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- Documentos expõem suposta vítima de golpe como arquitecto de fraude
- Com acção tenta escapar de pagamento de 300 milhões e ainda obter indemnização milionária
- Histórico de falências e incumprimento de dívidas fizeram-no não ser elegível a financiamento
Uma investigação aprofundada a documentos internos, comunicações e processos judiciais revelam que o empresário moçambicano Zanil Satar, sobrinho do falecido Nini Satar, que levou ao banco dos réus o Banco Comercial e de Investimentos (BCI) e dois funcionários, acusando-os de burla agravada, está longe de ser a vítima que alega ser. As evidências apontam, em vez disso, para uma complexa operação de engenharia financeira, judicial e mediática, arquitectada pelo próprio Satar, com o objectivo aparente de cancelar uma dívida milionária de mais de 300 milhões, obter uma indemnização astronómica de mais de um bilião de meticais e desviar as atenções do seu historial de má gestão, falência de empresas e ligações familiares polémicas.
Evidências
A narrativa pública, amplificada por uma campanha coordenada em redes sociais e artigos de opinião, descreve Satar como um empreendedor lesado por uma suposta promessa de financiamento de 600 milhões de meticais do BCI, em troca da aquisição do Grupo Taverna, promessa que nunca teria sido cumprida, levando à falência dos seus restaurantes Mimos.
No tribunal, onde exige uma indeminização de mais de 1,1 mil milhões de meticais, Zanil alega que foi o banco que lhe “apresentou” o negócio do Grupo Taverna e o coagiu a adquiri-lo, com promessa de que o financiaria com 600 milhões de meticais.
O empresário acusa dois funcionários do Grupo Taverna de estarem por detrás desta operação, alegando que foram os gestores do BCI que lhe apresentaram a oportunidade de comprar o Grupo Taverna, induzindo-o a liquidar uma dívida pré-existente do Grupo Taverna junto do BCI.
Em face do não cumprimento por parte do BCI, as operações dos seus empreendimentos colapsaram (encerramento de Mimos e Taverna), culminando com o despedimento de funcionários.
Sucede, porém, que documentos consultados provam que foi o Grupo HZ/Mimos de Zanil Satar quem iniciou as negociações para comprar o Grupo Taverna em Fevereiro de 2021, sem qualquer mediação prévia do BCI. O banco entrou em cena apenas como credor do vendedor, Nuno Pestana.
Paralelamente ao processo em que exige 1,1 mil milhões de meticais ao BCI, o Grupo HZ de Satar deve ao mesmo banco cerca de 300 milhões de meticais, valor que se encontra em incumprimento e alvo de uma acção executiva. Analistas sugerem que a queixa-crime milionária pode ser uma manobra para pressionar o banco a anular a dívida real, enquanto Satar mantém na sua posse os activos físicos do Grupo Taverna.
A “promessa” de 600 milhões que nunca existiu no papel
A peça central da acusação de Satar desmorona-se perante a ausência de provas documentais. Não existe, segundo apurou o Evidências de fonte processual, qualquer contrato, proposta formal, e-mail ou acta que comprove um compromisso do BCI para financiar 600 milhões de meticais (cerca de 9 milhões de dólares).
Pelo contrário, os próprios pedidos de financiamento escritos enviados pelo grupo de Satar referiam valores e condições diferentes.
Segundo o Evidências apurou, o próprio Zanil, em comunicação, refere um pedido de 450 milhões para o Taverna mais renovação de 340 milhões para o Mimmos, não os 600 milhões alegados.
O dinheiro pretendido, não lhe foi concedido em empréstimo, porque não conseguiu apresentar contas minimamente organizadas. O banco terá rejeitado o pedido, classificando o empresário como perfil de risco de default.
De forma surpreendente, quando o caso ganhou visibilidade pública, via blogs e redes sociais, numa acção que se diz que foi por si patrocinada, o empresário passou a solicitar negociação da dívida, gesto que o banco recusou.
Para analistas do sector, uma eventual negociação poderia ser interpretada como reconhecimento implícito de culpa, razão pela qual a instituição decidiu seguir “até ao fim do processo”.
Ademais, as “provas” apresentadas em tribunal, nomeadamente mensagens de texto, mostram indícios graves de adulteração, com datas manipuladas e sequências cronológicas invertidas, sugerindo fabricação.
