Boeing recusa dar OK ao Cargueiro da LAM para voar

DESTAQUE POLÍTICA
  • Companhia não aprova alterações feitas ao avião de carga anunciado com pompas
  • Está a cinco meses sem voar e a pagar mensalmente USD 93 mil e agora deve ser devolvido
  • Há mais três aeronaves paradas (Q400) a pagar aluguer, enquanto servem de sucata de peça
  • Trabalhadores levaram os problemas da companhia a Magala, mas este não foi cordial
  • Ministro só lhes recebeu depois de ameaça de paralisação dos serviços, no dia 29 de Abril

À margem do fim do mandato da atual gestão, liderada por Theuns Crous, director geral da LAM e dono da Fly Modern Ark (FMA), os trabalhadores da Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) retratam uma gestão abusiva que vem empurrando a empresa para “o abismo”. O estranho foi a postura do ministro de Transporte e Comunicações, Mateus Magala, que vinha recusando reunir-se com a classe trabalhadora, a mesma que se reuniu para indicação da FMA. Na terça-feira (23), decidiram agendar uma greve geral para dia 29. De imediato, o ministro mostrou disponibilidade e reuniu-se, dois dias depois, apenas com a direcção do Comité Sindical da LAM, que entregou nas suas mãos um dossier com parte dos problemas da empresa. O balanço não deixou dúvidas que a LAM está a viver os seus piores momentos e o ministro, apesar de fortes episódios que sugeriam falta de cordialidade no decurso da reunião, mostrou surpresa quando foi apresentado a imagem real da empresa. Longe do braço de ferro entre a direcção da LAM e CS, a Boeing endereçou uma carta à LAM, na qual recusa dar manuais (autorização) para o avião, apresentado com pompas e circunstâncias para transporte de carga, por ter sofrido alterações sem consentimento desta.

A Boeing mandou a LAM solicitar os manuais da aeronave na empresa fornecedora da mesma, que procedeu com as modificações. Mas esta não tem e não se vislumbra qualquer outro caminho senão a devolução da aeronave, cinco meses depois de alugada, a pagar 93 mil dólares mensais, o que resultou num enorme prejuízo para a empresa.

Feitas as contas, a LAM já pagou pelo aluguer de um avião que não voa, cerca de 455 mil dólares, qualquer coisa como 29.120 000,00 meticais.

A Boeing não é a única a dar uma carta de incompetência à gestão da LAM, se as próprias contas da LAM não escondem que a empresa não tem condições de se manter na configuração actual, com gráfico de dívidas aos fornecedores cada vez mais crescentes e estes a reclamarem falta de pagamento, como é o caso da EuroAtlantic, a colocar incerteza para o próximo voo de Lisboa – Maputo (02), devido uma dívida de quase dois milhões (1700 000) de euros.

Além de dívidas, a estrutura pesada de contas por pagar é enorme. Se a empresa está a pagar até aviões que não voam, como é o caso do Q400 e o cargueiro, deve pagar igualmente as aeronaves alugadas ao regime de ACMI (Aeronave, Tripulação, Manutenção e Seguro, em português). Há mais duas aeronaves, E-145 operadas pela MEX, estacionadas por falta de manutenção.

Se não são os problemas a falar por si, internamente são os trabalhadores a mostrarem um quadro de descontrolo, com certas decisões a sugerirem total desconhecimento de procedimentos de aviação, com movimentação regular de quadros.

Chantagem levou Magala a aceitar reunir com trabalhadores da LAM

Na terça-feira da semana passada, o Sindicato dos Trabalhadores da LAM convocou uma reunião para discutir os problemas da empresa de forma aberta, depois de, por várias vezes, solicitar uma reunião com o ministro e nunca serem atendidos.

Foi decidido naquela terça-feira (23), numa reunião onde participaram mais de 200 trabalhadores, que no dia seguinte deviam seguir todos os procedimentos legais para uma greve geral no dia 29 de Abril. De imediato, Magala, que se recusava a ouvir os trabalhadores, solicitou reunir-se com os representantes do Sindicato da Empresa, que no dia da reunião (25), depois de lhes acusar de agitar os demais colegas, num tom de intimidação, aceitou ouvir suas inquietações. No fim, os trabalhadores entregaram um dossier ao ministro.

A lista de problemas é intensa, mas começa por traçar um quadro que representa perigo para os passageiros. É que segundo lê-se no documento que o Evidências teve acesso, a Segurança e o Conforto do passageiro, apesar de não serem negociáveis na aviação, “a cada dia que passa a degradação dos níveis de segurança e conforto baixam, e somos constantemente questionados pelos nossos clientes, a quem habituamos aos mais altos níveis de Segurança e Conforto”.

Os dados já na posse do ministro mostraram que a implementação do plano para a revitalização das LAM, segundo discursos e pressupostos anunciados pela FMA e o próprio Governo, entram em contrassenso com as práticas que se vêem implementadas no quotidiano.

É que, de acordo com estes, nos últimos tempos têm sido surpreendidos com certas decisões e pronunciamentos dirigidos pela Direcção Geral (DG), Theunis Crous, que têm gerado consternação e preocupação entre os membros destas classes sobre a segurança e o futuro da LAM.

Na compreensão do Comité Sindical, no sector da aviação comercial, a rigidez no cumprimento das leis e regulamentos é de carácter imperativo, uma vez que as consequências do não cumprimento podem, não só, causar danos materiais com efeitos devastadores para a sobrevivência da empresa, assim como também danos humanos.

“Inquieta-nos o facto de certas medidas tomadas estarem em desacordo com alguns preceitos Legais e de Segurança de vôo”, le-se no documento entregue a Magala.

A falta de vários itens básicos para o serviço a bordo gera, não só, inconvenientes aos clientes, mas também ao serviço a bordo. De acordo com o CS, foi tomada a decisão de retirar itens que considera essenciais ao serviço e ao conforto a bordo sem prévio aviso, criando situações desconfortáveis no serviço a bordo, tendo algumas vezes a tripulação ouvido termos de perjúrio dos seus clientes, uma vez que a empresa diminuiu a qualidade dos serviços, porém não informou aos clientes.

É igualmente questionada a promessa de aumento da frota de aeronaves que nunca foi concretizada e as práticas mostram que a prioridade é para a operação ACMI. A redução na capacidade de resposta às exigências de mercado, retirando aeronaves B737 e Q400 em detrimento de aeronaves Bombardier CRJ9, com menor capacidade e com custos de operação questionáveis devido às condições específicas que existem em alguns destinos cruciais na operação das LAM.

“Verifica-se uma maior frequência e preferência para os vôos de aeronaves alugadas em ACMI. Este factor, aliado ao incumprimento do plano apresentado pela FMA em 2023 que incluía a vinda de aeronaves com matrícula nacional e capacitação de técnicos nacionais, não só atrasa como em parte inviabiliza a progressão de carreira dos técnicos nacionais, sem falar nos danos financeiros que possam estar associados a esta prática”, dizem.

No documento, lê-se ainda que “as ameaças e acusações verbais de sabotagem por parte do Director Geral e do Director de Operações mostram-se também preocupantes, uma vez que realçam ainda mais a desconexão total entre estes e os demais trabalhadores da área técnica, não apenas por mancharem a reputação da classe técnico-operacional no activo, mas também por gerarem um ambiente de trabalho hostil e desmotivador”.

Facebook Comments