Agentes da PRM sofrem descontos nos ordenados pelo segundo mês consecutivo 

DESTAQUE POLÍTICA
  • Há agentes que só receberam 200 meticais nos últimos dois meses
  • Estado pode estar a violar a Lei e moral está baixa dentro da corporação
  • Por lei, o empregador não pode descontar mais do que a terça parte do salário
  • Comando Geral da PRM diz que os agentes sabem os porquês de serem descontados

Em Fevereiro do corrente ano, a Direcção de Logística e Finanças do Comando Geral da PRM tornou público que recebeu da CEDSIF um plano de amortização dos salários considerados duplicados nos meses de Junho, Julho e Agosto de 2023, no âmbito da migração de dados do Comando Geral da PRM para o CEDSIF, sendo que a medida abrange cerca de 38624 membros da corporação. No entanto, ao invés dos agentes que tiveram os ordenados duplicados nos meses em alusão, há agentes que estão a receber míseros 200 meticais pelo segundo mês consecutivo, enquanto os seus nomes não constam da lista do plano de amortização. Este cenário, segundo os agentes da lei e ordem, complica sobremaneira as suas vidas, por isso pedem a quem de direito para resolver a sua situação. Contactada pelo Evidências para falar da situação que inquieta os seus membros, o porta-voz do Comando Geral da Polícia da República de Moçambique, Orlando Mudumane, foi parco nas palavras, tendo apenas se limitado a dizer que os agentes sabem os porquês de serem descontados salários. Entretanto, fazendo fé nos relatos de que há agentes que receberam abaixo de mil meticais sem nenhuma explicação plausível, pode-se estar diante de uma clara violação da Lei, que impõe um limite a qualquer empregador, incluindo o Estado, em relação às quantias a descontar. No caso o limite  é de um terço do valor do salário base.

Duarte Sitoe

Reina um sentimento de revolta no seio dos membros da Polícia da República de Moçambique devido aos cortes salariais no âmbito do plano de amortização dos salários considerados duplicados, curiosamente pelo sistema, nos meses de Junho, Julho e Agosto de 2023.

Aquando do anúncio, através do despacho com o número de referência 276/DF/DLF-CG/24, datado de 01 de janeiro, por sinal aprovado em Fevereiro pelo Comandante Geral da PRM, Bernardino Rafael, a medida visava apenas os agentes que nos meses em referência tiveram salários duplicados. Contudo, a lista se estende para os membros da corporação que não tiveram vencimentos duplicados.

Almeida Chongo (nome fictício) faz parte do rol dos agentes que mesmo não fazendo parte dos que tiveram ordenados duplicados entre Junho e Agosto de 2023 sofreu desconto no seu ordenado nos últimos dois meses. Chongo contou ao Evidências que esperava ver o problema resolvido depois de remetido um expediente para a Direcção de Logística e Finanças do Comando Geral da PRM, mas debalde.

“Recebemos a informação que dava conta de que aqueles que receberam salários duplicados em 2023 iriam sofrer descontos. Fiquei sossegado porque sabia que não tive salário duplicado, todavia, em Fevereiro recebi metade do vencimento. Perante a situação, foi ao Comando Geral para reclamar e disseram que tinha que trazer extracto dos meses dos salários duplicados. Levei os documentos e eles reconheceram que houve erro e que iam resolver o problema no mês seguinte, mas debalde. Para o meu azar nada aconteceu. Esta situação está a condicionar a minha vida e a da minha família”, contou Chongo, para posteriormente acusar as pessoas que lidam com as finanças no Ministério do Interior de falta de sensibilidade.

Há agentes que só receberam 200 meticais nos últimos dois meses

Não obstante esta flagrante injustiça, causada, ao que parece, novamente pelo sistema, o Estado, através do Comando Geral da PRM, pode estar em flagrante violação da lei, ao extravasar os limites admissíveis de corte salarial.

Fazendo fé de relatos de que há agentes que receberam abaixo de mil meticais sem nenhuma explicação plausível, pode-se estar diante de uma clara arbitrariedade, pois a Lei impõe um limite a qualquer empregador, incluindo o Estado, em relação as quantias a descontar ao trabalhador.

