- Apesar de todos os pecados, Nyusi deixou nas mãos de Chapo a indicação do presidente AR
- Frelimo e PODEMOS inauguraram a X Legislatura sem a presença da Renamo e MDM
- Talapa promete trabalhar com as quatro bancadas para pacificar o País
- Ivandro Massingue perde humildade e chama de “ratos covardes” seus pares de oposição
A Comissão Política, reunida no último sábado (11), indicou Margarida Talapa para candidato à Assembleia da República, numa corrida onde, apesar de ter sido dominada pelas mulheres de terceira idade, foi cogitado o nome do Pedro Comissário. O Evidências apurou que, afinal, o Presidente da Frelimo, Filipe Nyusi, não influenciou este processo que foi dominado pelo secretário geral e presidente eleito. Contra todas as expectativas, a indicação de Talapa, que conhece bem a casa onde já foi chefe da Bancada parlamentar da Frelimo, veio levantar dúvidas sobre as promessas de que neste quinquénio a Frelimo contaria com maior contribuição de jovens para o País. Longe dos eventos do partido – Governo e das promessas destes, tomaram posse nesta segunda-feira os deputados da Frelimo e do Podemos, numa cerimónia que contou com boicote da Renamo e MDM. É nesta cerimónia, entre “o mais velho” e “mais novo” nas palavras de Forquilha, como que a sugerir uma relação de pai e filho, entre Frelimo e Podemos, em que Talapa foi confirmada presidente da AR para X legislatura. Enquanto na sala de plenária perfilavam para confirmar suas mordomias e regalias para este mandato, nalguns bairros das cidades de Maputo e Matola ouviam-se tiros. Um jovem foi assassinado pela UIR, em Malhampsene, enquanto em Temane, distrito de Inhassoro, as vítimas mortais das balas foram duas, às quais se juntam dezenas de feridos, naquele que foi o primeiro de uma paralisação de três dias.
Duarte Sitoe
Esta segunda-feira não foi um dia comum. Enquanto as ruas estavam caracterizadas de barricadas e pneus a arder, com a polícia a realizar disparos para dispersar manifestantes, a Assembleia da República era o lugar mais calmo e seguro. Decorria, à margem deste caos social, a solene cerimónia da investidura dos 171 deputados da Frelimo e 39 do PODEMOS (dos 43 eleitos). Não há clareza sobre os 04 que não tomaram posse e relata-se morte de dois deputados. Os 28 deputados e outros 08 do MDM boicotaram o processo, aliando-se ao Venâncio Mondlane que convocou manifestações de 13 a 15 de Janeiro, períodos que coincidem com a investidura dos deputados e do Presidente da República, eleitos nas eleições contestadas.
A cerimónia foi conduzida pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, que descreveu que o momento reflecte um crescimento qualitativo da jovem democracia moçambicana.
O Presidente da República reconheceu o papel dos partidos com assentos na Assembleia da República na 10ª Legislatura. No entanto, advertiu que o actual contexto social e político impõe a cada um dos empossados um espírito de trabalho conjunto para restabelecimento da ordem e tranquilidade.
“Neste momento histórico marcado por incertezas ao nível interno global, a Assembleia da República deve continuar a afirmar-se como principal plataforma de formação de consensos sobre as grandes questões da nação moçambicana”, observou o estadista, naquele que foi o seu último discurso no parlamento na qualidade do Chefe do Estado.
Adiante, afirmou que o actual contexto político no País, impõe a cada moçambicano o espírito de trabalho conjunto na restauração da ordem e da estabilidade numa base de solidariedade e reconciliação da família moçambicana. “Moçambique clama pela paz, pela concórdia e harmonia. Estas são as condições primárias para o alcance do desenvolvimento que todos almejamos e o povo moçambicano já deu provas de que é capaz de resolver conflitos através do diálogo construtivo, assento no respeito mútuo, confiança e tolerância”, declarou.
Nyusi lembrou que a X Legislatura inicia num ano em que Moçambique assinala os 50 anos da sua constituição em Estado independente e soberano, sendo que ao longo desses anos a sociedade moçambicana tem vindo a contribuir para a necessidade de reformas estruturais, organização e funcionamento do Estado, daí que entende os deputados da “Casa do Povo” devem urgentemente aprimorar o sistema político, tipo do Governo e Estado que os moçambicanos querem.
