Dados revelados pelo Tribunal Supremo apontam que, entre Janeiro de 2020 e Junho de 2024 em curso, foram julgados em todo território nacional mais de 14.200 processos relacionados com casos de violência doméstica. Esta situação preocupa sobremaneira o sector judiciário, daí que os Juízes pedem abrigos para vítimas violência doméstica para evitar que as mesmas continuem a partilhar o mesmo tecto com os agressores.
Em Moçambique, poucos são os abrigos, sejam eles permanentes ou transitórios, para as vítimas de violência doméstica, por isso, o tema foi, na última semana, analisado pelo Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, através do Centro de Formação Jurídica e Judiciária, em colaboração com outras instituições e organizações ligadas à Administração da Justiça e parceiros de cooperação
Durante o encontro, visando contornar o actual cenário em que em caso de submeterem queixas contra os agressores as sobreviventes são martirizadas na família e na sociedade, os Juízes pedem a construção de abrigos para as vítimas de casos de violência doméstica.
“Porque nós ainda não temos isto previsto na lei, em termos específicos. Como é que vamos proteger esta vítima? Para onde encaminhamos esta vítima? Não há sítios para encaminhar as vítimas. Então, com a construção destas redes de apoio, é possível termos sítios concretos onde o magistrado saiba que olha ou o procurador, ou na esquadra, encaminhem a vítima para um sítio concreto onde ela vai ficar até ao dia do julgamento e, depois do julgamento, vê-se”, disse Deise Lobo, vice-presidente do Fórum Nacional de Magistrados Judiciais e do Ministério Público para depois lamentar o facto de algumas mulheres desistirem dos processos mesmos depois de apresentarem queixas contra os agressores.
“Desde que elas apresentam a queixa até ao dia do julgamento, muitas das vezes elas continuam na mesma casa que o agressor. Há vezes em que vêm ao julgamento com o agressor. Saíram os dois da mesma casa para o julgamento. Nós não sabemos de que forma ele intimidou a ela. Não sabemos se ele persuadiu a ela a desistir. Então, era nesse sentido que eu falava de protecção à vítima”, afirma Lobo, para quem “é necessário, por vezes, retirar a vítima daquele ambiente de agressão para que ela tenha mais independência quando vai fundamentar o quê que lhe aconteceu e até ficar firme naquilo que é a punição para o agressor”.
Por sua vez, a sociedade civil, representada por Quitéria Guirengane, mostrou-se preocupada com os elevados índices de violência contra a mulher e crianças.
“Grave sob o ponto de vista que ela tem danos bastante profundos até sobre o nosso sistema económico, a nossa economia perde muito quando nós temos que 80 por cento da nossa economia é assegurada por mulheres, e quando olhamos para a escala de violência doméstica, para as taxas de violência doméstica, percebemos que a mulher é a maior vítima”, afirmou Quitéria Guirengane, ativista social e secretária executiva do Observatório das Mulheres, citada pela Voz da América.
Prosseguindo, Guirengane referiu que os estereótipos fazem com que muitas mulheres continuem a sofrem no silêncio ao invés de denunciar.
“Encontram estereótipos de género quando voltam à família e comunicam que meteram a queixa e começam a ser diabolizadas, perseguidas, atacadas em função de um direito que elas estão a salvaguardar”.
Facebook Comments