- Desde Agosto que o contrato da FMA não é assinado pelo IGEPE
- Gestão da FMA está a ser questionada e trabalhadores falam de incerteza do voo Maputo – Lisboa
- Avião cargueiro está há quatro meses sem voar, mas foi pelo menos dois meses
- Há problemas de décimo terceiro, combustível e prejuízos de 4,5 mil milhões
- O que não falha é o pagamento das facturas (ZAR 1,5 milhão) da FMA e dos seus questionáveis parceiros na RSA
As notícias que escapam à imprensa são de uma LAM em ligeira recuperação, que se traduz na abertura de mais rotas e custos de bilhete acessíveis para passageiros. Mas internamente, o quadro que se tem é de uma empresa em contínuo declínio e com sérios prejuízos desde a entrada da Fly Modern Ark (FMA). Os velhos problemas de atrasos e deficiente manutenção de aeronaves juntam-se agora aos problemas de voos sem seguros, salários em atraso e falta de consistência das decisões dos gestores. Em menos de um mês que foi introduzido o voo Maputo – Lisboa, já enfrentou riscos de não voar por falta de combustível e agora sua continuidade é cada vez mais incerta, num contexto em que de bandeira nacional aquele voo só tem os bilhetes, pois por falta de garantias a EuroAtlantics recusa-se a colocar a bandeira nacional e o logo da LAM na aeronave, uma tendência que se verifica nos voos domésticos e regionais em que a LAM voa com aviões com bandeira sul-africana e marca Cem Air. Os trabalhadores querem debater estes e outros problemas, mas FMA recusa-se a reunir. “Por que esse esforço em querer matar esta companhia? O que está a acontecer? Os colegas não estão a ver, estão distraídos com o décimo terceiro. O assunto é mais sério aqui, se o IGEPE não trouxer dinheiro para suportar Operação Lisboa, vamos cantar uma música muito triste”, observa o Comité da LAM, numa reunião onde o gestor da FMA chegou no fim. Além de problemas internos, o contrato entre a FMA e o IGEPE não foi renovado, em resposta, a FMA diz que o contrato assinado foi de um ano.
Já passam dez meses desde que o Governo entregou a intervenção nas Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) a uma empresa sul africana de reputação questionável, a FMA. Já no segundo mês, a empresa propalava uma intervenção bem-sucedida, apesar de não ter cumprido no espírito o anúncio de que os gestores interessados em intervir deveriam trazer os próprios meios e tornar a LAM sustentável e no final ganhar com a partilha de lucros.
Como resultado desta intervenção, foram reabertas algumas rotas que a LAM tinha deixado de operar. Com documentos e planos na mesa, a FMA reativou as rotas Johanesburgo – Vilanculos, Maputo – Lisboa, Maputo – Cape Town, entre outros, que foram confundidos com o retorno da estabilidade da empresa. A boa nova que foi anunciada com custos de bilhetes acessíveis, como se viu na rota Maputo – Joanesburgo, criou uma narrativa de que afinal é possível voar a custo acessível na LAM, mesmo que o objectivo dessa redução de custo significasse aniquilamento da empresa, que buscava na altura não perder o mercado com a concorrência da Fast Fly, uma companhia low cost que operava pela primeira vez aquela rota.
Novas rotas abrem espaço para FMA drenar dinheiro com aluguer de aviões
À margem da boa nova e longe dos golpes de marketing da FMA, a LAM sucumbia por dentro. Por não ser compreensível a uma mente minimamente funcional, a precipitação de abrir novas rotas, num modelo ACMI – Avião, Tripulação, Manutenção e Seguro (contrato operacional em que a empresa disponibiliza todos os meios para a realização do vôo) sem consolidar rotas internas foi interpretada nalguns corredores como uma forma de sofisticar o negócio de aluguer de mais aviões, onde há indício de ganhos nas comissões, que, aliás, sempre foi principal core-business da duvidosa FMA.
É que ao mesmo tempo que são abertas novas rotas, por dentro, os velhos problemas da LAM são registados com muita regularidade. São os atrasos, as avarias e problemas de gestão técnica, como os que se verificaram num dos voo de Maputo – Pemba, em Janeiro, onde o número de passageiros era maior à capacidade da aeronave. Foi um insólito que levou o voo a atrasar uma hora e foi preciso negociar com alguns passageiros para ceder os seus assentos.