Olhando para as recomendações deixadas pelo Conselho Constitucional, observadores nacionais e internacionais sobre as Eleições Gerais, Legislativas e das Assembleias Provinciais, Nyusi defendeu que a AR deve adoptar reformas para reforçar a credibilidade das instituições do Estado e terminar com a manipulação eleitoral.
“Portanto, estamos a recomendar para que esta assembleia aprecie com máxima frieza, sem precipitação e sem emoções essas matérias e adopte o modelo eleitoral mais sustentável que inspire maior confiança nos cidadãos em relação aos órgãos eleitorais. Isto é para não corrermos o risco de explicar resultados que foram por causa de a, b e c. Isso acontece quando nós não interpretamos os processos devidamente. Os moçambicanos alimentam muita esperança de que a X Legislatura que acaba de ser investida irá adoptar reformas legislativas que reforcem a credibilidade das instituições do Estado Democratico e terminam com a manipulação política que muitas vezes termina em violência e no descrédito dos nossos processos eleitorais”.
A ascensão de Talapa em meio a promessas de mudança
Na cerimónia da tomada de posse dos deputados da Frelimo e do PODEMOS, Margarida Talapa, que no Governo de Nyusi era responsável pelo pelouro de Trabalho e Segurança Social, foi eleita presidente da Assembleia da República após golear os dois candidatos propostos pela formação política que suportou a candidatura presidencial de Venâncio Mondlane. Talapa foi indicada a concorrer à presidência da AR pela Comissão Política, que se reuniu no sábado onde, entre outras temáticas, marcou uma sessão extraordinária do Comité Central para 14 de Fevereiro.
Para o cargo, foram cogitadas nomes de Amélia Muendane, Ana Comoane, Pedro Comissário, Verónica Macamo, mas a sorte caiu sobre Margarida Talapa, num processo que ao contrário do que se especulava, não teve qualquer imposição de Filipe Nyusi, presidente da Frelimo, cuja presidência foi marcada por impor candidaturas únicas.
No primeiro discurso como presidente da “Casa do Povo”, Talapa garantiu que tudo fará para que o Parlamento continue digno representante de todos os moçambicanos.
“Temos consciência que estamos a assumir a presidência da Assembleia da República num momento particularmente desafiante, em que o povo de Rovuma ao Maputo, do Zumbo ao Índico e na diáspora, espera nessa casa outras formas de estar e de fazer para termos e mostrarmos resultados diferentes e com urgência. Neste momento solene, posso garantir que tudo faremos para que a Assembleia da República continue digna representante de todos moçambicanos que devem se orgulhar de serem filhos iguais desta pátria de heróis”, frisou.
Para além de debates para garantir consensos almejados pela sociedade moçambicana, a recém – empossada presidente da Assembleia da República prometeu trabalhar com todas forças vivas da sociedade para pacificar a sociedade onde há tolerância e cultura de paz.
“Prometemos oferecer a mais séria cooperação aos órgãos de soberania e instituições de Estado assentando nos princípios de separação e interdependência de poderes consagrados na Constituição e prometemos obediência à Constituição e demais leis. Como todos órgãos de soberania e instituições de Estado, vamos trabalhar com todas as forças vivas para pacificar a sociedade porque são os objectivos fundamentais do nosso Estado de que destacamos a independência, a soberania, a unidade nacional, a justiça, a criação do bem estar material e espiritual, qualidade de vida dos moçambicanos, reforço da democracia, da liberdade, da estabilidade social e da harmonia social e individual que por fim nos resume na formação de uma sociedade de pluralismo, tolerância e cultura de paz”.
O discurso demolidor de Porta-voz do Podemos
Na qualidade de porta-voz da bancada parlamentar do PODEMOS, Ivandro Massingue, chamou de covardes aos deputados da Renamo e MDM por não terem tomado, referindo que os mesmos tomaram posse pela porta pequena.
“As bancadas que não vieram aqui tomar posse tentando passar uma mensagem de estarem ao lado do povo, posso afirmar que é mentira. Na verdade as bancadas que não vieram tomar posse são covardes porque estão a fingir que estão do lado do povo, expressando não tomar posse. Depois desta tomada de posse nós iremos assistir uma corrida dos ratos onde todos estes actores virão tomar posse pela porta do fundos, pelas janelas dos fundos”, disse Massingue, afirmando que a bancada do PODEMOS assumiu “a responsabilidade, a coragem de entrar nesta casa do povo pela porta da frente”.
