Ibrahim Traoré, Bassirou Faye e a 3ª Revolução Africana _ Parte 3

OPINIÃO

Felisberto S. Botão

Os pilares da 3ª revolução africana – Cont. 1

Dando continuidade aos pilares, referimos no artigo passado que deve apelar-se a todos os jovens revolucionários, os que já tomaram o poder, assim como os potencias como são os casos do Venâncio Mondlane, de Moçambique, e Julius Malema, da África do Sul, que se não construírem os seus alicerces fora do sistema vigente, não têm como escapar a manipulação, e depois de 10 anos, vamos perceber que são os colonos de novo a mandar.

Os sistemas estabelecidos como o financeiro, bancário, democrático, fiscal, comercial, normalização e outros que lhe possam ocorrer, são criações do bloco ocidental, e só eles possuem o PUK, fazendo com que você, volta e meia, tenha que recorrer a eles para o desbloqueio quando enfrenta problemas.

Repito, África não precisa mais do que 5 anos para mudar a sua situação de pobreza, e converter-se em nações prósperas com um padrão social alto para todo o seu povo, se retirar a influência ocidental dos seus recursos e da sua política. Mesmo nas condições actuais, se os líderes africanos não levassem dinheiro público para si, e exportassem para as “suas terras” na europa, há dinheiro suficiente para um desenvolvimento e crescimento económico razoável, e pelo menos dar comida, água potável e saneamento para toda gente.

Os pilares, que devem ser tomados em conta nesta 3ª revolução africana, para evitarmos erros do passado:

  1. Conteúdo local

Nós ficamos com a falsa sensação de inclusão, mas nunca nos sentimos preparados para fazer parte, pois as regras são actualizadas constantemente, sem a nossa participação efectiva, e informam-nos quando os outros já estão a jogar. O jogo vai decorrendo, e nós a preparar-nos para “apanhar” as regras do jogo, sentindo-nos estúpidos, e a culpar-nos uns aos outros por não estarmos a aprender rápido o suficiente, sem questionarmos as regras do jogo.

Encontrei uma passagem num texto da Trinidade e Tobaco, com relação a esta matéria, que diz, “a abordagem tradicional de dar preferência a fornecedores locais “se” o custo, qualidade e pontualidade na entrega de seus bens e/ou serviços forem iguais em qualidade, ao concorrente internacional, não nos ajudou a construir capacidade local, pois somente aqueles que já são globalmente competitivos terão sucesso. Não há oportunidade de se tornar competitivo se o operador local não lhe for dado a chance de fazer, aprender e melhorar. Por esta razão desenvolvimento de capacidade local será uma parte importante da estratégia de implementação do Conteúdo Local”.

O “concorrente internacional” é inevitavelmente um integrante dos “clusters” do homem branco, que já tem acesso as regras do jogo com antecedência suficiente para se preparar, que aqui na nossa terra ganham o nome de “empresa registada em Moçambique”.

Atribuição de contratos para locais não é uma questão de mercado aberto ou capacidade, é uma questão de protecção do interesse nacional. Esta é a verdadeira soberania.

  1. Retoma de posse da terra e dos recursos naturais

O povo não precisa do governo para subsistir, se este implementar políticas correctas e constituir-se de oficiais públicos honestos e com consciência de nação.

A terra onde se extrai ouro, carvão, urânio, petróleo, gás, grafiti, rubis e outras riquezas, pertencem ao povo nativo africano. Os recursos que estão a ser extraídos são seus, e por conta disso, eles deverão ser os primeiros beneficiários dos rendimentos gerados por estes recursos. Entenda-se rendimentos permanentes nas mãos de pessoas individuais, e não uma indemnização para abandonar a sua terra, como se validássemos que “você não merece a riqueza”, ou ainda de fundos comunitários que acabam nas mãos de dirigentes corruptos. Os nativos devem participar na estrutura acionista e nunca devem perder a posse das suas terras.

Para que esta redistribuição da riqueza seja possível, a europa deve ser retirada do controle dos nossos recursos, mesmo que seja de forma indirecta como muitas vezes o fazem. O europeu acredita que dando acesso a receitas dos recursos ao africano vai empoderá-lo, e aí aumentar a sua capacidade de consumo de recursos, o que vai perigar a disponibilidade destes recursos para o seu povo na europa.

