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PESOE 2024 – Como o estado pode sair do crónico défice orçamental _ Parte 1

Felisberto S. Botão

O PESOE 2024 traz um défice de mais de 150 mil milhões de meticais, o que representa baixa receita do estado. A realização deste valor depende de fontes não asseguradas, nomeadamente ajuda de parceiros internacionais. A receita do estado deve advir da produção, de empresas participadas pelo estado, das mais valias dos grandes projectos e dos impostos das empresas locais e multinacionais. Depois tem os impostos que incidem nas pessoas singulares, como o IRPS, o IVA, o imposto predial, autárquico entre outros.

Há várias medidas que o estado quer introduzir em 2024 para melhorar a receita, mas nas medidas que tive conhecimento, não vi nada sobre as empresas participadas pelo estado, multinacionais que estão a extrair a riqueza deste país, e nem de operadoras de turismo que cobram seus clientes no exterior. É aí onde estão as reais possibilidades de o estado realizar receitas importantes, muito longe do que se vai embolsar com a tributação das operações do comércio electrónico. O alargamento da base tributária não pode continuar a penalizar a empresa e o cidadão local, pensando apenas no ganho fiscal do estado, que acaba retrocedendo no que toca a ambiente do negócio e na carestia de vida ao consumidor final, impactando a inflação, e desestabilizando a paz social. A tributação das carteiras móveis e do comércio eletrónico, não deve esquecer o espírito da inclusão financeira que nós pregamos. Mais uma vez, se o foco estiver na facturação do estado, poderemos voltar a recuar na questão da inclusão financeira.

Cada um de nós, quase sem excepção, tem a tendência de pensar que “não merecemos boas coisas, com excepção de mim, que sou um pouco diferente”. Não hesitamos em tomar decisões que colocam no aperto todos irmãos aqui em casa, mas preservamos a nossa parte. Entretanto, damos tudo ao estrangeiro.

O saudoso Edson da Luz, conhecido como Azagaia, já dizia sobre nós “Sou dono da terra sem nunca ter mandado nela, com os amigos quero paz, com os irmãos faço guerra, por isso, sou explorado na minha própria terra, eu sou o único rico que vive na miséria, vivo da pena que sentem de mim, vivo da miséria”.

Pela forma como a sociedade tem construído a nação, e as prioridades que tem adoptado durante décadas, o fazer de contas, a aparência e o imediatismo têm sido valores cultivados a nível generalizado, e se tornam princípios orientadores na postura de uma boa parte dos moçambicanos, na sociedade, no casamento, no emprego e na política.

Como resultado, o país não conseguiu estabelecer instituições de estado credíveis e com reputação perante o seu público, o país não conseguiu criar políticas efectivas, em várias áreas de interesse nacional, o país não conseguiu desenvolver sistemas de cultura, saúde e educação que promovam a identidade, o crescimento, a evolução, e o bem estar da sua população, e principalmente, o país não conseguiu formar o HOMEM com visão do amanhã, com visão de nação, com visão de família, que seja íntegro e respeite a individualidade, a diversidade e a coisa de terceiros, principalmente a coisa pública.

Os efeitos disso tudo se notam na dificuldade e falta de clareza das acções em casos como estes de estruturação do orçamento do estado, tao importante para as comunidades, para o sistema de saúde, para o sistema de educação, para as empresas que estão a ir à falência, para os trabalhadores que estão a perder emprego, enfim, para a vida e saúde do nosso país.

Apesar de ser facto que a liderança deve estar na vanguarda dos processos, mas a nossa sociedade precisa saber que não pode ter líderes melhores, sem uma sociedade melhor. “Os nossos líderes, corporativos, espirituais (incluídos, e principalmente os curandeiros) e políticos, saem das nossas casas, e transportam os nossos valores e mentalidade, para os seus mandatos”.

A nossa sociedade está em crise, que vai muito além do PESOE. Nós não podemos mentir e achar que está tudo bem; não podemos passar mensagem falsa e manipulada à devotos religiosos e espirituais, ganhar benefícios próprios e achar que está tudo bem; não podemos roubar e achar que é uma forma de empreender; não podemos investir na calúnia e destruição do próximo e achar que é forma de competir; não podemos burlar e achar que somos os mais espertos; não podemos esperar ajuda e doações e acharmos que é um direito; não podemos institucionalizar vantagens comerciais individuais com importações, à custa da morte da indústria local, e achar que é uma oportunidade, entre outros desvios de postura, mesmo isso representando prejuízo à vida, saúde e futuro de outras pessoas, as vezes até de comunidades inteiras ou nação. Isso são sinais de uma sociedade em crise, e tem um preço, que será cobrado a cada um individualmente, e a todos nós colectivamente, enquanto vivos.