Por sua vez, o antigo Estadista Joaquim Chissano defendeu que as quatro bancadas na “Casa do Povo” devem alcançar consensos para as melhores leis que possam ser executadas pelas instituições.
Já Daniel Chapo, candidato proclamado vencedor pela Comissão Nacional de Eleições e homologado pelo Conselho Constitucional, referiu que a tomada de posse dos deputados na Assembleia da República vai permitir que os moçambicanos dirijam os destinos do País nos próximos anos.
“É um momento importante para um Estado Independente e para os órgãos instituídos porque são esses órgãos que devem fazer as leis. O País é composto por três poderes, Executivo, Legislativo e Judicial. Achamos importante ter este acto hoje porque vai permitir que nos próximos anos como moçambicanos possamos dirigir os destinos do nosso País”, declarou Chapo.
Renamo e MDM “gazetam” na tomada de posse dos deputados
O partido Renamo, através do seu porta-voz, Marcial Macome, disse que os seus deputados não estariam presentes na cerimónia da investidura dos deputados por considerar que a acção é contra vontade popular.
“Em face do acórdão administrativo proclamado pela presidente do Conselho Constitucional que valida e proclama os resultados foi fixada uma data para a tomada de posse no dia 13 de Janeiro. Face a esta situação foi marcada uma cerimónia solene para a tomada de posse e o partido Renamo entende que esta cerimónia está desprovida de qualquer valor solene e, por isso, constitui um atraso social e desrespeito a vontade dos moçambicanos pelo que não fará parte desta cerimónia de tomada de posse”
O partido Renamo entende que é necessário respeitar a vontade do povo e a vontade do povo passa necessariamente por “realização eleições livres, justas e transparentes”, acrescentou Macome.
O MDM, por intermédio do seu porta-voz, Ismael Nhacúcue, vincou não reconhecer os resultados das eleições gerais, alegadamente marcadas por fraudes, por isso, os seus deputados não tomaram posse porque o partido quer alinhar com a vontade popular.
“O povo está a dizer que não votou na Frelimo, e nós, como defensores da verdade eleitoral, não podemos fazer parte de uma Assembleia que surge de um processo fraudulento”, afirmou Nhacúcue.
Enquanto isso, o presidente do partido PODEMOS, Albino Forquilha, justificou que a tomada de posse dos deputados do seu partido deve-se ao facto dos resultados eleitorais terem sido validados.
Aliás, constitui um marco importante a tomada de posse considerando que os resultados foram alcançados após uma luta e, por isso, o partido está conformado com os resultados do Conselho Constitucional.
“Os partidos são soberanos e nós entendemos tomar a posse porque, de facto, é muito importante porque viemos de uma luta de não reconhecer os resultados e fizemos grandes protestos no País e depois os resultados foram validados. Conformamo-nos com a ordem constitucional e a luta é já na próxima etapa que é discutir aqui no parlamento por isso achamos que é importante tomar a posse aqui no parlamento”, disse Forquilha.
Três mortos, feridos, barricadas e pneus em chamas enquanto deputados tomam posse
Agitação social, barricadas e pneus a arder, com a polícia a realizar disparos para dispersar manifestantes, voltaram, na manhã desta segunda-feira, a algumas zonas de Maputo, ao mesmo tempo que no parlamento eram empossados os deputados eleitos à X legislatura.
Segundo escreve a Lusa, no mercado do Xiquelene, a polícia realizou vários disparos e lançou gás lacrimogéneo para dispersar manifestantes que, pacificamente, embora com barricadas na estrada, contestavam a tomada de posse que decorria em simultâneo na Assembleia da República.
Alguns populares que tentavam imobilizar as poucas viaturas que circulavam, elementos da UIR, numa viatura blindada, voltavam a fazer vários disparos de gás lacrimogéneo.
Pelo menos três pessoas terão morrido esta segunda-feira, durante os protestos contra a tomada de posse dos deputados que decorreu na Assembleia da República de Moçambique. Há relatos de vários feridos, alguns graves, em diferentes regiões do país.