- Existem 22 mil presos para apenas 9 mil camas
- País tem uma superlotação nas cadeias na ordem de 145,8%
- PGR pede recursos financeiros para a reabilitação dos estabelecimentos penitenciários
- Persiste o défice na intervenção do IPAJ nos processos de concessão de liberdade condicional
Em Moçambique, a superlotação dos estabelecimentos penitenciários viola os direitos dos reclusos, visto que coloca em causa a dignidade do encarcerado enquanto pessoa. De acordo com a Procuradora-Geral da Repulsiva, Beatriz Buchili, até 31 de Dezembro de 2023, os estabelecimentos penitenciários do país albergavam 21.814 reclusos, para uma capacidade de internamento estimada em 8.873 leitos, o que representa uma superlotação na ordem de 145,8%. A PGR lamenta o facto de persistir o défice na intervenção dos técnicos do IPAJ nos processos de concessão de liberdade condicional, o que podia contribuir para dar vazão às cadeias.
Duarte Sitoe
Os direitos e garantias fundamentais dos detidos estão assegurados na Constituição da República de Moçambique, uma vez que, não obstante a sua condição, quer detidos, quer presos, são, também, cidadãos como todos os outros e, por outro lado, ser detido, arguido ou mesmo preso é algo que pode acontecer com qualquer pessoa, sendo que a vida em sociedade encerra sempre a susceptibilidade de se cometerem falhas.
Aquele instrumento defende que, independentemente do crime cometido, a prisão ou detenção não deve e nem pode violar os direitos dos reclusos, apontando para superlotação dos estabelecimentos prisionais como violação de alguns dos direitos dos reclusos.
Nos Informes Anuais de 2018 a 2022, a Procuradora-Geral da República referiu que os estabelecimentos penitenciários apresentavam ocupação acima da capacidade instalada, degradação acentuada dos edifícios e deficiente saneamento, situação que compromete os programas de reabilitação, reinserção social e propiciam a prática de crimes, dentro e fora dos mesmos, para além da violação dos direitos humanos.
Relativamente ao ano passado, Beatriz Buchili destacou que, apesar dos esforços empreendidos pelo Executivo, a situação de superlotação persiste no grosso dos estabelecimentos penitenciários do país.
“A situação da superlotação persiste, apesar de alguns esforços que vêm sendo empreendidos na requalificação e ampliação de alguns estabelecimentos penitenciários. Dados do Serviço Nacional Penitenciário revelam que, no dia 31 de Dezembro de 2023, os estabelecimentos penitenciários do país albergavam 21.814 reclusos, para uma capacidade de internamento estimada em 8.873 leitos, o que representa uma superlotação na ordem de 145,8%”, referiu
Persiste o défice na intervenção dos técnicos do IPAJ nos processos de concessão de liberdade condicional
Com vista a descongestionar os estabelecimentos prisionais, a Procuradora-Geral da República defende que o Governo deve alocar fundos para a reabilitação das mesmas, tendo dado o exemplo da iniciativa presidencial “Um distrito, um estabelecimento penitenciário”.
“Reiteramos, por isso, a prioridade que deve ser dada a este sector na alocação de recursos financeiros para a construção e reabilitação de estabelecimentos penitenciários. A par das acções de reabilitação e requalificação dos estabelecimentos, a execução da iniciativa um distrito um estabelecimento penitenciário mostra-se pertinente, pois para além de contribuir para a redução dos níveis da superlotação, garante o respeito pelos direitos das pessoas privadas da liberdade”.
A promoção da aplicação de penas alternativas à pena de prisão, nomeadamente penas de multa e de trabalho socialmente útil, reforço da articulação com o sector do controlo penal e os tribunais, com vista a imprimir celeridade na tramitação dos processos, especialmente, os de liberdade condicional e de execução de penas de trabalho socialmente útil constam do rol das iniciativas do Ministério Público para reduzir o número dos reclusos nas cadeias.
Em 2023, tal como nos anos anteriores, a Procuradoria-Geral da República visitou alguns estabelecimentos penitenciários e constatou melhorias na assistência médica e medicamentosa, nas actividades de ensino e formação técnico profissional, bem como na participação dos reclusos em actividades ocupacionais.
No entanto, a PGR observou que na “maioria dos estabelecimentos penitenciários persiste o défice de intervenção dos técnicos do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ), para acompanhamento processual dos internos, com reflexos negativos, por exemplo, nos processos de concessão de liberdade condicional, na interposição e acompanhamento de seus processos em recurso, observância dos prazos de prisão preventiva e contacto com as famílias”.
No que diz respeito à intervenção processual dos magistrados, Beatriz referiu que a instituição por si dirigida constatou uma reduzida aplicação das penas alternativas à pena de prisão, bem como fraco controlo dos condenados às penas alternativas e dos que se encontram em liberdade condicional.
Um outro aspecto que continua a preocupar a Procuradoria-geral da República é o facto de alguns estabelecimentos penitenciários estarem localizados nos centros urbanos, próximos de áreas residenciais, instituições públicas e privadas, incluindo escolas primárias, com todas as consequências que poderão advir, em termos de segurança pública, daí que pede uma reflexão conjunta sobre as medidas urgentes a adoptar para fazer face a esta situação, enquanto não forem concretizadas soluções estruturantes.
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