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Teremos ou não administradores eleitos em 2024?

Alexandre Chiure

Seguir o modelo de eleição de governadores provinciais e de administradores distritais faz parte de um conjunto de exigências do falecido líder da Renamo, Afonso Dhlakama, que incluem a integração de alguns oficiais da guerrilha nas forças de defesa e segurança e o pagamento de pensão aos que seriam reintegrados na sociedade.

Os assuntos foram debatidos numa sala a dois, ou seja, entre o Governo e a Renamo, sem a presença de testemunhas, como seja o envolvimento de outros actores sociais e políticos. As duas partes chegaram a um acordo de que se devia avançar para a descentralização por mais complexo que o processo fosse.

Houve o entendimento entre ambos de que se devia obedecer ao gradualismo em que primeiro seriam eleitos os governadores provinciais, passo dado em 2019, e só depois, em 2024, é que teríamos administradores eleitos. A justificação apresentada foi de que o País não estava em condições de realizar, de uma só vez, os dois processos. Ninguém explicou claramente os porquês disso.

Para a Renamo, esta é uma oportunidade que se coloca para chegar ao poder, pois é mais fácil por esta via do que noutros pleitos eleitorais. Galvanizado com o facto de que em eleições legislativas ganhava, habitualmente, em cinco províncias, contava ter, numa sentada, governadores em Sofala, Manica, Tete, Zambézia e Nampula, o que, infelizmente, não aconteceu, e uns tantos administradores nestas e noutras províncias do País.

O Governo aceitou abraçar o processo porque era o preço da paz que a Renamo colocou em cima da mesa que passava por desfazer a sua máquina de guerra, entregar os seus homens às autoridades de modo que fossem desmobilizados, desarmados e reintegrados na sociedade.

Os acordos alcançados nas negociações foram acomodados na Constituição da República. Todo o mundo bateu palmas por isso. Não houve quem apresentasse objecções ou algo que pudesse pôr em causa a aplicabilidade da lei, o que significava que estava tudo bem. A comunidade internacional juntou-se às vozes internas saudando o Governo e a Renamo pelos acordos estabelecidos. Tudo bonito.

Agora que o País está nas vésperas de dar o segundo passo, o de eleição dos administradores distritais em 2024, o Governo, por razões pouco claras e tanto e quanto perigoso, está a querer desfazer o acordo que assinou com a Renamo a respeito deste assunto ao pretender reabrir o debate sobre o tema, já com o envolvimento de todos os actores da sociedade.

Por outras palavras, o Executivo quer que seja a sociedade a pronunciar-se sobre o assunto e dizer se vale a pena ou não se avançar para as distritais de 2024 de modo que não seja culpado de nada em caso de prevalecer o “não”, mesmo consciente de que o dossier está fechado há quatro anos e com o selo branco da Assembleia da República, a aguardar simplesmente pela sua implementação.

A avaliar pela situação que se vive neste momento, fica a impressão de que não há vontade política por parte das autoridades governamentais em realizar eleições distritais. Só assim se justifica que na hora de cumprir com o que ficou combinado que é de eleger administradores distritais no próximo ano, haja tentativas de inviabilizar o processo.

Algumas correntes de opinião dizem que o Governo quer refutar-se das suas responsabilidades assumidas com a Renamo. É que qualquer que seja a necessidade de reabrir o processo sobre eleições distritais, o debate tem que obedecer ao formato anterior, envolvendo as partes signatárias do convénio. A menos que seja de comum acordo que se deve colher outras opiniões acerca da questão.

É que não me parece sensato que, por exemplo, entendimentos alcançadospor um casal, no seu quarto,tenham, mais tarde,  que ser submetidos a um debate a nível da família alargada ou da comunidade em que este está inserido, por solicitação de uma das parte, esposa ou marido, sem o consentimento da outra.

Admitindo a necessidade de uma auscultação pública sobre o assunto, devia haver termos de referência para orientar o trabalho. Talvez porque não existem, atéhoje nada avançou. O governo, na qualidade de proponente, ainda não disse, claramente, quais sãos os pontos que devem merecer a atenção dos participantes nos debates.

Mais do que isso, não há um cronograma das actividades, com prazos estabelecidos e delegação de responsabilidades, a seguir até à decisão final. Não se sabe sequer qual é a entidade que vai dirigir as audiências públicas, se será o próprio Governo ou alguma comissão especializada da Assembleia da República. Estes aspectos têm que ser levadas em conta antes de iniciar o trabalho para conferir ao processo maior seriedade e um nível de organização.

Afinal porque é que se deve voltar a debater esta matéria se a mesma está fechada há cerca de quatro anos e figura na Constituição da República? Que condições não havia em 2019 para alargar eleições aos administradores distritais e que o País continua a não ter até hoje? O que foi feito para garantir que as eleições distritais tenham lugar em 2024? Acho que as respostas a estas perguntas é que podem ditar se se deve ou não reabrir o dossier para um novo debate.

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