Arão Valoi
Depois da estrondosa e humilhante derrota da Renamo e do seu candidato nas recentes eleições gerais, Ossufo Momade tenta, agora, a sua última cartada para manter-se líder da oposição por, pelo menos, algum tempo. Ao responder o convite formulado pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, para um diálogo entre os candidatos presidenciais sobre a crise pós-eleitoral, a Renamo disse, através do seu porta-voz, que um dos pontos de agenda que leva à mesa de conversações, é a anulação das eleições. Não é de admirar que Ossufo Momade tenha esse ponto na agenda, afinal, é uma estratégia para a sobrevivência política da Renamo. É que, a ser concretizada, a medida permitiria que Momade continuasse, ainda que por pouco tempo, líder da oposição em Moçambique. Ou seja, a defesa de Momade pela anulação não se limita a uma simples contestação dos resultados eleitorais, mas sim a uma estratégia para garantir a sua sobrevivência ou relevância política, especialmente considerando o contexto de uma eventual criação de um governo de gestão que poderia ser instaurado após a invalidação do pleito. O Presidente da Renamo é também conhecido pela sua relação negocial com Filipe Nyusi, daí que, alguns círculos de opinião aventam a possibilidade de a ideia de anulação das eleições ser resultado de um acordo de cavalheiros ou gentlemen agreement entre os dois, tendo como objectivo acabar com o Venancismo.
E como isto funcionaria? A anulação das eleições implica a entrada em funcionamento de um governo de gestão ou transição até à realização de novo escrutínio. Enquanto Nyusi e Ossufo mantêm-se, por via disso, relevantes politicamente, os tribunais fariam a sua parte para que Venâncio Mondlane não concorresse às tais eleições, já que estaria inelegível em função dos crimes a si imputados pelas instituições de justiça do País. Embora a anulação signifique uma crise de legitimidade do processo eleitoral e possa desencadear uma série de desdobramentos negativos para a governabilidade do país, para Ossufo Momade é estratégico que assim seja, já que a Renamo, como principal partido de oposição e segunda maior força política do País, continuaria a ter um papel central na cena política moçambicana. E isso significa que a manutenção da Renamo como o segundo maior partido implica que ela continuará a gozar de benefícios legais e institucionais assegurados pela Constituição e pelos acordos de paz, como o Acordo de Paz de 2019. Por isso, antevejo um processo negocial difícil, em que somente os que dominam a teoria de jogos para avaliar diversas situações estratégicas colocadas na mesa de negociações e escolher as melhores opções para ter resultados desejados é que sairão beneficiados ou terão os seus interesses salvaguardados. Em nossa humilde opinião, este encontro dos candidatos presidenciais representa uma oportunidade única para estes discutirem, de forma franca e honesta, os problemas que levaram o País a esta crise. No entanto, a realidade política do nosso Pais mostra que, mesmo em momentos de crise ou em face de desafios comuns, as forças opositoras frequentemente não conseguem se unir devido a uma série de jogos de interesse internos, ambições pessoais, e até divergências ideológicas. Esse fenômeno, infelizmente, enfraquece a capacidade da oposição de actuar de maneira eficaz e coordenada, o que acaba beneficiando o partido no poder, no caso, o Frelimo.
Embora todos compartilhem a oposição ao Partido Frelimo, as suas agendas políticas são bastante distintas. A Renamo, por exemplo, tem uma trajectória de confronto armado com o Governo e alguma base de apoio no centro e norte do País, enquanto o PODEMOS é um partido que se apresenta como uma alternativa mais moderna, com uma proposta focada em governança eficiente, combate à corrupção e desenvolvimento econômico. Já o MDM, partido tradicional da oposição, tem uma visão que mistura aspectos de democracia e governança local, sem necessariamente se alinhar com os demais. Essas diferenças de fundo dificultam um consenso. Se, por um lado, todos os partidos da oposição desejam a mudança de governo e a implementação de uma agenda mais democrática, as estratégias para alcançar esse objectivo e as formas de interação com o poder podem variar consideravelmente. No caso específico da Renamo, está mais que claro que, neste momento, o seu maior interesse é manter-se relevante politicamente. E para que isso aconteça, vai apostar em todo o maquiavelismo político para, em conluio com a Frelimo, travar a trajectória política de Venâncio Mondlane. Essa estratégia não só beneficia a Renamo, mas também a Frelimo que se vê mergulhada numa crise sem precedentes. O problema central é que esses acordos individuais, muitas vezes, acontecem de forma não transparente, o que enfraquece a confiança entre os partidos da oposição e dificulta a construção de uma frente unificada. Além disso, é possível que, em momentos de negociação, alguns partidos vejam na Frelimo uma forma de alcançar objectivos políticos imediatos, em detrimento de uma estratégia de longo prazo para alternância no poder.

Facebook Comments