Alexandre Chiure
Não sei se quando nos referimos à independência, isenção e imparcialidade dos órgãos de informação estamos, todos, no fim do dia, a falar das mesmas coisas, designadamente a classe jornalística, o próprio Sindicato Nacional de Jornalistas e a sociedade em geral.
Será que levamos este assunto a sério ou nos limitamos a falar das matérias, ou a exigir dos outros a sua observância, sendo que nós nos furtamos a isso? Às vezes fico a pensar, cá comigo, que estamos a falar de coisas completamente diferentes.
Quando se diz, por exemplo, que ser assessor de imprensa é incompatível com o exercício de actividade jornalística e sindical, aí tenho a certeza do que isso significa. É que põe em causa a independência, a isenção e a imparcialidade do jornalista. Até aqui comungamos o mesmo conceito.
De igual modo, os jornalistas que são donos de alguns órgãos de informação não são elegíveis aos órgãos sociais do SNJ. Também estou consciente de que estamos perante uma incompatibilidade, pois eles vestem a camisola do patronato e não podem ser, ao mesmo tempo, sindicalistas.
Aliás, por causa de imposições estatutárias, muitos colegas que desempenham um papel de relevo na sociedade e revelam um elevado grau de profissionalismo e que podiam emprestar uma outra dinâmica ao SNJ, não fizeram parte das listas de candidatura à sucessão do actual elenco. Não há nada a discutir. É de lei.
Mas quando o Sindicato Nacional de Jornalistas aceita o patrocínio de um partido político, neste caso concreto a Frelimo, para a realização da sua VII Conferência Nacional em Mafambisse, em Sofala, já não sei se continuamos a falar da mesma independência e isenção que deve caracterizar a actividade sindical de uma organização como o SNJ. Qual é a mensagem que o sindicato transmite aos seus membros ao aceitar a oferta? Como evitar que o partido patrocinador interfira na vida do sindicato numa situação destas?
O que é certo é que não sei se depois do SNJ receber o cheque ou qualquer outro tipo de pagamento para fazer face às despesas do evento, das mãos do partido em causa, tem ainda a legitimidade para exigir que os seus membros cumpram, na letra e no espírito, os estatutos, como aconteceu durante a conferência de Mafambisse.
Será que o secretariado executivo está no direito de aceitar uma oferta daquelas sem uma consulta prévia aos membros, sendo comprometedora, ou juntos encontrariam uma outra forma de fazer a reunião sem “vender a nossa soberania” como jornalistas?
Não sei se os membros do SNJ e a sociedade em geral podem continuar a acreditar na independência da agremiação ou serão obrigados a admitir que esta foi capturada pelo poder político para satisfazer os seus interesses?
Como todos nós sabemos, doador é sempre doador. Em algum momento vai querer ditar algumas regras de jogo e, acima de tudo, fazer manipulações ou imposições que lhe permitam tirar proveito, o qua leva a que nós fiquemos como meros espectadores, nos corredores, a lamentar a existência de um sindicato sem garras, que não pode intervir ou defender, com contundência os interesses da classe.
Durante a organização da VII Conferência Nacional de Jornalistas, o secretariado executivo deixou expresso que a comissão eleitoral, indicada por si, devia fazer cumprir escrupulosamente o regimento e a directiva eleitoral, mas o que se constatou foi um festival de atropelos aos estatutos, envolvendo a comissão eleitoral e a própria direcção cessante do SNJ.
Por exemplo, o regimento eleitoral, no seu artigo 2, número dois, obriga a comissão eleitoral (CE) a proceder à afixação das listas de candidatura aprovadas para o conhecimento de todos, facto que, infelizmente, não aconteceu.
O mesmo documento, no seu artigo 4, número quatro, entra em choque com os estatutos ao estabelecer que está vedado o direito de concorrer aos órgãos sociais do SNJ para os membros que tenham regularizado a sua situação de quotas seis meses antes da conferência. Os estatutos não estabelecem o prazo. Dizem, simplesmente, “na véspera”, o que significa, em termos concretos, um dia antes da realização do evento.
O regimento obrigava ainda à CE, que tomou posse a 3 de Julho, a pronunciar-se sobre a aceitação das candidaturas até às 12:00 horas do dia seguinte ao fim do prazo de submissão das mesmas (15:30 horas do dia 4), neste caso a 5 de Julho, o que não foi cumprido.
No dia 4, a CE teve a sua primeira sessão de trabalho, em Maputo. Apreciou as candidaturas de uma forma geral, tendo deliberado que os candidatos estavam autorizados a realizar a sua campanha, que durou 15 dias. Já em Mafambisse, a faltarem algumas horas para o início da conferência, eis que aponta irregularidades por sanar, acto manifestamente extemporâneo.
O mais grave ainda é o facto de a CE, constituída por quatro membros, no lugar de três ou, no máximo, cinco, segundo rezam os estatutos, no seu artigo 56, número 1, ter notificado oralmente os delegados das candidaturas das irregularidades detectadas e não por escrito, como obriga a lei.
O artigo nono, no seu número 1, reza que se deve promover a divulgação e afixação das candidaturas aceites para o conhecimento dos potenciais votantes. Infelizmente isso não aconteceu. Ademais, até ao presente, não é conhecido o manifesto eleitoral de uma das candidaturas, o que viola o regimento eleitoral.
Este conjunto de violações ou desrespeito ao regimento, directiva eleitoral e dos estatutos são mais do que suficientes para mandar impugnar a VII Conferência Nacional do SNJ. Está claro que prejudicaram, sobremaneira, as candidaturas. Eu só não avancei com o processo porque, segundo diria um respeitado colega, o SNJ não tem por onde se lhe pegar.
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