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As autoridades angolanas confirmaram a detenção de dois cidadãos russos identificados como Lev Lakshtanov, de 63 anos, e Igor Racthin, de 38 anos, suspeitos de integrarem uma máquina internacional de desinformação e de desestabilização de democracias em África.
A prisão dos dois cidadãos russos em Angola teve lugar a 7 de Agosto de 2025. Os dois homens, são acusados de atividades criminosas, incluindo incitação a protestos violentos, segundo a polícia angola, os dois, têm profundas ligações com uma ampla rede russa conhecida como “Politologia Africana”, que atua em África como atores privados, “consultores”, em Organizações não governamentais que têm interesse em várias áreas sociais e em organizações que compõem várias redes, incluindo de iniciativas africanas apoiadas pelo estado russo, sem deixar de destacar a ligação com empresa militar privada conhecida como “Corpo Africano” (anteriormente Grupo Wagner), para além de também estão ligados a outras redes clandestinas espalhadas pelo mundo.
Lev Lakshtanov e Igor Racthin, entraram em Angola com um visto de turista, e se instalaram no bairro Gamek. Eles se apresentaram como jornalistas e contactaram Buka Tanda, um membro juvenil da UNITA que se comunica fluentemente na língua russo, sob o pretexto de filmar um documentário e abrir um centro cultural.
Tanda lhes apresenta seu primo, jornalista da televisão pública. Juntos, eles realizam entrevistas remuneradas com personalidades políticas, além de uma pesquisa de opinião sobre a percepção da Rússia em Angola, antes de serem presos e acusados de estarem por trás das manifestações contra o aumento dos preços dos combustíveis.
No anúncio da detenção dos dois russos, o porta-voz do Serviço de Investigação Criminal (SIC), Manuel Halaiwa, também fez saber que três angolanos, recrutados para produção de matérias de propaganda e difusão de informações falsas nas redes sociais, promoção de manifestações e pilhagem em Luanda e Benguela, foram igualmente detidos.
“Diligências feitas mediante cumprimento de mandatos de detenção emitidos pelo Ministério Público, procedeu à detenção, na cidade de Luanda, no dia 7 de Agosto, de dois cidadãos estrangeiros, de nacionalidade supostamente russa, identificados por Igor Rachin, também conhecido por Ígor, 38 anos, e Lev Lakshtanov, também conhecido por Lev, 64 anos, por fortes indícios da prática dos crimes de associação criminosa, falsificação de documentos, terrorismo e financiamento ao terrorismo, consubstanciado no recrutamento e financiamento de cidadãos nacionais para produção de matérias de propaganda e difusão de informações falsas nas redes sociais, promoção de manifestações e pilhagem”, disse.
Investigações apontam aos dois indivíduos como quem operavam de forma discreta em Angola, mas as suas atividades levantaram suspeitas ao cruzarem-se com padrões já registados em outros países africanos. O caso destapou a atuação silenciosa da Rússia no continente, numa estratégia que tem sido replicada em Chade, República Centro-Africana, Mali em Angola entre outros países africanos.
De acordo com o analista político Azado Francelino, “há fortes possibilidades que Lakshtanov e Racthin possam fazer parte de uma rede associada no passado ao grupo Wagner, organização paramilitar russa já sancionada internacionalmente, e teriam ligações a ex-agentes dos serviços secretos russos. O objetivo principal desta estrutura seria difundir narrativas favoráveis a Moscovo, ao mesmo tempo que promovem campanhas de manipulação da opinião pública, fragilizando instituições democráticas locais”.
Identidade e vida pública
Para disfarçar suas intenções, Lakshtanov era chefe de uma ONG, conhecida como FAROL, ou Organização Pública de São Petersburgo Sociedade de Apoio à Cooperação Científica, Cultural e Empresarial com Países de Língua Portuguesa. FAROL, trabalha em países de língua portuguesa para promover a cooperação cultural, tem vínculos com a agência oficial de diplomacia cultural da Rússia, Rossotrudnichestvo.
