Felisberto S. Botão
Portugal foi o primeiro país europeu a estabelecer colónias em África, mas foi também o último a sair do continente, forcando a mobilização de toda a OUA numa frente única para neutralizar o colonialismo português em cinco países africanos, incluindo Moçambique. Na altura inclui-se na mesma frente o apartheid do bóer holandês na África do Sul. O apego dos portugueses e dos bóeres pela África são as riquezas, e não a terra, e a sua mentalidade ainda não mudou.
Aliás, Portugal também foi o último país a abolir a escravatura, no Brasil, no ano 1888. Estes são indicadores muito fortes sobre a real natureza do Português. E o bóer sul africano tem uma ligação muito forte com o Israel, o que não surpreende o massacre e o desprezo pela vida humana que estamos a assistir na Palestina desde outubro último, que faz lembrar outros tempos na África do Sul.
Ao cidadão português pacato, uma informação como esta é apenas história, e fica por aí. Mas àqueles ligados ao sistema, é natural que reajam a estas abordagens, pois sabem bem o que está em jogo.
Como moçambicanos, e como africanos, nunca devemos perder esta perspectiva de vista. A europa ainda quer o controlo da matéria prima e das decisões económicas em Moçambique e África.
Daí que, parar a exportação da matéria prima, vai provocar guerra entre europa e África. O nosso dever, como continente, é encontrar formas de melhorar a partilha dos ganhos destas matérias primas, incluindo um melhor posicionamento sobre o conteúdo local. Burkina Faso, Mali e Níger já estão a dar alguns passos importantes, renegociando os contratos, assim como tenho alguma informação do Gana e do Zimbabwe.
Os brancos são guerreiros incansáveis. Estão dispostos a guerra infinita, não se importam com as perdas de vida. Sem esquecer as I e II Guerras Mundiais, veja como financiam, em conjunto, a guerra da Ucrânia e da Palestina, veja os casos da Síria, Afeganistão, Congo Democrático, a quantidade de mortes envolvidas. Nunca estão dispostos a largar o osso, e mesmo derrotados, sempre podem voltar.
Veja o que respondeu a então secretária de Estado do governo Clinton, Madeleine Albright, de que “valeu a pena pagar este preço” de matar “500 mil crianças iraquianas”, quando foi confrontada pela entrevistadora Leslie Stah do “60 Minutes”, da rede de TV CBS, sobre a crise humanitária que as sanções de bloqueio geraram no Iraque, em 1996. Terá esta pessoa a consciência do valor da vida humana?
Com a melhoria na partilha de rendimentos, podemos investir numa industrialização e infraestruturas que se alinham com a nossa realidade. Proteger o aumento do comércio entre nações africanas, para crescer o mercado interno e baixar a dependência de exportação para o ocidente; estabelecer uma lei e estratégia única de conteúdo local, que deve incluir as compras locais dos governos africanos, para maximizarmos os ganhos na exploração de recursos naturais e investimento nas infra-estructura, possibilitando a capitalização das empresas locais; e aumentar a participação do estado nos sectores económicos chave como a mineração, petróleo e gás, agricultura e indústria, mas com estruturas geridas com princípios privados.
A narrativa da privatização foi de propósito para tirar a força económica do estado, e agravada pelo disfuncional quadro legal, que não permite o crescimento das empresas privadas nacionais, mas abrindo caminho para as corporações multinacionais, ou seja, ocidentais. O estado deve retornar o controlo de sectores chaves da economia.
A união é fundamental em África, e o uso da plataforma PAPSS, a ferramenta para pagamentos entre mercados africanos na moeda local, é de urgente adopção. E junto a isso avançar gradualmente para sistemas de transações internacionais que favoreçam a moeda local. A instabilidade das nossas moedas deriva do facto de estarem indexadas ou avaliadas em função do dólar americano. Esse cordão umbilical deve ser cortado.
Para que estas mudanças sejam possíveis, é imprescindível que a situação política mude, e esta só pode mudar se tivermos coragem de atacar e introduzir mudanças profundas na actual democracia praticada em África, que só beneficia as potencias ocidentais.
