Como o consulado de Nyusi arrisca terminar sem legado? (Fim)

EDITORIAL

No dia sete (7) de Agosto de 2017, dois anos depois de assumir o poder, e dois meses antes de eclodir o terrorismo, o Presidente da República, Filipe Nyusi, encontra-se com o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, na serra da Gorongosa, no centro do país, num encontro durante o qual discutiram sobre os passos a serem dados no processo de paz que serviu de semente para o acordo da Paz Definitiva, em Agosto de 2019, já com Oussufo Momade.

 

É esta a conquista da década no consulado de Nyusi que configura o seu legado. Nesta senda, foi capaz de impelir todas as ameaças que se apresentaram para este processo, como bem se viu ao acabar com a junta militar, mas uma nódoa manteve-se no pacote relativo ao DDR, que é Desmilitarização, Desmobilização e Reintegração dos guerrilheiros residuais da Renamo, devido a problemas de natureza administrativa, resumidos na falta de pagamentos aos integrantes do processo.

 

De forma geral, não apenas acabou com a política das armas, mas reduziu politicamente a dimensão da Renamo, transformando esta numa conquista mais partidária (menos oposição à uma Frelimo em crise) do que numa conquista do Estado. É que a nível do Estado, ao mesmo tempo que calavam as armas no Centro do País, em Cabo Delgado o cenário era outro. É dois meses antes de descer às matas de Gorongosa que a insurgência inicia em Cabo Delgado.

 

Apesar de uma narrativa triunfalista, o executivo fracassa no combate ao terrorismo. Tudo foi válido para reduzir a dimensão política da Renamo, mas o mesmo não é válido quando o tema são os terroristas. Seguramente que o tempo irá se encarregar de mostrar que, de facto, Nyusi garantiu que não seja mais necessário o uso de armas para fazer política. A Frelimo deve-lhe uma “estátua” por isso.

 

Ainda neste capítulo de calar das armas a nível político, não lhe merece o título de timoneiro da paz por não ter sido capaz de garantir a estabilidade em Cabo Delgado. Um fracasso que é arredondando quando analisado a sua administração num todo, como bem ilustramos na primeira parte deste editorial (edição passada/ 26).

 

Fora do fracasso administrativo nos sectores nas reformas conduzidas, é dos executivos que mais balizou todos os poderes do Estado, e a todos os níveis. É impossível conceber até em Estados ditatoriais como, por exemplo, um ministro que se beneficiou de pagamentos de uma empresa pública segue imune, como se nada de grave tivesse acontecido, como bem documentamos no manchete deste jornal, no caso do ministro Mateus Magala.

 

Até que ponto a integridade passou a ser preterida e normalizou-se a incompetência, o roubo, a negligência e todos os valores que devem nortear o sentido de bem-servir. Agora faz-se sem pudor e nem máscara. As reformas fracassadas nas empresas públicas são consequência da busca de mudança dos beneficiários nos proveitos e não do esforço de torná-las eficientes e produtivas.

 

É nesta senda que enquanto houver dificuldades de apontar os feitos deste consulado, enquanto for necessário esforço para apontar os bons exemplos e não precisar de nenhum exercício cerebral para apontar os péssimos feitos, a conclusão que se pode chegar é que o actual consulado é a todos os níveis o pior que o país já teve.

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