A mentalidade de aproveitamento e esquemas faz com que não nos damos tempo para estudar e desenvolver coisas, e por conta disso, ficamos sem tomar consciência do nosso real potencial. O facto é que se nos permitirmos a tomar consciência do nosso real potencial, não precisaríamos de esquemas e muito menos de nos aproveitarmos das pessoas ou situações, para nos sentirmos realizados, pois a nossa criatividade natural é tão abundante que seria bastante para gerar valor dos recursos à nossa volta, para a nossa autossuficiência.

Não podemos construir parcerias sustentáveis, não podemos conduzir negociações construtivas, não podemos construir relações de confiança, quando a percepção geral é que na primeira oportunidade, podemos adulterar, podemos burlar, podemos empurrar o parceiro, podemos extorquir, e mentir com naturalidade a cerca disso, e ainda assim nos sentirmos superiores.

Os projectos de infraestrutura como as do gás, precisam que os moçambicanos se associem em “clusters” para criar capacidade e escala. Como podemos materializar isso, se não há confiança entre nós? O capital externo precisa encontrar parceiros locais, idóneos, para investimento em projectos locais. Como atrair este capital, se quando buscam dados a nosso respeito, o calote aparece evidenciado a quase todos os níveis?

A falta de confiança própria deve estar a influenciar muito neste comportamento. As pessoas não acreditam que podem construir algo seu, de raiz, e nem sustentar uma relação, enquanto não tiverem protecção política, enquanto não tiverem proteção de cargos de chefia, enquanto não tiverem algum elemento “emocional” perante quem toma decisões. E por outro lado acreditam, com alguma dose de razão, que estará sempre alguém a espreita, para lhe roubar ou para lhe destruir. Daí tentar tirar proveito próprio, muitas vezes ilícito, sobre qualquer situação em que se encontram, antes que esta lhes seja retirada, desde amizade, passando pelo casamento, emprego, negócios até, e principalmente, cargos políticos.

Precisamos todos pensar em como devolver esta confiança e autoestima à nossa gente. Também precisamos devolver à nossa gente, a percepção de que “o trabalho árduo compensa”, e a percepção de que “não precisa arrancar para ter, tudo vem no tempo certo”. Isso passa pela desconstrução dos paradigmas da sociedade, em que as emoções relacionadas serão sempre chamadas quando for tomar decisões, como se fosse um arquivo de consultas. Por conta disso, a intervenção de líderes espirituais é indispensável neste processo. Precisamos ganhar esta guerra para tornar África um local agradável de viver, com previsibilidade nos seus sistemas e instituições, onde os jovens tenham confiança e queiram ficar e construir suas vidas.

Há um padrão presente em toda África, que devemos sempre ter em mente, que é o desligamento entre a liderança política e o povo, e entre eles sempre está o branco a preencher o vazio. Devo lembrar que o branco não tem obrigação nenhuma de cuidar da nossa gente, porque ele tem muita gente necessitada na europa, que precisa da sua criatividade e diligência para trazer caça para casa. E enquanto nós não delimitarmos a nossa área de caça, e impor respeito, ele virá caçar. É a lei da natureza e da sobrevivência.

O branco faz bullying com o nosso líder, que o impede de produzir políticas favoráveis para o seu povo, e por mistura de medo e vergonha, o nosso líder não fala com o seu povo sobre isso. E vai tentando criar alternativas para minimizar o sofrimento do seu povo, acção que é entendida pelo povo como falta de vontade política, de integridade e desrespeito ao seu semelhante. Entretanto, o branco vem ao povo fragilizado e desesperado, e oferece ajuda, e muitas vezes de forma directa, alegando corrupção do líder africano. E o povo pensa, “afinal porquê lutamos pela independência, se o branco é que cuida de nós?

O líder africano deve parar de só falar quando o que diz já não tem impacto político, pois está fora do poder, não tem influência, e está velho. Apesar de dizer verdades, ninguém presta atenção…   

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