Democracia legalista vs. Democracia popular
Depois dos últimos casos eleitorais de Moçambique, Nigéria e Quénia, fica claro que a democracia praticada em África, o poder está nos tribunais, e não no povo. Esta é uma democracia legalista e não popular.
Em África só o povo pode acabar com a democracia legalista, patrocinada pelo ocidente, e implantar no seu lugar a democracia popular, onde o povo detém o poder e a soberania. Novas lideranças devem emergir das massas e das forças armadas, e não da classe política actual.
O ocidente está a forjar novas mudanças, que virão do sistema monetário, da inteligência artificial e das pandemias, com a força militar como meio de persuasão, no caso de necessidade. Se não resolvermos o nosso problema com urgência, a situação do nosso povo será pior que a escravatura de há 600 anos atrás. O branco acredita profundamente que o negro é um ser da 3a ou 4a categoria, um ser descartável, e o custo acrescido de acesso aos recursos africanos está a aborrece-los.
A nossa classe política actual, na sua maioria não está em condições de ajudar, tal é o nível de comprometimento.
Um movimento pan-africano deve redesenhar os modelos africanos e experimentar os modelos propostos, com os governos do dia que são mais progressistas. Há uma oportunidade soberana que deve ser aproveitada, que são os 4 ou 5 países disponíveis no Sahel, para testar novos modelos. Se estes países serem deixados sozinhos, o risco de caírem e sofrerem revolta popular é muito grande. Eles não têm chances a actuar no sistema colonial, que continua a controlar o comércio, o sistema monetário, as tecnologias, …
Os pan-africanistas como a Dra. Arikana, PLO, Joshua Maponga, e outros devem dar assistência às 5 nações do Sahel, com voz alta, para que não haja retrocessos. O ocidente está a investir pesado para reverter a situação.
Lembram-se do que aconteceu com a bravura do povo Haitiano? Depois de derrotar no campo de batalha a França, a Inglaterra e a Espanha, ficou sem suporte dos seus semelhantes, a ponto de ficar vulnerável à invasão dos estados unidos em 1915 pelos “Marines”, onde uma das primeiras acções da invasão foi roubar todo o ouro dos bancos Haitianos, e transferir para o “National City Bank of New York”, hoje famoso apenas como CITI BANK, que actua impunemente no mercado internacional. Grandes líderes como Toussaint Louverture e Charlemagne Péralte, apesar da sua bravura, não puderam impedir a contínua sabotagem do país, que mantem hoje o Haiti como um dos países mais pobres do mundo.
Hoje temos o nosso país irmão do Quénia que quer ir invadir o Haiti sob supervisão dos causadores dos problemas do Haiti, em troca de pouco mais de 100 milhões de dólares. Como isso pode ser possível?
Estamos a construir um sistema político baseado nas conexões que conseguimos estabelecer com grupos europeus que dão dinheiro. Cada um vai criando suas amizades na europa, estados unidos, canada, etc., fazendo das forças políticas africanas uma nova vaga de ONGs. A nossa fraqueza com o dinheiro está a tornar-se um problema, nós cedemos à pressão que precisamos de dinheiro para viver, mas não ganhamos dinheiro, mas sim, temos que receber. Alguém tem que dar, ou temos que tirar de alguém.
O mesmo está a acontecer já a algum tempo com as igrejas e ONGs locais. São os tais fundos subvencionais, que se tornaram um grande esquema de gestão de influências, sem tirar o mérito para os vários casos genuínos de projectos subvencionados que acontecem no país e no continente.
Aqueles que descobrem os canais se destacam em relação a maioria, e começam a mostrar algumas acções, e exibir bens materiais. Se promovem socialmente, e promovem a ideia que a amizade com o branco é que possibilita este bem-estar. Precisamos deixar de ser este povo que só percebe a mensagem depois do líder mensageiro morrer ou ser morto.
O sofrimento é muito, que as pessoas acabam buscando apenas a sobrevivência, e quando acham isso na igreja, entregam-se por completo. Isso não representa nada, diante daquilo que este povo tem como potencial, mas o povo não sabe, o sofrimento é demais.
O seu comentário e contribuição serão bem-vindos. Obrigado pelo seu suporte ao movimento SER ESPIRITUAL https://web.facebook.com/serespiritual.mz/
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