O sistema europeu de estado, foi desenhado para roubar dos povos, ou seja, o estado materializa a legalização de roubo das massas por um grupo de certa elite. Enquanto África continuar a adoptar este modelo, não tem como evitar roubar do seu próprio povo. O estado deve administrar a terra, e não a tomar.

Renegociar todos os contratos da indústria extractiva, onde as empresas estatais como a ENH em Moçambique, tomam a responsabilidade e titularidade nos negócios. Os investidores estrangeiros devem ser transformados em parceiros de investimento, onde a busca de financiamento no sistema financeiro é tomada conjuntamente, pela ENH e pelo investidor externo, onde o recurso em si entra como colateral para o ENH. O investidor estrangeiro é que precisa de outros activos para usar como colaterais na banca internacional. Isso permitiria que os estados africanos aumentassem a sua participação para pelo menos 40%, deixando 5% para a comunidade local, com a sua integração directa na estrutura societária do investimento, outros 5% para o resto de cidadãos moçambicanos, através da bolsa de valores, e os restantes 50% para os diversos investidores externos.

Os países devem conservar minerais físicos, em suas reservas, como o Zimbabué está a fazer, e muito bem. Nunca houve um momento melhor para quem detém recursos minerais, e nós temos em abundância.

  1. Desenvolvimento de infraestruturas

Os projectos de infraestrutura como as do gás, que são modelos novos para nós, precisam que os moçambicanos se associem em “clusters” para criar capacidade e escala. O associativismo empresarial é crucial para materializar isso, se não se perderem nas lutas de aspiração política.

Nós gastamos rios de dinheiro a tentar modernizar as cidades coloniais, as redes ferroviárias coloniais, as redes rodoviárias coloniais, as redes de telecomunicação coloniais, enfim, não conseguimos nos libertar das rotas do colono, é como se quiséssemos nos sentir “o colono“, desesperadamente.

Todo desenho que o colono fez, desde as fronteiras, as redes viárias, as cidades, foi com o intuito de explorar e exportar matéria prima, e criar turismo exótico para o capitalista da metrópole – europa. Como nós pensamos libertar o nosso povo, e desenvolve-lo, se estamos a seguir a mesma agenda do colono? E a agenda do colono não era desenvolver nosso povo e nossa terra, mas sim o seu povo e sua terra. É o que nós continuamos a fazer até hoje, ao exportar matéria prima para o ocidente, dando suporte a sua indústria e criando empregos por lá, e não entendemos como não estamos a desenvolver-nos depois de 50 anos de independência.

Vamos construir cidades e vilas mineiras em todos os centros de extração mineira importantes, que serão cidades francas. Com este novo mapeamento administrativo, vamos desenhar novas redes viárias, que serão movidas pelas indústrias de transformação dos recursos extraídos. A condição primária para a concessão de extração de recursos a investidores externos deve ser a montagem de indústrias de transformação mínima no local. O desenvolvimento de infraestruturas para a nova rede administrativa, desde banca, vias de comunicação, telecomunicações, etc., será possível com o financiamento vindo do controlo dos nossos recursos, começando por estabelecer indústrias de tudo o que se extrai, e cancelar contratos daqueles que recusarem investir na indústria local, para transformar pelo menos 10% do recurso extraído.

Fazer a transferência de tecnologia do investidor externo para o nacional, uma exigência contractual das concessões, e usar empresas locais em todo processo, com pelo menos 60% do valor dos contratos atribuídos a si. Este movimento de infraestruturas vai demandar consumo de nossos próprios recursos, que vai passar esta febre de dependência do ocidente em comprar de nós. O ocidente tem 1/3 da nossa população, portanto, nós precisamos criar capacidade de compra no nosso povo, que será possível pela correcta distribuição de receitas dos recursos pelo nosso povo, e correcta implementação do Conteúdo Local. E junto vamos cultivar novos hábitos de consumo no povo, promovendo nova moda, nova culinária, nova prosperidade com posse de objectos de adorno e arte, e criar bolsas de valorização destes objectos, etc. Um renascimento da civilização africana, como sempre soubemos fazer.

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