar a missão destes especificamente nos projectos da TotalEnergies. A pergunta é que missões são estas que não constam do acordo quando está claro que o mandato de Ruanda está mais para protecção dos interesses franceses e, quando necessário, chegam a intervir em assuntos políticos para garantir tranquilidade do seu perímetro de segurança.

Estranho ainda é como uma empresa que nasceu a menos de um ano consegue dominar aquela presença, abrindo sucursais e empresas que conseguem trabalhos no interior de Afungi, onde as empresas de casa dizem aguardar pela retoma das actividades para trabalhar? O tempo, passado este período de turbulência de sucessão, terá muito que nos responder nos próximos 24 meses.

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