Arão Valoi
A inclusão financeira é um tema vital quando se fala de desenvolvimento económico sustentável de qualquer país. Em Moçambique, esta questão revela-se, particularmente, complexa, afectando de forma diferenciada as comunidades, a nível rural e urbano. Apesar de alguns avanços que o País registou nos últimos anos, muitos desafios ainda persistem no que se refere a serviços financeiros contínuos e de qualidade. Os obstáculos à inclusão financeira incluem a fraca penetração bancária, fraca alfabetização financeira, desconfiança em relação às instituições financeiras, altos custos e ou taxas cobradas pela prestação de serviços, infraestrutura limitada, entre outros. Não sendo especialista neste assunto, pretendo, neste artigo, manifestar a minha frustração em relação à exclusão financeira que as populações que vivem nos arredores da cidade de Maputo têm sido alvo. Nestas regiões, a fraca penetração dos bancos alia-se à infraestrutura limitada, fazendo com as populações enfrentem dificuldades de aceder aos serviços financeiros básicos, tais como levantamento e depósito de valores. Nos bairros suburbanos de Maputo, a presença de caixas automáticas, vulgo ATM’s, sempre foi um pequeno, mas significativo símbolo de acesso não só ao dinheiro, mas também à modernidade. No entanto, depois de um “boom” de máquinas de bancos como Standard Bank, Millenium Bim, Moza Banco e BCI na periferia da cidade, um novo e estranho fenómeno desponta: a retirada das mesmas caixas por parte dos proprietários, o que desencadeia uma reflexão profundo sobre o que isso significa para as populações que moram nesses locais. Imagine um indivíduo que, no sábado, acorda pela manhã e dá conta que precisa de um valor para pagar um serviço qualquer. A partir do bairro Santa Isabel, onde mora, não encontra nenhuma solução, o que significa que terá de se deslocar para uma caixa que se situa a uns bons quilómetros da sua casa e quando lá chegar, a ATM estará, provavelmente, cheia, com risco de o dinheiro esgotar-se ou, o mais grave ainda, com serviços indisponíveis. A retirada das máquinas em muitos bairros transforma a rotina das pessoas num autêntico desafio, ou seja, a busca por um banco, muitas vezes distante e inacessível, não é apenas uma questão de tempo; é uma barreira que pode inviabilizar negócios, paralisar actividades urgentes e importantes, provocar mortes por falta de cuidados, entre outros. Muitas vezes, a justificativa dos bancos gira em torno de questões econômicas e de segurança. Manter uma ATM em áreas de baixa movimentação pode não ser rentável. O custo de manutenção e o risco de vandalismo ou roubo podem ser elevados. Contudo, essa lógica ignora a realidade da vida na periferia, onde a população depende intensamente desses serviços. Sem acesso fácil à transações financeiras, a vida fica complicada nessas regiões e as pessoas são obrigadas a viajar ao centro da cidade onde muitas ATM’s ficam ociosas, principalmente, durante os finais de semana. Com os crónicos problemas de congestionamento, as consequências que daí advém, vão muito além da frustração individual. De facto, esses desafios, aliados à instabilidade do sistema financeiro nacional, caracterizado por oscilações funcionais, muita gente é forçada a recorrer a soluções precárias que a mantém à margem do sistema financeiro e económico. Mas igualmente, a ausência de serviços bancários adequados nas zonas suburbanas sufoca o potencial de desenvolvimento econômico. Sem a possibilidade de realizar transações com facilidade, o empreendedorismo local murcha. A criatividade e a iniciativa que brotam dos jovens ficam sem espaço para florescer, aprisionadas em um ciclo de pobreza e exclusão. Mas também há uma responsabilidade colectiva, ou seja, das pessoas que vivem nessas regiões. Cuidar de algo que beneficia a colectividade é um chamamento de todos. Os assaltos e vandalizações que se têm verificado nas ATM’s deixa inquietações sérias sobre a segurança a nível dos bairros e faz com que a banca, cujo objectivo é a maximização do lucro, se retire dos locais considerados críticos do ponto de vista de segurança. Mas enquanto os bancos retiram as suas máquinas, surgem oportunidades para os outros: as tecnologias móveis emergem como uma solução viável. Aplicativos de pagamento e transferência como Mpesa, Mkesh, entre outros, têm o poder de transformar a forma como as comunidades interagem com o dinheiro. No entanto, a falta de educação financeira e de infraestrutura digital ainda representa um obstáculo significativo. A transição para essas novas tecnologias requer, não apenas a disponibilização de ferramentas, mas também um esforço conjunto para capacitar a população a utilizá-las.
Por fim, esta situação nos leva a questionar o papel das instituições financeiras num país em desenvolvimento. A responsabilidade social não pode ser uma mera frase de efeito; deve ser uma prática diária. Os bancos precisam de olhar para além do lucro imediato e reconhecer que o seu verdadeiro valor está em servir a todos, especialmente aqueles que mais precisam. Neste cenário, a retirada das ATM’s não é apenas uma decisão comercial; é uma chamada à acção. É um lembrete de que o verdadeiro progresso se mede pela inclusão, pela capacidade de conectar todas as camadas da sociedade ao sistema financeiro. Para que Moçambique possa construir um futuro mais justo e equitativo, é imprescindível que as instituições financeiras reavaliem as suas estratégias e considerem o impacto das suas decisões nas comunidades que atendem. Afinal, cada passo em direcção à inclusão financeira é um passo em direção ao desenvolvimento colectivo.
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