A Saga do conteúdo local_2

OPINIÃO

Felisberto S. Botão

Não é natural o africano ser oferecido por DEUS tanta riqueza e tanta beleza natural, e estar virado a destruir-se a si próprio e espalhar pobreza no seu seio, no lugar de usufruir das bênçãos.

Este pode ser o maior dos segredos que ainda temos por desvendar, que pode trazer a explicação que leva o africano a assumir uma postura contra si próprio, subalternizando-se na sua própria terra, e, entretanto, outras raças a substituírem-se na vida do africano, e usufruírem da riqueza, da vida e da terra maravilhosa que Deus deu a África e seus filhos.

O desenvolvimento da capacidade local deve ser consequência da implementação do conteúdo local, que é, de forma incondicional, disponibilizar oportunidades às empresas locais, na oferta de produtos e serviços, com quotas mínimas estabelecidas, no âmbito do desenvolvimento de projectos de investimento externo e interno.

As empresas privadas locais são a única ferramenta que nós temos, que de forma efectiva podem capturar capital significativo neste processo de projectos da indústria extractiva, infra-estructuras públicas e outros, multiplica-lo, construir novas capacidades, gerar e conservar riqueza para o país.

A afirmação dar preferência a fornecedores locais “se” o custo, qualidade e pontualidade na entrega de seus bens e/ou serviços forem iguais em qualidade, ao concorrente internacional”, são das tais ferramentas prontas que são entregues aos nossos pensadores, incluindo reguladores, como se fosse uma narrativa estabelecida e aceite internacionalmente, para capturar, infiltrar-se e manipular o nosso processo de pensamento, assegurando que não vamos chegar a lugar nenhum.

O exercício intelectual de assimilar centena de páginas de leis e princípios internacionais, e o esforço de querer mostrar que também entendemos, e actuamos em conformidade, tem desviado o nosso regulador e o resto da massa crítica, de proteger os interesses nacionais.

Como questionou a minha filha, que já começa a dar indicações de percepção do que está a acontecer a sua volta, “o que é do branco é bom, até que prove o contrário. O que é do preto é mau, até que prove o contrário. Será isso, pai?” Eu respondi “não necessariamente”, mas dei comigo com alguma amargura, que recentemente, num processo de selecção de fornecedor, tive um acesso espontâneo de confiança, quando no meio da lista apareceu um português.

A questão é muito mais profunda do que pode parecer, e tem contornos complexos a nível mental e espiritual.

O conteúdo local deve começar pela consciência colectiva do que é bom para nós colectivamente: o nosso recurso é o nosso activo, e deve beneficiar primariamente a nós, antes de qualquer outo. Daí entender que o investidor está à procura de oportunidade para o seu dinheiro, e nós é que estamos a dar esta oportunidade. O investidor não é o dono do negócio, e muito menos do recurso.  Ele é o parceiro privado, com a prerrogativa de operar o negócio pelo know-how que traz consigo.

Para o investidor ganhar a oportunidade, e exercer a prerrogativa de operar o negócio por 10, 20 ou 30 anos, deve necessariamente observar uma condição essencial e primária: colocar as oportunidades de negócio na mesa, não menos do que 40% do investimento, que devem ser alocadas às empresas locais, de moçambicanos, junto a um processo claro de transferência de know-how, durante o período de vigência da exploração do recurso. Tudo o resto deve vir a seguir.

O foco deve mudar da construção de capacidade, para a selecção e disponibilização de oportunidades. A capacidade deve ser construída durante a execução dos contratos, com o acompanhamento do investidor, que deve necessariamente construir uma estrutura de assistência as PMEs, na observância de normas de qualidade, segurança e ambiente.

Assim que escrevo, muitas empresas até já esqueceram os treinamentos que receberam das multinacionais ou financiados por estas, e outras até já não estão com a mesma equipa que participou no treinamento, e mesmo assim, ainda não viram nenhuma oportunidade para negociar.

Não podemos permitir esse entretenimento ao nosso próprio povo, a nossa própria economia.

A autoexclusão e o sentimento permanente de desmerecimento e despreparo, resultado dos processos que me referi no início do artigo, estão a perturbar as cabeças dos nossos pensadores, incluindo os reguladores, o que pode estar na origem de acreditarmos que o conteúdo local não é viável, e engajamo-nos sofridamente a buscar formas alternativas ao óbvio.

O facto é que não existem alternativas ao óbvio, portanto, não poderemos chegar a lugar algum pelo caminho que estamos a seguir hoje…

As multinacionais e as embaixadas ocidentais estão a lutar para o seu próprio conteúdo local, que como não têm recursos naturais, o seu recurso é o capital, e é dele que devem alavancar as suas PMEs. Portanto, onde for o seu capital, eles vão levar as suas PMEs, e em Moçambique eles conseguiram que a nossa legislação abrisse direitos para as “Empresas Registadas em Moçambique”, em sobreposição as “Empresas Moçambicanas”. Eles estão a fazer muito bem o seu trabalho, pois não tem dúvidas sobre a sua identidade, mas o nosso regulador local, infelizmente continua com problemas de identidade, e confuso com volumes de legislação e princípios internacionais, que na dificuldade de digerir toda informação, prefere aceitar a sugestão do branco, que em princípio só pode estar certa. Infelizmente, esta é a desgraça do nosso regulador, nosso legislador, que arrastam toda a nossa economia para um atraso imensurável.

Senhores reguladores e legisladores moçambicanos, “as empresas moçambicanas é que devem subcontratar as empresas registadas em Moçambique, e não o contrário”. Esta deve ser a base de desenvolvimento da estratégia e política do Conteúdo Local, e não estes princípios complexos e intermináveis que as embaixadas e ONGs ocidentais estão a prestar-lhes ajuda com eles.

Meus pares, apesar das teorias internacionais encontrarem, na base dos princípios de mercado livre, argumentos para mostrarem o contrário, não há nada de errado em proteger o que é seu. A nossa prosperidade depende da lucidez com que lidamos com a protecção dos nossos activos, e no nosso discernimento sobre o papel do investidor estrangeiro…

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