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Depois da polémica ligação a um dos sócios da Future Tercnologies, empresa que ganhou um concurso público para fornecimento de um sistema tecnológico de gestão da cadeia de oleaginosas – posteriormente anulado pelo Tribunal Administrativo – o nome de Roberto Mito Albino, actual ministro da Agricultura, Ambiente e Pescas, surge agora associado a mais um escândalo no sector do ambiente. Documentos e testemunhos recolhidos pelo Centro de Integridade Pública (CIP) e pela Procuradoria de Chemba, em Sofala, indicam que o governante terá autorizado o corte ilegal de madeira de espécies preciosas, numa concessão sob sua responsabilidade, envolvendo empresas estrangeiras e locais, dissimulado como se fosse uma simples limpeza de terreno.
O caso remonta a Fevereiro de 2024, quando Albino, então director-geral da Agência do Desenvolvimento do Vale do Zambeze, contratou a Ecofarm Moçambique. para limpar 50 hectares de um total de 500 em sua posse. Oficialmente, a intenção era instalar um acampamento agrícola, mas a Procuradoria alega que o acordo firmado visava a extração e comercialização de madeira preciosa sem a devida licença.
A Ecofarm, sem autorização florestal, acabou por recorrer à TCT Indústria Florestal, empresa com histórico de exportação, para cortar e quantificar a madeira. No terreno, fiscais encontraram 18,4 metros cúbicos de espécies valiosas como chanate preto e mecungo. O volume excedia largamente o permitido, configurando crime de exploração ilegal de recursos florestais, cuja pena pode variar entre 12 e 16 anos de prisão.
Em Março de 2024, a Agência Nacional para o Controlo da Qualidade Ambiental (AQUA) multou a Ecofarm em 1,2 milhão de meticais. A empresa, no entanto, contestou a decisão, alegando que apenas “disponibilizou meios” ao concessionário, no caso o ministro Albino.
“As atividades foram conduzidas dentro da concessão do Dr. Albino”, escreveu a Ecofarm numa carta, responsabilizando diretamente o ministro pela ordem de corte comercial, dissimulado como se fosse uma simples limpeza de terreno.
A Procuradoria Distrital de Chemba tentou ouvir Roberto Albino, mas afirma não o ter conseguido localizar. Várias diligências foram feitas, incluindo chamadas telefónicas e notificações formais, sem sucesso. Intermediários ligados ao ministro também não colaboraram com a justiça. O caso acabou remetido ao Tribunal Judicial da Província de Sofala, sem que o principal arguido tivesse prestado declarações.
A polémica intensificou-se em Julho de 2025, quando Albino, já ministro, exonerou Ermelinda Maquenze, então directora dos Serviços Provinciais de Ambiente de Sofala, a uma semana do julgamento que havia sido marcado para dia 29 do mesmo mês. Foi ela quem ordenara a apreensão da madeira e desencadeara a denúncia que deu início ao processo-crime. A proximidade entre a exoneração e a data inicialmente prevista para o julgamento levantou suspeitas de retaliação política e de tentativa de condicionar a investigação.
Outro episódio controverso foi o adiamento do julgamento, marcado para Julho de 2025. Tanto o director distrital do SDAE de Chemba, Cândido Patrocínio Zeca, testemunha-chave, como James White, gestor da TCT, apresentaram justificações quase idênticas — problemas de saúde e falta de transporte. Ambos enviaram pedidos ao tribunal no mesmo dia e com números de protocolo sequenciais, alimentando suspeitas de articulação entre acusados e testemunhas.
O caso revela a vulnerabilidade das instituições diante de figuras politicamente expostas. Vários documentos consultados pelo CIP apontam para contradições entre os argumentos apresentados pelas empresas e as constatações das autoridades locais, incluindo ausência de indícios de produção de carvão — justificativa usada como pretexto para a desmatação.
O contrabando de madeira em Moçambique é há muito associado a redes que envolvem empresários estrangeiros e elites locais, com forte capacidade de influência sobre o aparelho do Estado. O processo que envolve Roberto Albino expõe, segundo analistas, a dificuldade em responsabilizar dirigentes de topo por práticas que minam tanto o ambiente como a confiança nas instituições públicas.
Enquanto o julgamento arrasta-se entre adiamentos e manobras processuais, o futuro político de Roberto Albino permanece em aberto. Para a sociedade civil, o caso é emblemático: mostra como a lei ambiental pode ser usada selectivamente e como a justiça ambiental em Moçambique ainda enfrenta os obstáculos da impunidade e do poder político.

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