Parcialidade ou imparcialidade da PGR

OPINIÃO

Alexandre Chiure

O que se esperava, finalmente aconteceu. O ex-candidato às presidenciais suportado pelo PODEMOS, Venâncio Mondlane, foi chamado à Procuradoria Geral da República (PGR) para prestar declarações. O interrogatório durou cerca de dez horas seguidas e tudo terminou com uma medida de caução, o termo de identidade. Os seus movimentos passam, agora, a ser controlados.

Até aqui está tudo nos conformes. É função da procuradoria convocar a quem quer que seja para ouvi-lo sempre que julgar necessário ou chegar à conclusão de que a legalidade foi posta em causa. Pode fazer isso com todos, menos a figura de Presidente da República por gozar da imunidade. Dai que o processo interposto por VM7 contra Daniel Chapo não tem, por isso, pernas para andar.

O que é estranho é o facto de a PGR ter ficado calado durante muito tempo, com os casos a acumularem-se, sem intimar Venâncio Mondlane para depor. Hoje, fala-se da existência de mais de 100 processos contra o político, movidos pelo Estado e por privados.

O facto alimenta a narrativa de que os adversários políticos do VM7 fizeram questão de juntar os eventuais crimes, peça por peça, para que não escape da condenação com o objectivo único de o afastar da cena política do país, impedindo-o de concorrer nas próximas eleições presidenciais marcadas para 2029. É uma hipótese a considerar.

A segunda coisa que causa estranheza é que, ao que se sabe, não existe, na procuradoria, um único processo-crime contra algum agente da polícia, em particular da UIR, acusado de matar cidadãos indefesos. Mais de 300 pessoas perderam a vida e que a maior parte foi morta pelas forças de defesa e segurança em manifestações.

Que eu saiba, não há, igualmente, nenhum processo contra agentes da polícia vistos, em imagens televisivas e que circularam nas redes sociais, a saquearem bens, lado a lado com as populações, em alguns estabelecimentos comerciais vandalizadas, em Maputo, Matola e noutras partes do país. Se o objectivo da procuradoria é fazer justiça, não faz sentido que estes fulanos sejam postos de lado.

Não responsabilização dos agentes envolvidos nas matanças só pode ter uma explicação. Que a polícia actua do jeito que actua a coberto de ordens superiores ilegais. Nada justifica que os polícias matem pessoas. Num país normal, todos eles teriam sido presos, julgados e condenados. É inadmissível tanta impunidade. É verdade que sem que se justificar, a polícia deve usar a força para repor a ordem.

Ainda assim, não significa, de forma alguma, disparar contra a população. Não sou eu que devo ensinar à polícia que não é com tiros verdadeiros que se dispersam os manifestantes. Sabe, muito bem, o que se deve fazer. Que meios devem ser usados, em ocasiões dessas, para que não haja perdas humanas.

O que vimos foi uma polícia que disparava de qualquer maneira, atingindo crianças que regressavam da escola, cidadãos a trabalharem, homens, mulheres e idosos a cumprirem o seu dia a da nas suas casas, jovens a serem perseguidos e mortos nos bairros. Até hoje não há notícias de estes agentes fazerem parte de um processo-crime para a sua responsabilização. Os polícias fazem e desfazem a seu bel-prazer e nada lhes acontece.

É, igualmente, surpreendente que os polícias ou militares que destruíram a porta de um estabelecimento comercial para permitir que as populações saqueassem produtos não tenham sido, até agora, intimados para prestar declarações na PGR. No lugar de protegerem os bens, públicos e privados, facilitaram a sua vandalização. Como fazer justiça fazendo vista grossa a estes casos.

Hoje, a CTA fala de 40 empresas cujas infra-estruturas foram vandalizadas pelos manifestantes em todo o país. A REVIMO, por exemplo, teve um prejuizo de 655 milhões de meticais com a destruição de algumas das suas portagens, A pergunta que não quer calar é a quem cabe a responsabilidade de pagar esta factura? Aos sócios da empresa, sozinhos, ao Estado ou às duas partes? Devia ser o Estado.

O Governo anunciou, há dias, a criação de um fundo para ajudar as empresas a reerguerem o que foi destruído. Alguns empresários estão receosos se devem ou não solicitar o dinheiro. O ponto é que não há garantias de segurança no sentido de que, daqui para a frente, não haverá mais vandalizações.

A segunda questão é que devia ser um fundo perdido que seria uma forma de o Estado ressarcir os prejuízos causados pelos manifestantes ao sector privado, pois não conseguiu cumprir com as suas obrigações que são de garantir a protecção de bens.

Para dizer que enquanto os agentes de Estado que contribuíram, directa e indirectamente, para as vandalizações e saques de bens não forem notificados para serem ouvidos na PGR, incluindo polícias que mataram cidadãos indefesos, dificilmente se pode falar de imparcialidade por parte da Procuradoria Geral da República. A impressão que fica é a de que a instituição está reboque de um partido político.

Desta forma, custa acreditar na independência da PGR. Que as suas decisões são tomadas sem influência política. Em última análise, a instituição é vista como aquela que foi capturada para servir interesses partidários.

Se estou equivocado, o que seriam bom, que a PGR venha dizer que todos os infractores em conexão com as manifestações têm processos que correm contra eles, nomeadamente polícias-ladrões e polícias-assassinos. Ai, sim, teremos a certeza de que a instituição está ao serviço dos interesses do povo moçambicano e não de grupos.

Enquanto isso não acontecer, continuaremos a admitir na existência de dualidade de critérios, de filhos e enteados na tramitação de processos, o que mancha o prestígio e a credibilidade da PGR.

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