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- Cansada pela onda de assaltos, população recorreu à justiça com as próprias mãos
- No luxuoso bairro Belo Horizonte, criminosos escolhem as vítimas a dedo
- Após população deter e linchar um ladrão, polícia deteve as vítimas do roubo
- Comando Distrital nega e diz que a situação da criminalidade está calma
Os moradores do bairro Belo Horizonte, localidade de Gueguegue, no distrito de Boane, na província de Maputo, estão agastados com os roubos a residências e estabelecimentos comerciais que ocorrem desde o início do ano em curso, em consequência da falta de patrulhamento da polícia naquele bairro em expansão. Dada a completa ausência da polícia no local, os moradores montaram uma vigilância que culminou com a captura de um meliante, que por infortúnio acabou sendo linchado no meio da fúria popular e os residentes do bairro não tem dúvidas de que “se a polícia estivesse a fazer devidamente o seu trabalho o povo não faria justiça pelas próprias”. As estruturas locais pedem, por isso, a instalação de um Posto Policial, que pode travar aquele fenómeno, no entanto, o Comando Distrital da Polícia da República de Moçambique (PRM) refuta as reclamações dos moradores da localidade de Gueguegue e refere que a situação da criminalidade ao nível do distrito está calma, uma vez que tem sido destacadas equipas para fazer as patrulhas nocturnas e diárias.
Duarte Sitoe
O bairro Belo Horizonte, na localidade de Gueguegue, distrito de Boane, transformou-se num verdadeiro palco de criminalidade diversa, com destaque para assaltos a residências e pessoas. Nos últimos meses, a onda de criminalidade tende a ganhar contornos alarmantes, sendo que os criminosos inventaram novos moldes e formas de actuação.
Segundo o que os moradores de Gueguegue explicaram ao Evidências, os larápios não esperam pela noite para semearem pânico, uma vez que, em plena luz do dia, aproveitam-se da ausência dos proprietários das casas para introduzirem-se e subtraírem bens.
Alfredo Mutakate desbobinou ao Evidências a curta-metragem do drama vivido pelos moradores daquela localidade devido a onda de criminalidade.
“Não estamos sossegados devido a esta situação. Aqui na nossa zona sempre há assaltos a residências. É preocupante o que está a acontecer. Antes roubavam de noite, mas agora mesmo de dia entram nas casas e subtraem os bens. A situação está descontrolada. Mesmo as casas que tem guarda com arma de fogo já foram invadidas. Acho que são pessoas que conhecem a zona, porque não assaltam qualquer casa, eles escolhem as vítimas a dedo”, desabafou.
Um outro residente daquela zona, identificado pelo nome de Crimildo Fael, de 43 anos de idade, relatou que o grupo de malfeitores anda fortemente armado e quando introduzem-se nas casas as pessoas não reagem porque temem pela própria vida.
“No mês passado entraram numa casa e roubaram electrodomésticos, cartões bancários, telefones celulares e alianças de ouro. Os donos da casa não tinham como reagir porque eles estavam fortemente armados. É estranho ver ladrões com mais armas que a própria polícia. A onda de criminalidade atingiu contornos alarmantes na nossa zona. A polícia, por sua vez, nunca aparece quando é solicitada. Quando ligamos dizem que estão a caminho, mas nunca chegam. Pedimos a quem de direito para resolver a nossa situação. Não podemos viver desta maneira enquanto temos instituições que podiam zelar pela nossa segurança”, lamentou.
A nossa fonte referiu ainda que a polícia não faz um patrulhamento sério desde a época da pandemia, apontando que naquela altura notava-se presença assídua das autoridades da lei e ordem, que tinham o claro objectivo de extorquir os cidadãos que pontapeiavam o decreto presidencial.
Quando o povo decide fazer justiça pelas próprias mãos
Nos meados de Novembro corrente, segundo relataram os moradores de Gueguegue, dois larápios se introduziram dentro de uma residência e subtraíram bens. Entretanto, na saída da mesma foram interpelados, um conseguiu escapar, mas o outro não teve a mesma sorte.
Fatigada com a onda de criminalidade que assola o bairro, a população descarregou toda a raiva no meliante capturado e este acabou perdendo a vida. Depois do sucedido, a polícia foi chamada ao local, mas para o espanto de todos, quando chegou, prendeu os proprietários da casa que fora assaltada.
