Alto Comissariado e ex-primeira dama acusados de desviar doações feitas em nome de deficientes para acções políticas

DESTAQUE POLÍTICA
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  • Doações desaparecem da embaixada de Moçambique em Londres
  • Cadeiras e suplementos médicos tinham sido mobilizados para necessitados em Maputo e Xai-Xai

Suplementos médicos e equipamentos de apoio, incluindo cadeiras de rodas destinadas a portadores de deficiência em Maputo e Xai-Xai, doados pela comunidade moçambicana em Londres, através da Embaixada de Moçambique no Reino Unido, desapareceram durante o processo de transferência para o país. A Alta Comissária Albertina Mac Donald, representante da embaixada, afirmou que os materiais se perderam no envio a Maputo, mas quando uma das doadoras solicitou documentação que comprovasse os trâmites do envio, a embaixada não conseguiu apresentar evidências concretas. Fontes próximas ao caso revelaram que uma das cadeiras de rodas, que já tinha um destinatário determinado em Maputo, teria sido desviada para a Cidade da Beira, onde foi doada em um evento político ligado ao gabinete da antiga primeira-dama, Isaura Nyusi. O desaparecimento dos donativos levanta dúvidas sobre a integridade da embaixadora, que tentou comprar uma cadeira para abafar o caso, mas a doadora exige que seja a mesma cadeira doada ou idêntica. O Evidências escreveu à embaixadora para solicitar detalhes da acusação, no entanto, até ao momento, não há esclarecimentos oficiais sobre o paradeiro dos materiais ou responsabilização pelo ocorrido.

Evidências

Uma polémica em torno de um alegado desaparecimento de pelo menos uma de três cadeiras de rodas doada pela comunidade moçambicana no Reino Unido, cadeira essa que era destinada a um cidadão paraplégico em Moçambique, ganha contornos mais complexos e levanta suspeitas de desvio.

A denúncia se arrasta desde 2023 e envolve o Alto Comissariado de Moçambique em Londres e feito o rastreio descobriu-se que, afinal, a cadeira foi entregue a outro beneficiário na Beira, numa cerimónia pública conduzida pelo gabinete da antiga Primeira-Dama da República – um desenvolvimento que, para o doador e membros da comunidade, reforça a narrativa de que a cadeira original foi deliberadamente desviada para fins meramente políticos, deixando o real destinatário à sua sorte.

A história começou com a solidariedade de Maria das Neves Cabral, membro da comunidade no Reino Unido, que angariou uma cadeira de rodas para um jovem paraplégico que necessitava de apoio.

Em 2023, durante um evento da celebração do 07 de Abril, Maria das Neves solicitou o apoio da Alta Comissária Albertina Mec Donald para o envio do equipamento a Moçambique, obtendo uma resposta positiva.

Contudo, o processo de envio revelou-se labiríntico, marcado por atrasos e informações contraditórias. Após a promessa inicial de facilitação do transporte, Das Neves Cabral enfrentou um período de incerteza. Uma breve esperança surgiu com a menção de que a esposa de um funcionário da embaixada que estava de viagem poderia levar a cadeira para Maputo, tendo esta chegado ao seu gabinete, mas não seguiu viagem com a cadeira, afinal não estava mais lá.

A frustração levou a contactos directos com a Alta Comissária, tendo essa transferido a responsabilidade para a Adida Financeira Administrativa, Margarida Adamo. O relato de que a cadeira havia “desaparecido” durante o envio gerou descrença e o pedido por detalhes do processo nunca foi atendido.

Enquanto ainda aguardava por informação, é surpreendida com a informação de que seria feita uma oferta de uma cadeira de rodas substituta, de segunda mão e de qualidade inferior à original, o que intensificou a indignação do doador, que insistiu na necessidade de um equipamento adequado ao beneficiário original, que reside em Maputo e, volvidos dois anos, continua sem receber qualquer apoio.

O Evidências falou com o jovem tetraplégico que devia ter-se beneficiado, o qual manifestou-se desapontado ao receber a boa notícia de que pessoas de boa-fé tinham conseguido mobilizar ajuda, no entanto interferências políticas reduziram o sacrifício a zero. Não esconde as dificuldades por que passa no dia-a-dia por conta da sua condição, uma situação que podia ter sido ultrapassada se aquele meio de apoio tivesse chegado às suas mãos em 2023.

Comunidade pede esclarecimentos da Alta Comissária

No mesmo período, não chegaram ao destino outras duas cadeiras para uma clínica e suplementos médicos, confiadas ao consulado, na pessoa da embaixadora Albertina Mac Donald.

Segundo a denunciante, as duas cadeiras eram para uma clínica dentista e um conjunto de suplementos médicos que enchiam uma pickup de mais de uma tonelada, que deviam chegar a Xai-Xai e também não chegaram ao destino.

Lopez Quichine Tucarume Mutasa, membro-fundador de organizações comunitárias, expressou a sua preocupação com a gestão de donativos e apelou publicamente à Alta Comissária por esclarecimentos. O Engenheiro Mutasa, como é tratado, mencionou também as persistentes reclamações de Maria das Neves sobre o paradeiro da cadeira.

A narrativa de um possível desvio ganha força com a informação veiculada na comunidade de que uma cadeira de rodas foi entregue a um beneficiário na cidade da Beira, numa cerimónia pública com a participação da antiga primeira-dama da República.

Para o doador e outros membros da comunidade, esta informação sugere que a cadeira originalmente doada pode ter sido desviada do seu propósito inicial, sendo utilizada para outro beneficiário e possivelmente para fins de relações públicas, enquanto o destinatário original continua à espera.

Apesar de a doadora alegar ter conhecimento do “destino” da cadeira original, a confirmação da entrega de uma cadeira na Beira, num evento público de alto perfil, levanta sérias questões sobre a transparência e a ética na gestão de donativos destinados a cidadãos necessitados. A comunidade moçambicana no Reino Unido exige agora explicações urgentes e transparentes por parte do Alto Comissariado sobre o paradeiro da cadeira doada e o motivo pelo qual o beneficiário original, em Maputo, ainda não recebeu o apoio prometido. Este caso lança uma sombra sobre a reputação da representação diplomática e a sua relação com a comunidade que procura apoiar o seu país de origem.

Abordada pela nossa reportagem, a Alta Comissariada de Moçambique em Londres, Albertina Mac Donald, preferiu abraçar o silêncio.

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