A pretexto de abrir uma linha de cargueiros, a FMA alugou um avião cargueiro, posicionado no hangar do aeroporto de Maputo, que já pagou dois meses, além de depósito, sem, no entanto, estar a ser usado. Já se vão quatro meses.
“Mensalmente, a empresa está a pagar dinheiro para um avião que não está a produzir, o que que estamos a fazer? Por que esse esforço em querer matar esta companhia? O que está a acontecer?”, questionou Bartolomeu Simbine, numa reunião entre a direção e os trabalhadores da empresa.
Em termos operativos, dados facultados por fonte da empresa, indicam para prejuízos em mais de 4,5 mil milhões de meticais desde que iniciou a intervenção da FMA. A despesa da empresa aumentou em mais de 200 % e as receitas diminuíram. A rota Maputo – Lisboa está a ser suportada pelas parcas receitas das rotas domésticas, uma situação que vem agravando a situação da tesouraria.
Na reunião havida no dia 22 de Janeiro, os funcionários da empresa perguntaram as motivações por detrás da decisão da reabertura da rota Maputo – Lisboa, no entanto, a FMA, que deveria responder, quase que gazetou à reunião e mandou uma representante que na interpretação do Comité Sindical da empresa não tem capacidade para responder algumas questões relevantes. É que Sérgio Matos, representante da FMA, chegou no fim da reunião, quando já tinha sido questionado sua ausência.
“Vamos parar com Operação Lisboa (…) vamos voltar às nossas operações normais”
“Os colegas não estão a ver, estão distraídos com o décimo terceiro. O assunto é mais sério aqui, se o IGEPE não trouxer dinheiro, sinceramente falando, para suportar Operação Lisboa, a gente vai cantar uma música muito triste”, disse Bartolomeu Simbine, que falava na reunião do Comité Sindical da LAM com a direcção, para depois questionar ao director-geral, Pó Jorge: “então, eu gostaria de saber, senhor Director-Geral. O Sr. está aqui, está a ouvir as nossas preocupações no presente. Nós estamos a olhar para o futuro, o que esta Operação-Lisboa está a nos trazer? O que vai ser de nós? Manter esta operação nos próximos meses, se o IGEPE não está em condições de financiar, vamos parar com a operação. Não tem como, vamos voltar às nossas operações normais, vamos potenciar o mercado doméstico”.
De seguida, questionou a ausência de um representante do Estado por parte da FMA. “Devia estar aqui o Sr. Sérgio Matos, não deixar a Dra Zita vir aqui sozinha para estar a explicar coisas que se calhar nem estão ao alcance dela. Até onde eu sei, o director do projecto da FMA é o senhor Sérgio Matos, ele não está aqui. Senhores do sindicato, ele não foi informado deste encontro? Por que não está aqui? Este é o dia que devia estar aqui. Vamos lá pôr as coisas em pratos limpos. Sr director-geral, precisamos do seu conforto aqui, os nossos homens estão de olhos postos no Sr. se é preciso convocar IGEPE para vir aqui, reunir com os trabalhadores ou até o próprio ministro, por favor, nós estamos aqui dispostos e preparados para conversamos sobre esta operação Lisboa e outros aviões que estão sendo pagos sem produzir”.
De acordo com o Comité Sindical da LAM, o valor pago desnecessariamente pelos aviões que não voam pode pagar 50% dos colaboradores que não têm décimo terceiro e outras despesas importantes.
“Quem está interessado neste tipo de coisas, então, por favor, estamos a apelar, nós gostaríamos de ver o conforto do IGEPE. O que pensa em fazer para manter a Operação – Lisboa sem afectar a tesouraria da empresa”, prosseguiu Simbine.
Cresce dívida com os fornecedores e há problemas de décimo terceiro
Enquanto a factura da FMA não falha o pagamento, cresce a dívida com os fornecedores, com a Petromoc a liderar a lista. São 400 milhões de dívida à Petromoc, que chega a colocar a LAM numa incerteza. A dívida com os Aeroportos de Moçambique é de 250 milhões, já com a SMS Catering é de 115 milhões, enquanto com a MAHS são 46 milhões, Puma 20 milhões, para não falar de créditos com a TravolPorte e IATA.
Mas não é só a dívida com os fornecedores que está a falhar, os salários também. O décimo terceiro também é uma incógnita, o que está a causar pânico nos trabalhadores. A FMA, na pessoa de Sérgio Matos, que não mostrou honestidade nas respostas dadas ao Evidências, explicou que o décimo terceiro é “pago até Junho de cada ano”. Afirmação que foi refutado pelos funcionários da LAM.