Refira-se que, em 2005, Lakshtanov também administrou uma ONG chamada ‘Fundo Não Comercial para Assistência ao Desenvolvimento de Relações Públicas Internacionais’, também conhecido como NAVIS. Foi liquidada em outubro de 2008. Há poucas informações adicionais sobre o NAVIS.
Contrariamente a Lakshtanov, não existe clara informação sobre Igor Racthin. Isso provavelmente indica que Igor Racthin” seja um pseudônimo, ou que ele se esforçou significativamente para esconder sua identidade e atividades públicas.
Para o jornalista Adalberto Kaluamba, “a detenção em Angola é vista como um sinal de vigilância crescente dos Estados africanos face à expansão da influência russa no continente, não descarto a possibilidade de que outras células semelhantes estejam ativas em outros países africanos”.
A influência russa em África
A influência russa em África se reinventou após o grupo Wagner, segundo All Eyes on Wagner, as estratégias de Moscovo são “mais discretas, mas mais ativas do que nunca”, o cenário de Luanda é muito semelhante aos eventos que ocorreram há quase um ano no Chade.
Em setembro de 2024, três russos e um bielorrusso foram presos pelos serviços secretos em Ndjamena. Entre eles Maksim Shugaley e Samir Seyfan, duas figuras emblemáticas das operações de influência de Wagner na África. Eles se apresentaram como investidores. Shugaley e Seyfan alugaram um imóvel, contactaram políticos, buscaram informações sobre a economia do país e começaram a formar uma rede de falantes de russo no Chade. Os outros dois membros do quarteto se apresentaram como jornalistas.
Primeiro, eles fazem promessas de financiamentos e treinamentos a colegas chadianos. Mas rapidamente, eles lhes pedem que publiquem – em troca de pagamento – artigos a favor da Rússia. Eles foram presos durante a inauguração de uma casa russa que organizaram em nome da Rossotrudnichestvo.
Esses dois casos, no Chade e em Angola, revelam que as novas estratégias de influência da Rússia em África “são agora mais discretas, mas mais ativas do que nunca, e que estão se expandindo e se profissionalizando”, afirma Lou Osborn, do coletivo All Eyes on Wagner.
Para o jurista e docente universitário Baptista Ernesto, “nós os moçambicanos devemos ficar em alerta depois de ver a situação dos nossos irmãos angolano, porque este é um alerta de que a penetração russa com o espírito de pôr em causa as democracias em África é uma realidade e não se deve ignorar isso, e é urgente que se tome medidas mais arrojadas para evitarmos situação similar a de angola e outros pais da africa” alertou.
Por seu turno António Muchisso, olha para ameaça russa em penetrar para desestabilizar a democracia em África, como sendo um perigo e alerta o governo moçambicano para que com muita urgência ative os seus meios de forma a travar esta situação porque segundo ele “de forma errada o governo já esteve a cooperar com grupo wagner em Cabo delgado e de certeza não sabiam que deixaram a porta aberta para o inimigo apesar de a cooperação com a Rússia ser de longa data mas, com a estratégia que eles estão a usar, é preciso que se fique em alerta sob pena de nos arrependermos mais tarde, então é urgente agir agora”.
Essas estratégias se baseiam na vitrine “Iniciativa Africana”, que acompanha o desdobramento do Afrika Corps, entidade que reúne as antigas estruturas militares da Wagner assumidas pelo Kremlin. E elas também se apoiam em uma multiplicidade de atores privados e consultores políticos anteriormente ligados à galáxia Wagner ou aos serviços secretos russos; um grupo de especialistas, de certa forma, designado pelos Estados ocidentais e pela polícia angolana sob o nome de África Politology. Sabe-se agora que o Chade e Angola fazem parte dos alvos de Moscovo. Resta saber quais serão os próximos.

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