No caso, o limite é de um terço do valor do salário e incide apenas sobre o salário base do trabalhador, o que significa que ao pagar apenas 200 meticais e até metade do salário aos agentes, o Estado está a pontapear a Lei do Trabalho e demais legislação em vigor no país.

“Não é novidade para ninguém que a polícia não tem um ordenado chorudo, por isso faz das tripas coração para sobreviver. O Ministério do Interior conhece os agentes que tiveram os honorários duplicados e não vejo necessidade para cortarem salários aos que não viram a cor do tal dinheiro. Em Fevereiro recebi 700 meticais e em Março 5000 meticais. As pessoas que lidam com as finanças são insensíveis, não sabem que estão a prejudicar muitas famílias”, desabafou o agente visivelmente indignado.

Albertina Carvalho era rosto da desilusão perante ao que está a acontecer actualmente nas fileiras da Polícia da República de Moçambique. Nos últimos dois meses, Albertina recebeu 200 meticais, ou seja, 100 meticais em Fevereiro e o mesmo valor em Março, sendo que nunca recebeu salário duplicado.

“Infelizmente, não podemos fazer greve, mas não é normal o que está a acontecer. Em Fevereiro recebi apenas 100 meticais e no mês seguinte a história voltou a se repetir. Este valor nem chega para custear as despesas de transporte de uma semana. É frustrante ser cortada salário sem motivos para tal. O extracto da conta prova que não tive ordenados duplicados entre Junho e Agosto do ano passado, mas para o Ministério do Interior recebi. Falaram que iam repor o valor subtraído em Fevereiro, porém voltei a receber o mesmo valor. Esta situação desmotiva, ninguém pode ficar motivado perante esta situação. Pedimos a quem de direito para resolver a nossa situação. Vivemos em casa de aluguer e corremos o risco de sermos despejados porque a dona da casa não quer entender que é o Governo quem está a falhar”, declarou.

No entender de Anibal Pinto, outro lesado, a Direcção de Logística e Finanças do Comando Geral da Polícia da República de Moçambique está a vulgarizar a corporação, uma vez que a mesma conhece muito bem os agentes que receberam salários duplicados, daí que defende que é estranho cortarem membros que não fazem parte da lista dos 3862 membros que legitimam os cortes.

“É de lamentar o que aconteceu nos últimos dois meses. Tive desconto de mais de 50% do salário mesmo não fazendo parte da lista dos colegas que tiveram ordenados duplicados no ano passado. Esta situação condiciona de alguma forma as nossas vidas porque temos contas por pagar. Estamos a ser vulgarizados, mas não temos como fazer greve. O próprio Governo sabe de antemão que os polícias têm um salário magro e que quando chega o final do mês andam com dores de cabeça. Juramos combater o crime e manter a ordem e tranquilidade, porém nestas condições torna-se difícil trabalhar”, rematou.

Comando Geral diz que os agentes sabem os porquê estão a ser descontados

Por sua vez, Catarina Joaquim legitimou os cortes que foi alvo nos últimos dois meses, uma vez entre Junho e Agostinho teve o salário duplicado. No entanto, adverte que ao invés de uma percentagem que supera os 50%, o Executivo devia cortar entre 20% e 30% para não lesar os membros da corporação.

“Faço parte dos agentes que tiveram os salários duplicados, por isso o corte é legítimo. Contudo, tenho que lamentar os moldes do mesmo, visto que cortaram mais da metade do vencimento. Na minha opinião, para não condicionar a vida dos membros da corporação, os cortes deviam variar entre 20% e 30%. Lamento a situação dos colegas que sofreram cortes mesmo não tendo recebido vencimentos duplicados. Infelizmente, até Agosto irei sofrer cortes”, disse a fonte.

Contactada pelo Evidências para falar da situação que inquieta os seus membros, o porta-voz do Comando Geral da Polícia da República de Moçambique, Orlando Mudumane, foi parco nas palavras, tendo apenas se limitado a dizer que os agentes sabem os porquês de serem descontados salários. “Não temos nada para falar, pessoas sabem porque foram cortadas”, disse Mudumane.

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