Por outro, o que não falha é o pagamento de 1.5 milhão Randes (4 milhões meticais) referente aos serviços de consultoria, que a princípio não devia ser pago antes da recuperação da empresa.
Numa aparente discórdia, o Evidências teve de fontes próximos ao IGEPE informação que indica que desde que o contrato da FMA inspirou nos seus primeiros seis meses, ainda não foi renovado e aguarda pela assinatura de Ana Senda, presidente do Conselho de Administração do Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), que não parece gostar da intervenção da FMA desde o primeiro dia. Lembra-se que depois do anúncio de Magala ela teve de reunir com os trabalhadores para lembrar quem que mandava na LAM. Estrategicamente, a FMA já falou de sabotagem atrás da sua intervenção na LAM.
Sergio Matos afirma que as receitas da LAM estão a aumentar
Nas respostas pouco verídicas sobre a situação da LAM, Sérgio Mato chegou a afirmar a este Jornal que não só as despesas estão a aumentar, como as receitas também. Mas nada disse sobre a situação dos fornecedores.
“Eu participei, porém atrasado porque estava a solucionar um outro assunto da LAM. Quando cheguei a reunião, o colega já havia questionado sobre a ausência de alguém do Governo”, disse, para de seguida afirmar que os dados que tem “mostram aumento de despesas e de receitas por conta de aumento de rotas e aeronaves”.
Quanto ao atraso de salários, nunca a empresa teve dificuldades, pois os salários são pagos no período de 25 à 31 de cada mês. “Talvez quisesse dizer atraso no pagamento do 13° ao segundo e terceiro grupo, que estão sendo pagos semanalmente, com excepção da semana passada, porque era semana de salários e não havia posição de caixa para cobrir tudo ao mesmo tempo”.
Aliás, “vale recordar que a companhia tem como prática pagar 13° à partir de Novembro de um ano e terminar em Junho do ano seguinte. Se estaria a FMA metida no esquema saberíamos todos. Não posso acreditar que ao trazer soluções com custos mais baixos sobre mesma matéria ou objecto poderá consubstanciar-se em esquema para afundar a LAM. Não creio que seja alguém com lucidez a pensar assim”, disse Matos, numa afirmação mais uma vez desonesta, visto que a LAM nunca pagou décimo terceiro até Junho do ano seguinte. E mais, o Evidências teve acesso a números que mostram que o aluguer de aviões no modelo ACMI é oneroso quando comparado com o modelo tradicional daquela companhia, o que levanta sérias dúvidas sobre a idoneidade dos gestores da LAM.
Sobre o avião cargueiro que está estacionado, Matos explicou que é por conta das autorizações junto às autoridades da Alfândegas e IACM que estão no processo normal de registro da aeronave – Matrícula Moçambicana. “O pagamento da renda (que não são três mil diários) vai iniciar a contagem a partir de Fevereiro, o que significa, até dia 28/02 o Cargueiro deverá estar em pleno funcionamento”, anotou.
“A abertura (de rotas) é esforço de tornar a empresa rentável”
Em resposta à questão feira por este Jornal, Matos respondeu que a abertura de rotas “é esforço de tornar a empresa rentável. Deve ter conhecimento de que há rotas internas que não são rentáveis, mas precisa-se que as pessoas circulem com maior flexibilidade e segurança. Só para recordar, a LAM é uma companhia com alguma responsabilidade com o Povo Moçambicano e outros que necessitem de mobilidade”, disse.
Por outro lado, em mais uma afirmação duvidosa, disse que “está-se voando com tributação da CEM Air porque com a reintrodução da rota Lisboa grande parte passou para esta linha enquanto o processo de formação dos novos integrantes, novos tripulantes está a decorrer e tem o seu término na segunda semana de Fevereiro”. Quando peneirado, esta questão mostra-se desonesta, visto que a CEM Air começou a voar antes da introdução da Operação Lisboa.
“Em relação à renovação do contrato, creio que poderá ser renovado se o Governo/IGEPE estiver a ver resultados positivos pela intervenção. Ninguém pode renovar contrato quando não estão sendo cumpridos os termos do mesmo. De referir que o contrato é de 1 ano, e penso que até esta data são 8 meses, se a memória não me falha”, justificou, mas quando foi solicitado o contrato para confirmar estas declarações, numa altura em que há rumores da recusa da extensão do mesmo, passados seis meses, emudeceu.
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