Todos estão à procura de uma saída para crise pós-eleitoral. Uma saída amistosa que garanta estabilidade para as partes beligerantes, que com ferro e fogo arrastam o Estado e as massas para as suas lutas, esticando os argumentos – que de fraude eleitoral evoluíram para todo o desgoverno da Frelimo – até que todos se identifiquem e se ergam para lutar sem questionar os meios.
No dia 23 de Dezembro é esperado que o Conselho Constitucional anuncie os resultados. Não haverá milagres. Tudo indica que a fraude está lá camuflada nos seus indícios. Um apenas deverá ser o vencedor, mas dois estão dispostos a provar que são legítimos vencedores sem olhar para os instrumentos de legitimidade. Um a provar a vitória através de números não consensuais e outro a mostrar as evidências da fraude do que provas sólidas da sua vitória. Ambas são vitórias por interpretação e dos ânimos de cada um.
Nada é coerente. As saídas sólidas não interessam nem ao PODEMOS e Venâncio Mondlane, nem a Frelimo/Governo, se estes não poderem tirar o beneficio delas. É o que tende a ficar mais evidente. Enquanto isso, o Conselho Constitucional vem definindo o seu roteiro que passa pelo cruzamento dos editais, um processo nada credível e que podia ser contornado pela recontagem, uma saída que é confortável para o PODEMOS, mas não sem porém. É que os kits em que supostamente estão depositadas as urnas das mais de 25 mil mesas estão a guarda dos mesmos órgãos eleitorais suspeitos de martelanço dos números. Mas mais grave do que isso, é que as eleições foram tão desorganizadas que os STAEs distritais não conseguiram garantir a segurança e inviolabilidade das urnas. Todos nós vimos e muitos devem estar lembrados de kits com urnas abandonados, sem nenhuma segurança nas escolas e outros locais pelos MMVs que exigiam pagamento de subsídios. São estes votos nas urnas que vão ser recontados? Quem nos garante que ainda continuam totalmente íntegros?
O curioso é que ninguém fala de anulação, os seus custos e vantagens/ desvantagens e como esta poderia restaurar o equilíbrio do voto – eleitor que se perdeu nesta eleição. Anular-se, formar novos órgãos eleitorais sem qualquer proveniência política devia constar na mesa.
Cogitar a saída da crise sem equacionar a anulação equivale assumir em absoluto que o importante são os arranjos que tragam a vitória sem olhar para a raiz do problema. Não se pode assumir legitimamente eleito um político que é produto de uma eleição fraudulenta não interessando se a mesma eleição beneficia a si ou ao outro, da mesma forma que não se deve assumir que a evidência de fraude é sinónima de evidência da vitória sobre aquele contra quem foi feita a fraude. Não estaremos a pensar no país a longo prazo se nos limitarmos nas saídas que são favoráveis a uma das partes sem olhar para legitimidade destes. É preciso que se lembre que é a legitimidade que confere confiança na relação entre o representante público e o representado. E, acima de tudo, que a crise pós-eleitoral é consequência dessa ausência de legitimidade dos representantes que ascendem ao poder por meios não ortodoxos, seja através da violência ou através de fraude. Sem legitimidade, não há confiança.
Assumir anulação das eleições como possível saída não significa necessariamente anula-las, mas reconhecer que delas, pela dimensão da fraude, torna-se difícil medir o nível de expressão/aceitação de cada um. Quando se ignora por completo uma possível saída nestes molde se está assumir que, afinal, os arranjos são aceitáveis, mas nos casos em que beneficiem este e não aquele. É a partir deste pensamento que perpetuamos o retrocesso. Manchamos uma luta que devia propor uma saída plena sem olhar para aquela saída proposta em 1992 para se sair da guerra civil, que afinal, apesar do legado de multipartidarismo, dividiu o país entre Renamo e Frelimo e esqueceu que Moçambique está além dos políticos e seus arranjos. É um país que estará sempre presente!