Frelimo reedita fraude em Gurué e Marromeu e concorre “sozinho” em Nacala-Porto

DESTAQUE POLÍTICA
  • O nível de abstenção foi perto de 70%
  • Em Gurué, controlou os meios do Estado, importou votantes e derramou sangue para evitar que a autarquia caísse nas mãos da Nova Democracia

As eleições de dez de Dezembro, decretadas para corrigir as fraudes verificadas nas eleições de 11 de Outubro, em Marromeu e nalgumas mesas de Gurué, Nacala-Porto e Milange, não foram capazes de repor a verdade eleitoral de forma justa, livre e transparente. Houve reedição de tentativas de enchimento das urnas, violência policial com recurso a balas verdadeiras e perseguição dos membros da oposição. Nas autarquias de Marromeu, em Sofala, e Gurué, na Zambézia, os relatos são aterradores e o nível das abstenções confirma a velha estratégia da Frelimo, reduzir a participação onde a oposição tem maior expressão. Em Nacala-Porto, a participação foi de 28 % e em Gurué foi de 33%, cenário diferente foi constatado em Marromeu, onde a eleição foi repetida em todo o distrito e a afluência às urnas foi de mais de 50%. No fim do processo, a Frelimo declarou-se vencedor nas quatro autarquias onde a eleição foi repetida, até em Nacala-Porto, onde a Renamo ensaiou boicote.

Em cumprimento do acórdão do Conselho Constitucional que atribuiu nas suas equações, depois de analisar os dados do apuramento geral, 56 autarquias a Frelimo, quatro a Renamo e uma a MDM, o país voltou a acolher, no dia dez passado, as eleições autárquicas na vila autárquica de Marromeu e nalgumas mesas das autarquias de Nacala-Porto, Milange e Gurué. São mesas cujos resultados poderiam alterar o cenário global.

Em Nacala-Porto, a Renamo boicotou o processo e absteve-se de participar. Mas o processo avançou com a Frelimo a concorrer quase sozinho. De acordo com o apuramento paralelo realizado pelo Consórcio Eleitoral Mais Integridade, com base nos editais das 18 mesas, a Frelimo venceu com 91% (3.227 votos), contra 6,2% (221 votos) da Renamo e 2,5% (89 votos) do MDM. Votaram 3.694 dos 12.893 inscritos, o que representa uma taxa de participação de 28,7% e uma abstenção de 71,3%.

Resultados que a Renamo não reconhece, porque, segundo o cabeça-de-lista, Raul Novinte, os dados apresentados são falsos e foram inventados, já que o seu partido avisou que não ia participar do processo. O facto é que a Renamo constava dos boletins de voto e foi votado. No entanto, não deixa de ser expressiva a abstenção de 72,3%, que pode ser reflexo da expressão da Renamo, que não acredita na transparência do processo.

No distrito de Gurué, onde os tumultos soam mais alto, o processo interrompeu-se em mais da metade das mesas por duas horas devido a vários ilícitos eleitorais: presença de eleitores que carregavam boletins já preenchidos a favor da Frelimo, um deles logo após ser descoberto foi detido pela PRM, o que também contribuiu foi a suspeita de alguns eleitores que se apresentaram para votar e cujos nomes que constavam dos cadernos terem sido vistos a votar noutro local de votação durante a primeira volta.

Ainda em Gurué, há quem votou sem ter nome nos cadernos. O que também marcou as eleições de Gurué foram os tiroteios que houve por parte da polícia, segundo os munícipes, a UIR lançou gás lacrimogéneo contra eles e algumas foram alvejados e encontram-se em estado grave. Não foi só gás, as balas foram usadas para dispersar os eleitores que tentavam acompanhar o processo e denunciar tentativas irregularidades.

No fim deste enredo, dados vieram apontar que a Frelimo venceu as eleições do dia 10 de Dezembro de 2023 nas 13 mesas do município do Gurué por 62,2% (1.678 votos), contra 31,8% (858 votos) do partido Nova Democracia (ND). A taxa de participação foi de apenas 33,6%, o que representa uma taxa de abstenção de 66,4%.

Em Marromeu, onde também se registou vários tumultos, as principais causas das interrupções reportadas são a detenção do presidente da mesa, por ter rasgado boletins de voto pré-marcados e inseridos na urna por um Membro, os delegados da Renamo foram impedidos de acompanhar a votação, houve igualmente detenções, desta vez um delegado foi detido por tentar impedir uma eleitora de introduzir 5 boletins de voto na urna.

Milange foi o distrito em que não houve ecos de violência, e ao que tudo indica o processo de votação ocorreu sem sobressaltos, a Frelimo foi tida como vencedor com cerca de 59,93% dos votos, contra 39,77% da Renamo e 1,30% do MDM.

Analisando todo o processo eleitoral, desde o primeiro momento, o especialista em Relações internacionais, Hilário Chacate, observa que a pressão da Renamo não vai alterar os resultados. “Do ponto de vista da reposição da justiça eleitoral, não é possível isso acontecer, porque o estado Moçambicano é visto como soberano e tem as suas regras, nenhuma outra entidade pode impor. É mais um protocolo que a Renamo vai seguir, mas não vai alterar o que foi declarado pelo Conselho Constitucional”, explicou Chacate.

Para o especialista em relações internacionais, recorrer a comunidade internacional vai apenas tornar o maior partido da oposição mais conhecido internacionalmente, por isso apela que Ossufo Momade e membros organizem-se ainda melhor para as próximas eleições.

Para além disso, Hilário Chacate defende a reestruturação das instituições que gerem os processos eleitorais e uma reforma profunda do ordenamento do Estado Moçambicano para se alcançar a justiça eleitoral. “Se o ordenamento eleitoral continuar altamente partidarizado, desde a CNE, onde a Frelimo tem a maioria, Renamo tem dois membros, MDM um e uma sociedade civil suspeita, este ordenamento eleitoral que nós temos em Moçambique vai permitir que os partidos políticos façam suas jogadas para fazer passar as suas agendas”.

Já Wilker Dias, analista político, entende que recorrer a organismos internacionais pode causar um impacto negativo perante os doadores que olham Moçambique como um país justo, visto que maior parte deles são de países democratas, “o partido Renamo pode optar por estes caminhos, mas será um caminho sem volta, porque muitos doadores podem cortar a relação com o país”.

Entretanto, Dias diz que a melhor via seria buscar soluções internas para resolver o problema das eleições autárquicas 2023.

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