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Edmilson Mate
Vivemos tempos assustadores. Os casos de cidadãos assassinados por pensarem diferente, por questionarem o sistema ou simplesmente por exercerem a sua liberdade de expressão, têm vindo a crescer no País. A cada novo caso, a mesma pergunta se impõe: estarão estas mortes a ser encomendadas por quem detém o poder?
Depois de figuras proeminentes como Elvino Dias e Paulo Guambe, surge agora a tentativa de assassinato ao Joel Amaral, vulgarmente conhecido por MC Trufa Trufafa, um jovem que foi bastante ativo durante a campanha do VM7. São várias as vozes que já foram silenciadas, e todas têm algo em comum: ousaram pensar de forma diferente, propor caminhos alternativos ou criticar abertamente o regime. O padrão repete-se com inquietante regularidade. E o mais preocupante é a aparente impunidade que envolve estes casos.
Há, em Moçambique, uma crescente sensação de que não se toleram ideias novas, visões alternativas ou críticas construtivas. A impressão é a de que viver na “mesmice” — na repetição cega do discurso oficial — é não só uma expectativa, mas uma imposição. Questionar o regime ou propor outro rumo é, muitas vezes, interpretado como uma ameaça, e os que ousam fazê-lo enfrentam consequências gravíssimas.
A morte do constitucionalista franco-moçambicano Gilles Cistac, em plena zona nobre de Maputo, em 2015, permanece envolta em mistério. A sua voz incómoda, que defendia uma interpretação rigorosa e justa da Constituição, foi silenciada de forma brutal. Até hoje, não se conhecem os autores morais ou materiais do crime.
Em 2016, foi o deputado da RENAMO, Jeremias Pondeca, quem perdeu a vida, também assassinado a tiro em Maputo. Mais uma vez, nenhum esclarecimento convincente foi apresentado ao povo. O padrão repete-se: vítimas ligadas à oposição ou a posições críticas são eliminadas, e os processos permanecem envoltos em opacidade.
Já em 2019, o ativista e observador eleitoral Anastácio Matavele foi igualmente morto a tiro em Xai-Xai. Neste caso, cinco agentes da polícia foram julgados e condenados, o que, à primeira vista, poderia parecer um sinal de justiça. No entanto, a ausência de punição para os mandantes do crime deixou a sensação de que os verdadeiros responsáveis continuam protegidos e intocáveis. A justiça, assim, parece parcial e incompleta.
Num Estado que se diz democrático, a liberdade de expressão, o pluralismo de ideias e a tolerância política não são apenas direitos constitucionais — são pilares fundamentais da convivência pacífica. Quando um país começa a eliminar fisicamente aqueles que pensam diferente, entra num caminho perigoso, onde o medo substitui o diálogo, e a violência toma o lugar da política.
Se hoje não és do partido no poder, és automaticamente rotulado como inimigo. Não tens espaço para discordar, nem margem para propor alternativas. Esta postura não só sufoca a democracia, como compromete o futuro do próprio país. Nenhum Estado progride num ambiente de medo e de repressão. Pelo contrário: só há verdadeiro desenvolvimento quando todos os cidadãos se sentem livres para participar, criticar e propor.
Uma boa governação exige escuta, debate e transparência. Governar com base no medo é uma demonstração de fraqueza, não de força. O uso da intimidação ou da violência para calar vozes dissidentes é uma prática incompatível com os valores democráticos que Moçambique diz defender.
Enquanto os responsáveis por estas mortes não forem identificados e levados à justiça, a confiança dos cidadãos nas instituições continuará a deteriorar-se. E sem confiança, não há coesão social, nem legitimidade governativa. A democracia não pode ser apenas um conceito teórico, proclamado em discursos — tem de ser praticada todos os dias, em todas as esferas da sociedade.
É fundamental que, como sociedade, rejeitemos esta lógica de eliminação do outro. É urgente que se promova o diálogo entre diferentes sensibilidades políticas e sociais. Não é através de balas que se resolvem divergências — é através de palavras, de ideias, de negociação.
O nosso País merece líderes que não temam a crítica, que saibam conviver com o contraditório e que compreendam que o poder não é um fim em si mesmo, mas um meio para servir o povo. E o povo, esse, não é um bloco homogéneo. É feito de múltiplas vozes, experiências e aspirações.
Silenciar quem pensa diferente não é sinal de estabilidade, mas, sim, de desespero. E é, acima de tudo, uma traição aos ideais de liberdade e justiça pelos quais tantos moçambicanos lutaram. Que não nos calem. Que não nos matem por pensar diferente.

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