Deixar a indústria morrer para depois revitalizá-la

OPINIÃO

Alexandre Chiure

É actual, ao nível da SADC e mesmo da União Africana, o discurso sobre a industrialização. Os estados de África perceberam que estão a perder balúrdio de dinheiro com a exportação de matérias-primas em bruto para a Europa, Ásia e América.

O antigo Presidente do Zimbabwe, Robert Mugabe, que era um dos grandes defensores do projecto, dizia, em vida, numa cimeira da SADC, que o continente ganha apenas 10 por cento do valor, pois os produtos e os subprodutos ficam com os compradores das mesmas.

Moçambique está a assumir o desafio. A revitalização da indústria nacional já é assunto para o governo.

O sonho é de trazer de volta algumas fábricas que o país teve no passado e que empregavam centenas de moçambicanos, produziam e alimentavam o mercado interno e externo.

Moçambique já teve praticamente quase todo o tipo de indústria, desde ligeira e pesada, a exemplo da Cometal Mometal, que produzia vagões para os Caminhos de Ferro de Moçambique, com encomendas para a Swazilândia, Zimbabwe e Tanzânia; a Maquinag, que oferecia mobiliário de escritório e hospitalar.

A Cometal Mometal destacou-se igualmente na fabricação de estruturas metálicas gigantescas. Esta e outras unidades industriais tornaram o país uma referência na região neste ramo de actividade.

A título de exemplo, no sector de vestuário e têxteis, o país já teve fábricas como Sabrina, Investro, Soveste, Texlom, Riopele, Textáfrica de Chimoio, Têxtil de Pungue, Texmoc e Texmanta.

A UFA e a Facobol eram de calçado e borracha e a FAPACAR, FAPAM, Vidreira e Metalbox, de embalagens. A Mabor produzia pneus com padrões internacionais e a Tudor, de baterias e pilhas. Tivemos, também, em peso, a indústria alimentar, a exemplo da Somopal, de conservas.

Os produtos que estas fábricas ofereciam ao mercado eram de uma qualidade inquestionável. Alguns deles destinavam-se exclusivamente à exportação. Quem é que se não se lembra dos tecidos fabricados pela Riopele ou das camisas manufacturadas pela Soveste e Sabrina?

Para dizer que o que o país sonha ter hoje, em termos de indústria, já o tive num passado recente, mas nada foi feito para manter essas unidades industriais em funcionamento. Deixamos tudo escangalhar-se à luz do dia e hoje choramos por não industrialização do país.

É triste ver hoje instalações de antigas fábricas transformadas em armazéns ou jogadas pura e simplesmente no abandono, como é o caso da Vidreira, em Maputo, e de tantas outras.

A única indústria que escapou foi a açucareira. Em seu benefício, o governo adoptou uma política de protecção que consistiu no agravamento das taxas de importação do açúcar para desencorajar a prática e promover o consumo do produto nacional, medida que faltou para os outros ramos de actividade.

A abertura do país, em 1987, à economia do mercado, com a introdução do Programa de Reabilitação Económica (PRE), expôs as indústrias moçambicanas numa situação de vulnerabilidade. Elas trabalhavam com matéria-prima importada e enfrentavam muitas dificuldades para a sua compra devido à carência de divisas no país.

Estes factores e outros contribuíram negativamente para a queda e agravamento dos custos de produção. Por essa razão, os produtos made in Moçambique perderam o mercado pois tornaram-se mais caros em relação aos importados.

Abandonadas à sua sorte, as indústrias fecharam as portas, cada uma no seu tempo, tudo porque faltou apoio por parte do governo do dia para evitar a sua falência. Faltaram políticas e estratégias direccionadas para o estímulo à produção industrial, tornando os seus produtos competitividade no mercado.

Hoje, somos obrigados a começar quase do zero a implantar unidade por unidade, por culpa própria,  quando, neste momento, estaríamos num outro patamar.

Durante o governo do Presidente Armando Guebuza, a ordem era que cada líder comunitário tivesse uma floresta. Esta iniciativa tinha um significado muito importante do ponto de vista ambiental. Carregava consigo a mensagem sobre a necessidade de participação de comunidades no programa de florestamento do país.

Um líder comunitário, ciente de que estava a cumprir fielmente as orientações de Guebuza, mandou destruir uma floresta inteira que existia na sua zona jurisdicional e limpar o terreno para dar lugar a uma de cariz comunitária.

Esta história incrível assemelha-se ao que está a acontecer em relação à indústria. Deixamos tudo estragar-se. Fábricas a fecharem as portes e a despedirem centenas de trabalhadores. Matérias-primas a serem exportadas em bruto para a Europa, Ásia, e América porque a nível interno não há capacidade para as transformar em produtos acabados e com o aproveitamento dos subprodutos.

Permitimos que o país ficasse sem indústria para fazermos tudo de novo:  industrializar o país e resgatar o que perdemos. O que é que mudou? Será que já temos políticas para apoiar os industriais de modo que venham para ficar e não com o risco de fecharem as portas a seguir? Tenho muitas dúvidas.

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