Luca Bussotti
São sinais ténues, mas não deixam de ser sinais… O que a Renamo fez junto com mais cinco partidos da oposição sem assentos parlamentares ao longo da semana passada é quanto, em condições normais, qualquer oposição faria diante do domínio por enquanto sem adversários do partido no poder, neste caso a Frelimo. A política – e a sua leitura – não deixam espaço a alternativas: quando um partido hegemónico continua dominando a cena eleitoral por dezenas de anos, a única receita é a união das forças de oposição. Uma receita que pode não ser suficiente para derrubar o partido hegemónico, mas talvez possa o ser para reanimar a democracia do país em questão.
Não que as oposições tenham ficado em silêncio, nestes anos: existem figuras de destaque, principalmente na Renamo, que nos últimos tempos deram prova de saber fazer política, confrontando-se com as decisões do governo e da Frelimo. Venâncio Mondlane, Manuel de Araújo e poucos outros representam algumas das individualidades que emergiram das fileiras da Renamo, graças à sua competência e vontade de construir uma alternativa à hegemonia da Frelimo. Ultimamente, Ivone Soares e Elias Dhlakama também voltaram a fazer ouvir as suas vozes na Assembleia da República… Sinais, sem dúvidas, de retomada de uma actividade política que parecia ter sido negligenciada ou até abandonada…Mas sinais de individualidades, não de um partido como tal, como um conjunto de pessoas que formam uma comunidade que partilha ideias e valores, e que procura – por vocação, diria Max Weber – criar alternativas de governo a quem, neste momento, está no executivo do país. O que tem faltado ao longo dos últimos anos, em suma, é a iniciativa política do partido Renamo (e do MDM, e da maioria das oposições), pois só assim é que, num país em que os partidos representam o pilar da vida democrática, será possível construir uma dinâmica mais avançada para o país.
A construção de uma coligação das oposições é (seria) um elemento importante na vida democrática de Moçambique: para quem a observa, o objectivo não é de esperar que o partido de governo seja derrubado. Pelo contrário, o que se quer é que Moçambique se torne uma democracia “normal” como muitas outras no continente africano: mesmo na lusofonia, basta ver os exemplos dos três países mais pequenos, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, para perceber que, apesar das enormes dificuldades que sobretudo os últimos dois enfrentam em termos económicos, eles conseguiram criar uma dinâmica de alternância no poder, sem que isso constitua razão para desespero, conflitos ou até guerras. Esta situação representa a normalidade, e assim é que deveria ser mesmo em Moçambique: pensar que seja normal a Frelimo, um dia, deixar o poder, assim como normal podia ser, outro dia, que a Frelimo retome este poder perdido em favor de outras formações políticas, dependendo de processos eleitorais transparentes e justos.
Entretanto, chegar a um país “normal” é, em Moçambique, tarefa árdua, por razões que podem ser aqui omitidas. E um país normal precisa de partidos de oposição “normais”. Não é normal, por exemplo, que não exista uma actividade digna de nota dentro da Assembleia da República, em termos de propostas de leis por parte da oposição. Óbvio, tais desenhos legislativos seriam, geralmente, destinados a serem reprovados, pois os números estão do lado da Frelimo; entretanto, na vida democrática é preciso experimentar todas as oportunidades que a Constituição e a lei permitem. E a apresentação de propostas de leis junto ao parlamento é provavelmente a principal destas oportunidades. Os discursos brilhantes de um Venâncio Mondlane, de uma Ivone Soares, de um Elias Dhlakama não representam iniciativas políticas do partido Renamo, mas sim de indivíduos com cabedal político significativo, que jogam uma partida a sós… O que falta é o director de orquestra, ou seja, o partido como – diria Gramsci – intelectual colectivo – e, ainda mais, suas lideranças. O facto de as oposições terem aprovado a lei da TSU, por exemplo, representa uma grave falha na vida parlamentar moçambicana…
A coligação que, talvez, será constituída é um passo à frente rumo à normalização da vida democrática de Moçambique, assim como foi em Angola, com excelentes resultados. Entretanto, os eleitores precisam de saber quais conteúdos, quais ideais e quais programas esta coligação irá levar a frente: que receitas para uma situação económica que cada dia penaliza os cidadãos? Que soluções para diminuir o fosso entre ricos e pobres em Moçambique? Como conter uma corrupção galopante? Que país queremos ver daqui a vinte ou trinta anos? Responder a estas e outras questões fundamentais será o trabalho principal – juntamente com a escolha de boas lideranças – desta possível coligação, a que certamente que a Frelimo reagirá melhorando o seu desempenho político. Actuar numa condição de quase-monopólio não é nada estimulante para quem governa o país desde 1975. Iremos acompanhar se estes primeiros sinais se transformarão em iniciativa política ou se ficarão meros sinais que não terão o poder de pôr em risco o monopólio político do partido dominante, que representa o primeiro objectivo desta fase da vida democrática de Moçambique.

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