Alexandre Chiure
Às vezes pergunto, a mim próprio, se vale a pena continuar a ser jornalista ou o melhor é atirar a toalha ao chão e passar a frequentar cerimónias fúnebres. Ir a enterros e ao oitavo dia em casas de familiares, amigos, colegas e vizinhos onde, por imperativos de ordem profissional, não conseguia fazer-me presente. Conclui que fazendo isso estaria a trair a minha profissão e a abandonar o que faz parte de mim, o que gosto de fazer.
Pensei, igualmente, sobretudo agora com o assassinato do colega João Chamusse, se no lugar de fazer jornalismo, não seria melhor me dedicar à pesca com anzol, no largo da baia de Maputo. Praticando esta actividade, não terei problema com ninguém, tirando o caso de mau tempo que, de vez em quando, me impediria de pescar, como sejam chuvas e ventos fortes, mas desisi dessa porque seria cobardia da minha parte, para além de que tenho jeito para isso.
Nesses meus momentos de reflexão, pensei que, se calhar, fosse melhor abrir uma banca de tomate e cebola, na esquina da minha casa, pois nesse negócio só teria que enfrentar apenas a polícia muncipal, a única que me poderia tirar a paz, mas algo controlável, bastando para isso dar “refresco”, ao invés de julgar, em vão, que, como cidadão e como jornalista, gozo da liberdade de imprensa e de expressão. Que posso falar num à vontade e escrever sem sofrer qualquer tipo de ameaça ou intimidação ou ainda correr riscos de ser morto.
A lei de imprensa e o direio do cidadão à liberdade de expressão são apenas decorativos. Servem apenas para convencer à comunidade internacional de que há democracia em Moçambique. Na prática é como que proibido fazer o que a lei estabelece como direitos. Se escrever, por exemplo, com isenção e imparcialidade vai arrasar consigo muitos inimigos dentro do sistema. Se falar com abertura ou independência que se requere, idem. Em alguns casos pode ser ameaçado de morte, raptado e agredido por esquadrões de morte ou pura e simplesmente confundido com alguém da oposição.
Que país é este que estamos a construir e que se diz democrático onde alguém pode ser morto, agredido ou maltratado só porque falou a verdade? Desde quando falar a verdade é um crime? Será que emos que rasgar a constituição que confere ao cidadão moçambicano os direitos à reunião, manifesação e à liberdade de expressão e de imprensa?
Gabriel Júnior, deputado da Assembleia da República pela bancada parlamentar da Frelimo e dono da TV Sucesso, anda rodeado de agentes de segurança na sequência de ameaças de morte que sofreu há dias por ter decidido abrir espaço, na sua televisão, para um debate aberto sobre a vida do país. País que não está nos seus melhores dias. Um país que precisa de ser reinventado com a participação de todos nós.
Está a se tornar cada vez perigoso ser jornalista, comentador ou analista político. O colega João Chamusse, que comentava connosco no programa Quarto Poder, da TV Sucesso, foi morto há dias por razões desconhecidas. Digam-nos que o seu assassinato nada tem a ver com questões políticas. Provam-nos, apresentando os verdadeiros assassinos, que nada tem a ver com isso.
Alguém dizia que os estados inteligentes, no mundo, se encarregam de proteger os líderes, os comentadores ou analistas políticos. Oferecem-lhes segurança para que nada aconteça com eles sob risco de a responsabilidade ser imputada ao Estado em caso de agredidos ou mortos por oportunistas, exemplo que devia ser seguido pelo Estado moçambicano.
Infelizmente Moçambique está a atravessar um momento estranho em que para alguém esar bem com o sistema tem que ser lambebota. Alguém que elogia só por elogiar para agradar os ouvidos de ilustres, mesmo que as coisas não estejam bem. Dizer o que convém e não o que constitui a realidade. Não apontar nunca os erros para serem corrigidos, mas as virtudes. Fazer de conta que tudo está bem, enquanto não. Estes são tidos como os melhores filhos deste país e os outros não passam de detratores.
Os mentores desta maneira de pensar e fazer as coisas ainda não perceberam que estão a afundar o país. As liberdades dos cidadãos estão a ficar coaptadas. Chegamos a fase em que os moçambicanos têm medo de se idenificar em programas interactivos na rádio e na televisão, mesmo que seja para dizer que no seu bairro não sai água. Com esse andar das coisas, um dia iremos acordar num país ditatorial ou monárquica com reis, rainhas e princesas.