Porquê o ódio de políticos e governantes à crítica?

OPINIÃO

Alexandre Chiure

Em Outubro de 2018, eu disse, sem me aperceber, de que o Presidente Samora Machel tinha morrido há 12 anos quando, na verdade, transcorriam, naquele mês, 32 anos. Cometi essa gafe em directo ao apresentar a rubrica Revista de Imprensa,na STV.

O vídeo relativo ao assunto tornou-se viral nas redes sociais. Foi partilhado em demasia. Circulou no país, assim como no exterior. Um amigo que se encontrava em Portugal e um outro em passagem por Nova Iorque, nos EUA, acederam ao ficheiro em grupos de Whatsapp, que foi motivo de chacota. Divertiram-se à brava.

Num outro dia, voltei a ser alvo de ataques de internautas por ter-me apresentado com a gola da minha camiseta dobrada na extremidade. O que não me parecia relevante, porque não havia nada de grave nisso, acabou por atrair a atenção de centenas de telespectadores.

Para a minha surpresa, no lugar de debaterem os conteúdos que levava para o programa, naquela manhã, cerca de 200 pessoas preferiram comentar a respeito do desajuste em parte da minha indumentária. Alguns, obviamente, aproveitaram a ocasião para esgrimir epítetos pouco abonatórios. A maioria, como é claro, transmitiu-me mensagens de conforto, aconselhando-me a menosprezar tal assunto por configurar tamanha mesquinhez.

Seja como for, estes episódios deram azo a que concluísse que este é o preço que se paga quando se é uma figura pública. Somos continuamente escrutinados. Os admiradores e o público em geral avaliam tudo e nada. Prestam atenção ao pormenor, à nossa forma de ser e estar, ao que dizemos, ao que fazemos no dia-a-dia e, inclusive, ao que vestimos. Estamos sob permanente vigia.

Infelizmente, este não é o entendimento de alguns ilustres. Apesar de serem membros do governo, dirigentes políticos ou gestores da coisa pública, querem continuar a comportar-se como se fossem ainda anónimos. Querem continuar a ser tratados como se fossem aquele João, Armando ou Pedro que ninguém conhece.

Por incrível que pareça, tais figuras ainda não perceberam ou fingem estar indiferentes à situação de que,a partir da altura em que aceitaram os cargos que exercem, devem adoptar um comportamento que sirva de exemplo digno ao comum dos cidadãos. Não podem ser vistas da mesma forma na sociedade. Quer queiram, quer não, são figuras que não passam despercebidas a ninguém.

O seu discurso, a sua indumentária, as relações ou amizades que estabelecem, o que fazem e o que deixam de fazer passam por um escrutínio público.

Estão perante os holofotes, e qualquer que seja o desvio comportamental, designadamente o deslize em termos de pronunciamentos, o nepotismo, a prática de negócios ilícitos, a  corrupção, o compadrio, o favoritismo, o branqueamento de capitais e outros males serão, sempre, alvo de críticas e denúncias por parte da imprensa e do público em geral.

A fasquia, em termos de postura e sentido de Estado, é colocada ao patamar mais alto quando se trata de avaliar um governante ou um dirigente político, sobretudo a figura do Chefe de Estado, devido às responsabilidades que recaem sobre si no que diz respeito à garantia da paz, estabilidade e bem-estar do povo moçambicano.

Infelizmente, o que acontece no país é preocupante. Os membros do governo ou políticos parecem estar aprestar-nos um favor no exercício das suas funções quando, na verdade, mais não fazem do que cumprir as suas obrigações.

Alguns fazem discursos completamente desalinhados da realidade, num tom arrogante e de autoritarismo. Ainda assim, esperam que todo o mundo se levante e os aplauda, lhes preste vassalagem ou que, no mínimo, lhes elogie ou, ainda, se mantenha mudo e quedo.

Outros ilustres, quando entendem, fazem pronunciamentos públicos que chocam com algumas sensibilidades, para não falar de ofensas às pessoas, grupos sociais, profissionais, étnicos ou tribais, transmitindo o sentimento de desprezo para com as massas e, ainda assim, não admitem que alguém lhes critique.

Outros ainda atropelam grosseiramente as leis vigentes no país, não lhes faltando pejo para se julgarem no direito de ser ovacionados.

A julgar pela sua reacção à crítica, pelo ódio com que encaram quem lhes censure, alguns governantes ou políticos da proa dão a ideia de que estão correctos no que fazem e o público é que não. Que este tem o desplante de abordar apenas factos negativos em detrimento dos positivos. Que só vê erros e não virtudes de uma governação.

São poucos, entre os notáveis, aqueles que aceitam a crítica tal como ela é. Que olham para a mesma de uma forma positiva. Que entendem que, salvo raras excepções, ela é feita na melhor das intenções, no sentido de contribuir para que pautem por uma boa postura, um sentido de Estado, com um discurso bem elaborado e, acima de tudo, para que sejam dirigentes exemplares e enveredem por um desempenho adequado.

Infelizmente, os críticos, como eu, são mal vistos e conotados com os contras. Alguns dignitários acham que os que lhes criticam não simpatizam com eles, o que não corresponde à verdade, pelo menos da minha parte. As minhas opiniões primam pela isenção, independência e imparcialidade, valores consagrados na Constituição e na Lei de Imprensa que rege a actividade jornalística.

O que é que eu ganharia afrontando, por exemplo, o Chefe de Estado? Nada. Nem molestando a Frelimo ou qualquer outro partido político. Como jornalista, a minha missão é observar fenómenos, analisar e interpretar discursos políticos, investigar e criticar más práticas parlamentares, governativas e da sociedade.

Eu sou um entre milhares de patriotas que usam diferentes plataformas de comunicação para exprimir o seu sentimento sobre o que não está bem no país com vista a contribuir para que seja corrigido.

O objectivo é que tenhamos um país onde todos os governantes respeitem e considerem os governados, as leis sejam cumpridas e levadas em conta na tomada de decisões.

O objectivo maior é que tenhamos uma sociedade guiada pelos princípios de igualdade de oportunidades, tolerância e inclusão social. Estou a fazer a minha parte. Faz a tua também.

No dia que eu deixar de criticar um amigo será por ter deixado de nutrir por ele a amizade de outrora.

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