Antigo dono do Taverna chegou a se queixar de burla nas redes sociais
A transacção com o Grupo Taverna foi tão conturbada que, após a compra, foi necessário assinar um memorando de entendimento para reverter parte das quotas e anular cheques.
O anterior proprietário, Nuno Pestana, já declarou publicamente que foi ele próprio burlado por Zanil Satar na operação, afirmando existirem “divergências substanciais” e que Satar não cumpriu os acordos financeiros estabelecidos.
Zanil Satar é sobrinho directo de Momad Assif “Nini” Satar, condenado pelo assassinato do jornalista Carlos Cardoso e por desfalques no antigo BCM. É também enteado do conhecido empresário Mohamed Bachir Sulemane (MBS).
O seu império empresarial inclui empresas como a Zebra Distribuidora e a Bandini Distribuidores e muitas delas falidas ou em dificuldades, o que foi um dos motivos que sustenta o receio do BCI em conceder empréstimo, dado o fundamentado risco de incumprimento futuro, como acontece com uma dívida de 300 mil do grupo Mimos.
BdM não encontrou nenhuma conduta imprópria do BCI e seus funcionários
No quadro das diligências do processo, o Banco de Moçambique foi uma das entidades demandadas para apresentar um parecer sobre a alegada conduta imprópria dos funcionários bancários e do BCI.
Entretanto, após análise independente e detalhada do caso, o Banco de Moçambique, liderado pelo temido Xerife Rogério Zandamela, exonerou o BCI e os seus gestores de qualquer irregularidade.
Juristas contactados consideram a acusação de “burla agravada” insustentável, pois não se verifica o engano intencional, o benefício ilícito para os acusados ou um nexo de causalidade entre a suposta promessa e a falência das empresas, amplamente atribuída à má gestão de Satar.
Os factos agora revelados pintam um quadro onde Zanil Satar não é a vítima de um golpe bancário, mas sim o presumível arquitecto de uma tentativa inédita de fraude financeira e judicial em Moçambique.
O que ganharia num provável sucesso judicial nesta acção?
O caso, que aguarda julgamento, ganhou notoriedade antes mesmo de avançar de feto, devido a uma campanha de desinformação, em que Zanil teria buscado fortificar a sua imagem na opinião pública, buscando transformar o seu próprio fracasso empresarial e dívidas impagáveis num lucro astronómico à custa da reputação daquela instituição financeira e dos seus colaboradores.
É que numa eventual e hipotética vitória judicial neste caso, Zanil iria zerar as dívidas que tem com o BCI, sobretudo a do Mimos, o que resultaria no cancelamento de ónus de 300 milhões de Meticais.
Igualmente manteria a posse dos activos do Grupo Taverna sem ónus e ainda receberia uma indemnização “astronómica” de 1,1 mil milhões de Meticais, enquanto o BCI e os seus colaboradores cairiam não só no prejuízo financeiro, como reputacional significativo.
Configuraria a mais audaciosa e inédita engenharia de fraude financeira e social vista em Moçambique, permitindo-lhe enriquecer ilicitamente, limpar uma dívida e sair como vítima.
Segundo apurado de fonte próxima do processo, o valor reclamado de 1,1 mil milhões de Meticais é extremamente empolado, pois o próprio queixoso declarou ter investido cerca de 5 milhões de USD (≈ 315 milhões de MZN). Com uma margem líquida optimista de 10% ao ano, os lucros cessantes em três anos seriam inferiores a 100 milhões de MZN.
“A exigência é uma tentativa clara de enriquecimento sem causa, sem base factual ou legal”, declarou a fonte que temos vindo a citar.
O empresário manteve, há anos, a imagem pública de homem de negócios de sucesso, versão que agora é contestada por fontes ligadas ao processo e pelo estado de falência de grande parte dos seus investimentos.
São várias empresas do seu grupo empresarial encerradas ou falidas, incluindo Mimos e Taverna, além de projectos não concretizados um pouco por toda a Cidade e Província de Maputo.
O Evidências tentou, sem sucesso, contactar o empresário Zanil. Foram feitas várias chamadas e mensagens de textos, mas nenhuma delas teve retorno.



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