Daniel Chapo negou viajar com Nyusi ao Ruanda

DESTAQUE POLÍTICA
  • Candidato recusou ser baptizado em Kigali
  • Postura do candidato pode significar desconforto da Frelimo sobre a relação com o Ruanda
  • Nyusi encontrou-se com Kagame e o CEO da Total para discutir segurança e negócios em C. Delgado
  • Total sempre negou relações com o exército Ruandês, mas o encontro em Kigali pode revelar proximidade
  • Nyusi passa certificado de incompetência às FDS e anuncia mais forças ruandesas a partir de Kigali

O recém-eleito candidato da Frelimo para as eleições de 09 de Outubro, Daniel Chapo, alegou estar ocupado com a pré-campanha para não se juntar ao Presidente da República, Filipe Nyusi, na sua recente deslocação ao Ruanda, país que acolheu o Africa CEO Forum, evento que juntou importantes players do sector empresarial em África, com destaque para o CEO da Total Energies, um actor-chave com quem Chapo, se for eleito em Outubro, deverá discutir os próximos passos daquele que é o maior investimento directo estrangeiro em África.

O Presidente da República, Filipe Nyusi, terminou, na passada sexta-feira, mais uma visita de trabalho de três dias ao Ruanda para o reforço da “cooperação bilateral”. No entanto, aproveitou a ocasião para participar do Africa CEO Forum ao lado do homólogo, Paul Kagame, e do CEO da francesa TotalEnergies, Patrick Pouyanné, num encontro tripartido inédito entre os principais actores em Cabo Delgado.

Para uma espécie de iniciação aos principais players continentais, mas sobretudo ao “amigo” Paul Kagame e ao CEO da empresa que se prepara para fazer o maior investimento de sempre no país, estava previsto que seguisse na delegação, o candidato recentemente eleito, para uma espécie de baptismo em Kigali.

Embora a princípio configure uma situação de conflito de interesse, é comum, em períodos de preparação de transição política, o candidato da Frelimo viajar com o Presidente da República para fora do país e não só para apresenta-lo.

Era o que devia ter acontecido semana passada, em que Daniel Chapo devia ter seguido viagem para Kigali para se iniciar nos corredores diplomático e do lobby industrial internacional. No entanto, depois de gerir o convite durante dias, à última hora, o candidato que agora é secretário-geral interino alegou estar com agenda apertada com a pré-campanha para não embarcar.

Muito provavelmente, em Kigali, Chapo iria ser apresentado ao CEO da Total Energies para iniciar os primeiros contactos com um actor que poderá ser chave para a economia moçambicana, com quem deverá dialogar de forma permanente caso venha a ser eleito Presidente da República.

Igualmente, iria, certamente, ser apresentado ao Presidente do Ruanda, Paul Kagame, uma figura muito polémica no panorama internacional e que trava nos últimos anos uma amizade pessoal com Filipe Nyusi, o que culminou com o envio de tropas daquele país a Moçambique, num negócio que envolve supostos pagamentos por parte da multinacional francesa, que, entretanto, nunca assumiu.

É justamente, a temática da continuidade das tropas ruandesas em Moçambique, numa vantajosa mas secreta troca que envolve negócios rentáveis para empresas ruandesas nos sectores de obras, segurança e mineração, onde se destacam firmas ligadas à Frente Patriótica, partido no poder no Ruanda e empresas do seu sector castrense.

Mas o assunto do empenhamento de tropas ruandesas e as contrapartidas daí resultantes sempre foram um assunto sensível e que divide opiniões dentro da própria Frelimo, razão pela qual aventa-se a possibilidade de Daniel Chapo ter sido aconselhado a não viajar a Kigali a saldo de uma relação cujos contornos são nebulosos e que um dia podem ser alvo de algum escrutínio no futuro.

Prova disso é que no período em que Chapo alegou estar focado na pré-campanha não teve uma grande actividade de realce, tirando um encontro com artistas moçambicanos.

A petrolífera francesa suspendeu actividades em 2021, devido aos ataques de grupos insurgentes, no epicentro do megaprojeto de gás natural em Palma, Cabo Delgado, e, como tal, a Total Energies pode estar à espera do novo interlocutor (Chapo, se for eleito em Outubro) para tomar a decisão de retorno ou não. De igual modo, as outras multinacionais só poderão tomar a decisão final de investimento.

Nyusi passa certificado de incompetência às FDS e anuncia mais forças ruandesas a partir de Kigali

A missão das tropas ruandesas em Moçambique vai permanecer por tempo indeterminado no território nacional e a partir de agora desconhece-se o número real do seu contingente. A última contagem, há cerca de dois anos, apontava para pelo menos 2500 homens.

Como se tal não bastasse, desconhecem-se os contornos do acordo entre os dois países e nunca esteve claro quais são as contrapartidas para o Ruanda, que gasta milhões para manter a sua força em Moçambique desde 2021.

Entretanto, quando se pensava que finalmente o exército e polícia moçambicanos iriam assumir as posições deixadas pelas tropas da SAMIM, eis que num simbólico acto de declaração de incapacidade da sua tropa o Comandante em Chefe das Forças de Defesa e Segurança decidiu passar um certificado de incompetência às FDS, chamando mais contingente ruandês para assumir as posições que eram antes da SAMIM.

O anúncio oficial por parte de Moçambique aconteceu um mês depois do Ruanda ter comunicado, e veio da boca do Presidente Nyusi, a partir de Kigali. Na sua comunicação, não especificou o número do contingente e desvalorizou toda a crítica. No entanto, assumiu que o novo Contingente vai ser empenhado em Macomia, curiosamente, uma posição deixada pela SAMIM.

“Esta semana está a desembarcar mais contingente, não para trocar [revezar os militares], mas para acrescentar fluxo. E isso sobretudo por causa da saída da SAMIM e quando sair definitivamente da zona de Macomia vamos ocupar. Não porque Moçambique não pode (defender-se), mas não se combate terrorismo só. Mas a responsabilidade maior é dos moçambicanos”, declarou Nyusi, depois de ter reunido com Kagome e o CEO da TotalEnergies, Patrick Pouyanné.

Recorde-se que a Total Energies sempre negou estar a financiar a missão quase que mercenária das tropas ruandesas que combatem em Cabo Delgado e garantem exclusivamente a segurança do canteiro de obras da multinacional. No entanto, vários estudos de inteligência mostram contornos de pagamentos, incluindo através de contratos diversos para empresas ruandesas nas áreas de construção, segurança e logística.

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