“Felizmente conseguimos travar mais um roubo. Já estávamos cansados de chorar todos os dias sem intervenção da polícia. Queríamos dar uma lição ao ladrão para servir de exemplo para os outros porque sabemos que essas pessoas que nos roubam não são de longe, mas acabou acontecendo uma tragédia. O ladrão foi brutalmente agredido pela população e acabou perdendo a vida. Reconhecemos que aquele não é o caminho correcto para fazer a justiça, mas isso aconteceu devido a morosidade da polícia”, conta uma fonte ocular.
A tragédia só ocorreu porque, segundo a fonte, a polícia, mesmo tendo sido informada da captura do meliante às 21 horas, só apareceu às 8 horas do dia seguinte, quando o pior já tinha acontecido.
“Ficamos espantados quando a polícia decidiu prender os donos da casa, uma vez que eles não chegaram a tocar no ladrão”, disse Julião José, para depois referir que a justiça pelas próprias mãos pode ser travada com a actuação das autoridades da lei e ordem.
“Apelamos a polícia para soltar o nosso irmão, ele não fez nada. Há relatos de que exigiram 15 mil meticais para soltar a esposa e agora exigem 300 mil para soltar o marido, o que para nós é um absurdo. Se a polícia estivesse a fazer devidamente o seu trabalho, o povo não faria justiça pelas próprias. Estamos cansados, não podemos continuar a trabalhar para alimentar parasitas. A polícia conhece os ladrões, mas não quer fazer o seu trabalho e quando o povo entrega criminosos as autoridades eles não ficam dois dias nas celas. Pedimos ao Comandante Provincial de Boane para estancar a onda de criminalidade que assola o nosso bairro”, clamam.
Obras que albergam larápios
Outra situação que inquieta os moradores da localidade de Gueguegue são as habitações abandonadas, que, segundo eles, albergam criminosos. Os residentes garantem que têm feito jornadas de limpeza para manter alguns sítios limpos, com vista a evitarem estes problemas, mas nem todas as pessoas colaboram.
“Temos muitas casas abandonadas e esta situação contribui para o aumento da criminalidade. Algumas já estão prontas e outras semi-acabadas, mas os donos não fazem as limpezas e os ladrões fazem delas esconderijo. Tentamos contactar os donos para falar da necessidade de fazer limpezas, mas o grosso não colabora. Quando chega o dia marcado para a limpeza eles não aparecem”, disse Eugênia Ngulela.
Ngulela apelou para que os indivíduos que por algum motivo interromperam as suas obras procurem alguém para cuidar das mesmas ou que vendam os espaços no sentido de estes não servirem de esconderijos de gente desconhecida e de conduta duvidosa.
Na qualidade de representante da estrutura da localidade de Gueguegue, Alberto Mabasso reconheceu que a onda de criminalidade ao nível daquele bairro ganhou contornos alarmantes nos últimos meses. Mabasso observa que só a implantação de um Posto Policial pode afugentar os larápios.
“A preocupação da população é legítima. Essa onda de criminalidade preocupa-nos como estrutura da localidade porque não temos sossego, são roubos atrás de roubos. A polícia tem feito o seu trabalho, mas este bairro é muito grande. Como estrutura da localidade entendemos que o Governo deve construir esquadras e postos policiais para reduzir a criminalidade e a dependência do Comando Distrital de Boane”.
Indo mais longe, Mabasso declarou que o resgate das patrulhas comunitárias pode contribuir para restabelecer a ordem e tranquilidade naquela localidade, tendo, por outro lado, instado a população para não fazer a justiça com as próprias mãos.
E o que diz a polícia?
Apesar das queixas dos residentes da localidade de Gueguegue sobre os roubos e assaltos a residências, o Comando Distrital da Polícia da República de Moçambique ao nível do Distrito de Boane refutou as reclamações e acusações dos moradores, declarando que a situação de criminalidade encontra-se calma.
Confrontado pelo Evidências, o comandante distrital avançou que não constitui verdade a notícia sobre a falta de policiamento no bairro Belo Horizonte, uma vez que, segundo ele, diariamente tem sido destacado agentes da lei e ordem para manter a ordem e tranquilidade.
Nas entrelinhas, a fonte apelou aos moradores do distrito de Boane para deixarem a polícia trabalhar, ao invés de fazer justiça pelas próprias mãos. No que respeita às acusações de soltar criminosos dias depois terem sido encontrados à margem da lei, a fonte explicou que o Comando Distrital recebe ordens de soltura do Tribunal para restituir a liberdade aos cidadãos detidos sem formação conclusiva da prova.

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